José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
José Mauro de Vasconcelos - Meu pé de laranja-lima (pdf)(rev)
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Meti a mão no bolso e procurei entre os seixos da atira<strong>de</strong>ira, as figurinhas, o<br />
cordão do pião e bolas <strong>de</strong> gu<strong>de</strong>.<br />
— É isso.<br />
Trazia na mão uma medalha com a cabeça <strong>de</strong> um índio. Índio da América do<br />
Norte, cheio <strong>de</strong> penas nos cabelos. Do lado <strong>de</strong> trás, estava escrita a palavra.<br />
Ele virou na mão e <strong>rev</strong>irou a medalha.<br />
— Pois olha que eu também ignoro. On<strong>de</strong> achaste isso?<br />
— Isso fazia parte do relógio <strong>de</strong> Papai. Vinha amarrada com uma correia<br />
para ficar <strong>de</strong>pendurada no bolso da calça. Papai disse que o relógio ia ser minha<br />
herança. Mas aí ele precisou <strong>de</strong> dinheiro e ven<strong>de</strong>u o relógio. Um relógio tão lindo.<br />
Me <strong>de</strong>u o resto da herança que era isso. Cortei a correia porque tinha um cheiro<br />
azedo danado.<br />
Tornou a alisar os meus cabelos.<br />
— És um menininho muito complicado, mas confesso que estás enchendo <strong>de</strong><br />
alegria o velho coração <strong>de</strong> um Português. Lá isso, estás. Vamos agora?<br />
— Está tão bom. Só um bocadinho mais. Eu preciso falar uma coisa muito<br />
séria.<br />
— Então, fala.<br />
— A gente é amigo que não po<strong>de</strong> mais, não é?<br />
— Não há dúvida.<br />
— Até o carro já é meio meu, não foi?<br />
— Um dia será teu, inteiro.<br />
— É que...<br />
Estava custando a sair.<br />
— Vamos, empacaste? Não és disso...<br />
— Não fica zangado?<br />
— Garanto.<br />
— Tem duas coisas na nossa amiza<strong>de</strong> que eu não gosto.<br />
Mas não saía tão fácil como planejara.<br />
— Quais são?<br />
— Primeiro, se nós somos dois gran<strong>de</strong>s amigos, como é que eu tenho <strong>de</strong><br />
chamar senhor pra lá, senhor pra cá...<br />
Ele riu.<br />
— Pois me trata como quiseres. Por você, por tu...<br />
— Tu, não, é muito difícil; sou capaz <strong>de</strong> repetir todas as conversas nossas<br />
para Minguinho. Mas quando vou eu falar <strong>de</strong> tu, não acerto. Melhor você. Não<br />
ficou zangado?<br />
— Ora! Por quê? É um pedido muito justo até. Quem é esse Minguinho que<br />
eu nunca ouvi falar?<br />
— Minguinho é Xururuca.<br />
80