Reflexões Sobre o Amor na Vita Nuova de Dante Alighieri
Reflexões Sobre o Amor na Vita Nuova de Dante Alighieri
Reflexões Sobre o Amor na Vita Nuova de Dante Alighieri
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Capítulo V – VITA NUOVA E A REFLEXÃO TEOLÓGICA SOBRE O AMOR<br />
_______________________________________________________________________________________<br />
la don<strong>na</strong> per cui <strong>Amor</strong>e ti stringe così, non é come l’altre donne, che leggeramente si<br />
muova <strong>de</strong>l suo cuore 194 .<br />
Beatriz não é, como as outras mulheres, no que diz respeito à vivência que<br />
faz da experiência amorosa. Ao contrário do que acontece no amor cortês em que<br />
a dama tem um papel passivo uma vez que trata <strong>de</strong> uma concepção <strong>de</strong> amor que<br />
se sustem <strong>na</strong> acção do amante, Beatriz é uma amada activa, que saúda o amante<br />
mas que também lhe nega a saudação como forma <strong>de</strong> mostrar o seu<br />
<strong>de</strong>scontentamento perante um comportamento do amado. A partir do universo<br />
feminino medieval Beatriz <strong>de</strong>staca-se <strong>na</strong> sua excepcio<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mulher amada,<br />
ela tem um valor ontológico assente <strong>na</strong> sua beleza, <strong>na</strong> sua atitu<strong>de</strong>, <strong>na</strong>s suas<br />
virtu<strong>de</strong>s morais, e fi<strong>na</strong>lmente nos efeitos que a sua acção é capaz <strong>de</strong> produzir<br />
<strong>na</strong>queles que com ela se relacio<strong>na</strong>m.<br />
O louvor a Beatriz que surge ao longo das pági<strong>na</strong>s <strong>de</strong> <strong>Vita</strong> <strong>Nuova</strong> e que,<br />
como acabou <strong>de</strong> ser referido, ultrapassa o plano da beleza física para adquirir<br />
uma dimensão ética e moral, po<strong>de</strong> ser lido como uma intenção clara, por parte do<br />
amante, em mostrar a dignida<strong>de</strong> da amada, instituindo o fundamento da sua<br />
valorização enquanto objecto do amor. Deste modo, a história <strong>de</strong> amor que nos é<br />
<strong>na</strong>rrada é a história <strong>de</strong> um amor or<strong>de</strong><strong>na</strong>do; <strong>Dante</strong> ama alguém que merece ser<br />
amado e neste sentido o amar que efectivam é um “amar bem”.<br />
<strong>Amor</strong> or<strong>de</strong><strong>na</strong>do, o amor <strong>de</strong> <strong>Dante</strong> por Beatriz é também um amor discretus,<br />
um amor que é feito <strong>de</strong> acordo com o conselho da razão. Várias são as<br />
passagens <strong>de</strong> <strong>Vita</strong> <strong>Nuova</strong> on<strong>de</strong> surge claramente expressa a necessida<strong>de</strong> da<br />
razão ser interveniente <strong>na</strong> relação amorosa 195 . Conceito que remonta aos<br />
teólogos, o amor discretus traduz a tomada <strong>de</strong> consciência <strong>de</strong> que o amor não é<br />
um afecto que <strong>de</strong>va ser <strong>de</strong>ixado ao acaso, à espontaneida<strong>de</strong> irreflectida e<br />
<strong>de</strong>sarrazoável, mas que <strong>de</strong>ve ser penetrado pela inteligência. Para os teólogos da<br />
Ida<strong>de</strong> Média o papel da inteligência assumiu diferentes formas. Aelredo <strong>de</strong><br />
Rievaulx ligava a intervenção da inteligência no acto <strong>de</strong> amor à avaliação do<br />
objecto do amor, o que significa que o amor discretus se liga à ordi<strong>na</strong>ta dilectio.<br />
Em Ber<strong>na</strong>rdo <strong>de</strong> Claraval encontramos um outro entendimento quanto ao papel<br />
194 DANTE.<strong>Vita</strong> <strong>Nuova</strong>, cap. XIII, 5-6, p. 85.<br />
195 Ver a abordagem feita no capítulo IV intitulada, «<strong>Sobre</strong> o sujeito do amor. Do modo como se ama».<br />
93