A Vocação das Ciências Sociais no Brasil - Fundação Biblioteca ...
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Glaucia Villas Bôas<br />
e nacionais, como veremos mais adiante. Os Centros Populares de Cultura<br />
(CPCs) surgem, justamente, num contexto em que muitos dos jovens – que<br />
tinham acesso a bens privilegiados de educação e cultura – irrompiam <strong>no</strong><br />
cenário cultural e político à procura de alternativas para os graves problemas<br />
que assolavam a grande maioria da população brasileira. O primeiro CPC foi<br />
organizado <strong>no</strong> Rio de Janeiro por um grupo, também jovem, de intelectuais e<br />
artistas e filiou-se em 1961 à União Nacional dos Estudantes, ganhando logo<br />
relevância. A UNE encarregou-se de criar outros centros semelhantes ao do<br />
Rio de Janeiro vinculando-se às Uniões Estaduais dos Estudantes (UEEs) em<br />
diversos estados brasileiros. Os integrantes dos CPCs pretendiam atuar junto<br />
às cama<strong>das</strong> populares da população brasileira – trabalhadores de baixa renda,<br />
operários, camponeses –, <strong>no</strong> sentido de lhes possibilitar a compreensão política<br />
da origem social de seus problemas imediatos (baixos salários, exploração,<br />
fome, miséria), por meio da divulgação de filmes, livros, cader<strong>no</strong>s de poesia,<br />
música etc., cujo conteúdo estivesse estreitamente relacionado ao esclarecimento<br />
político daqueles problemas. Os CPCs desenvolveram uma atividade<br />
intensa <strong>no</strong> início dos a<strong>no</strong>s 1960, encenando peças em porta de fábricas, favelas,<br />
sindicatos, publicando livros, financiando filmes, gravando discos.<br />
Além dessas atividades, o movimento dos CPCs difundiu e aprofundou a discussão<br />
sobre o compromisso político e social dos setores artísticos e intelectuais com<br />
os problemas <strong>das</strong> desigualdades de classe e da independência nacional frente à<br />
dominação imperialista liderada pelos Estados Unidos. A experiência dos CPCs,<br />
baseada na prática, motivou, inicialmente, a reflexão sobre os limites de uma produção<br />
cultural e artística comprometida politicamente, e de modo posterior, sobre<br />
a eficiência e também a validade da utilização daquela produção como meio de<br />
levar as cama<strong>das</strong> populares ao esclarecimento político de seus problemas.<br />
Como ocorre com freqüência <strong>no</strong>s movimentos liderados por jovens, a<br />
posição transitória que antecede seu ingresso <strong>no</strong> mundo adulto e do trabalho<br />
lhes permite atitudes despoja<strong>das</strong>, aspirações ousa<strong>das</strong>, às vezes controverti<strong>das</strong><br />
e nem sempre realizáveis. É possível que o mesmo tenha ocorrido com os<br />
CPCs. Ainda assim, eles “marcaram época”, senão junto às cama<strong>das</strong> populares,<br />
certamente <strong>no</strong>s meios intelectuais e artísticos, ao abordar uma de suas<br />
questões mais caras e polêmicas – o sentido social e político de suas obras.<br />
Sem dúvida, a atmosfera de inquietação, debates e polêmicas que se apodera<br />
de grupos atuantes <strong>no</strong> campo da cultura mostra seu empenho na definição<br />
do sentido social e político da produção daquele setor. Tal inquietação ocorre<br />
justamente em um contexto histórico complexo, <strong>no</strong> qual a industrialização e<br />
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