Reflexões Sobre o Amor na Vita Nuova de Dante Alighieri
Reflexões Sobre o Amor na Vita Nuova de Dante Alighieri
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Capítulo II – ALGUNS LUGARES ESPECULATIVOS DA REFLEXÃO TEOLÓGICA SOBRE O AMOR<br />
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terceira forma <strong>de</strong> amor, uma concepção unitária do homem fundada no próprio<br />
acto <strong>de</strong> amar <strong>na</strong> medida em que nele estão envolvidas as três faculda<strong>de</strong>s<br />
espirituais do homem: a afectivida<strong>de</strong>, a razão e a vonta<strong>de</strong>.<br />
Por tudo o que foi dito até ao momento foi possível perceber até que ponto<br />
a resposta dos teólogos medievais foi <strong>de</strong>vedora da resposta <strong>de</strong> Santo Agostinho e<br />
esta, por sua vez, ainda que através dos neoplatónicos foi <strong>de</strong>vedora da<br />
concepção platónica <strong>de</strong> amor como tensão, aspiração, força. Esta concepção<br />
platónica <strong>de</strong> amor que se encontra subjacente à concepção agostinia<strong>na</strong> <strong>de</strong> amor<br />
como apetite, como <strong>de</strong>sejo, serviu, pelo menos até ao momento, para unir o<br />
homem a Deus, como vimos em Guilherme <strong>de</strong> Saint Thierry e Hugo <strong>de</strong> S. Victor 35 ,<br />
para unir os homens uns aos outros, como se viu acontecer em Pedro Abelardo e<br />
ainda como fundamento <strong>de</strong> uma concepção unitária do homem que se encontra<br />
em Aelredo <strong>de</strong> Rievaulx.<br />
Século <strong>de</strong> <strong>de</strong>scoberta do amor, o século XII é também, <strong>na</strong> Europa, o século<br />
da entrada e consolidação da obra <strong>de</strong> Aristóteles, facto que irá <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>r que a<br />
abordagem do tema do amor, e concretamente a questão sobre o que é o amor,<br />
vá registar uma inflexão num outro sentido, ainda que a concepção <strong>de</strong> amor como<br />
<strong>de</strong>sejo, como apetite se mantenha.<br />
Com efeito e <strong>na</strong> sequência da influência aristotélica, o amor ganha uma<br />
dimensão ética e cósmica. Na Retórica, Aristóteles <strong>de</strong>finindo o que seja “amar”,<br />
apresenta-o como o querer para alguém um bem, tendo em vista o seu interesse<br />
e não o interesse do próprio 36 . Quem ama quer, para aquele que ama, um bem<br />
que é o bem em função do interesse do amado e não o bem em função do<br />
interesse daquele que ama. O amor liga-se ao bem e ao ligar-se ao bem ganha<br />
uma dimensão ética que Aristóteles explora nos Livros VIII e IX da Ética a<br />
Nicómaco. A ligação da temática do amor ao bem faz com que o seu tratamento<br />
surja fundido com a temática da amiza<strong>de</strong>, sendo possível respirar através da<br />
leitura <strong>de</strong>sta obra aristotélica, um autor para quem o amor, mais do que um<br />
35 Neste autor e como se po<strong>de</strong>rá ver aquando da abordagem do amor or<strong>de</strong><strong>na</strong>do, um dos lugares<br />
especulativos que marcaram a reflexão medieval sobre o amor, a caritas, o amor a Deus, vai surgir como o<br />
exemplo <strong>de</strong> um amar que é bom porque or<strong>de</strong><strong>na</strong>do.<br />
36 «Admitamos que amar é querer para alguém aquilo que pensamos ser uma coisa boa, por causa <strong>de</strong>sse<br />
alguém e não por causa <strong>de</strong> nós». Aristóteles, Retórica, 1380b,2ªed.,Lisboa, ed. Imprensa Nacio<strong>na</strong>l Casa da<br />
Moeda, 2006, p. 170.<br />
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