Reflexões Sobre o Amor na Vita Nuova de Dante Alighieri
Reflexões Sobre o Amor na Vita Nuova de Dante Alighieri
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Capítulo I – O PROBLEMA DO AMOR NA IDADE MÉDIA<br />
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Para Nygren 19 o amor cristão é ágape enten<strong>de</strong>ndo por ágape um amor<br />
espontâneo, imotivado, sem cálculo, ilimitado e incondicio<strong>na</strong>l. Um amor que não<br />
se <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>r pelo valor do seu objecto mas ape<strong>na</strong>s pela sua <strong>na</strong>tureza<br />
intrínseca; um amor que é indiferente aos valores, que divi<strong>de</strong>m o justo do<br />
pecador, o homem digno, do homem indigno, um amor que ama aquilo que é<br />
privado <strong>de</strong> valor e que ao ser amado ganha valor. É um amor que não é <strong>de</strong>sejo,<br />
um amor <strong>de</strong>sinteressado, que pressupõe renúncia a si e que se opõe ao amor<br />
egoísta e egocêntrico <strong>de</strong>sig<strong>na</strong>do pelo Eros. A oposição entre Eros e Ágape é vista<br />
por Nygren como uma oposição entre dois amores, o amor humano e o amor<br />
divino. Entre os dois amores não há uma diferença <strong>de</strong> grau mas <strong>de</strong> <strong>na</strong>tureza.<br />
Nenhuma via, nem mesmo a da sublimação, po<strong>de</strong> conduzir do Eros à Ágape, e<br />
por isso mesmo, nenhuma forma <strong>de</strong> amor huma<strong>na</strong>, seja amor <strong>de</strong> concupiscência,<br />
ou amor <strong>de</strong> amiza<strong>de</strong>, seja <strong>de</strong>sidério ou amiza<strong>de</strong>, po<strong>de</strong>m dar conta do amor do<br />
homem a Deus, que <strong>de</strong>ve ser uma imagem da forma <strong>de</strong> amar Deus, ou seja, <strong>de</strong>ve<br />
ser espontânea, imotivada, sem cálculo, ilimitada e incondicio<strong>na</strong>l 20 . Quando se<br />
trata <strong>de</strong> amar a Deus, o amor humano <strong>de</strong>ve, <strong>de</strong> algum modo, transmutar-se numa<br />
espécie <strong>de</strong> amor divino.<br />
Constituindo-se como estudos <strong>de</strong> referência do modo como durante a Ida<strong>de</strong><br />
Média o amor divino foi tratado pelos teólogos, quer a síntese realizada por Pierre<br />
Rousselot quer a síntese realizada por An<strong>de</strong>rs Nygren, não são aceites sem<br />
reservas 21 , o que <strong>de</strong>corre do facto <strong>de</strong> terem sido posições construídas com base<br />
em oposições que, se têm um lado operatório que as tor<strong>na</strong> atractivas, por outro<br />
lado revelam-se quase sempre redutoras e insuficientes para apreen<strong>de</strong>r as<br />
“nuances” que se colocam no plano concreto.<br />
É o que acontece com a síntese elaborada por Rousselot. Construída a<br />
partir da oposição entre duas concepções <strong>de</strong> amor, a concepção <strong>de</strong> amor físico e<br />
a concepção <strong>de</strong> amor extático, e ao inserir, nesta última, autores como Ber<strong>na</strong>rdo<br />
<strong>de</strong> Claraval e Ricardo <strong>de</strong> S. Victor em nome <strong>de</strong> características que consi<strong>de</strong>ra<br />
próprias da concepção <strong>de</strong> amor extático, como a violência do amor e o amor<br />
19 NYGREN, An<strong>de</strong>rs. Eros e Agape, ed. cit., p. 54.<br />
20 NYGREN, An<strong>de</strong>rs. Eros e Agape, ed. cit., p.70.<br />
21 Ver IMBACH, Ruedi e ATUCHA, Iñigo. Amours Pluriels, ed. cit.,; BALADIER, Charles. Érôs au Moyen Âge,<br />
Paris, Ed. du Cerf, 1999.<br />
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