Comentário Evangelho Segundo João - Vol. 2
Comentário de João Calvino no Evangelho Segundo João - Vol. 2.
Comentário de João Calvino no Evangelho Segundo João - Vol. 2.
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280 • <strong>Comentário</strong> do <strong>Evangelho</strong> de <strong>João</strong><br />
jos não se dirigiram a Maria ao mesmo tempo, mas apenas um deles tinha<br />
a incumbência de falar. Não existe base sólida para a alegoria de Agostinho,<br />
de que a posição dos anjos – um à cabeceira, e o outro aos pés – destaca que<br />
o evangelho seria pregado desde o oriente até o ocidente. É mais digno de<br />
observação que Cristo, por meio de arranjos preparatórios dessa natureza,<br />
apresentou um enaltecimento da glória de seu reino; porque, pela honra<br />
que os anjos prestaram ao sepulcro, não só é tirada a ignomínia da cruz,<br />
mas também resplandece a majestade celestial de Cristo.<br />
13. Mulher, por que choras? À luz das afirmações dos evangelistas,<br />
pode-se facilmente concluir que o anjo manteve um longo diálogo;<br />
<strong>João</strong>, porém, faz um breve sumário do que foi falado, porque isso era<br />
suficiente para provar a ressurreição de Cristo. O diálogo consiste de<br />
censura entremeada com conforto. O anjo reprova Maria por seu pranto<br />
excessivo, mas, ao mesmo tempo, combina alegria, ao dizer que não<br />
há razão para pranto, já que Cristo ressuscitou.<br />
14. E vê Jesus em pé. Pode-se perguntar donde provém esse<br />
equívoco de Maria em não reconhecer Jesus com quem teria tão intimamente<br />
familiar? Há quem pense que apareceu em uma forma<br />
diferente, porém creio que a falha jaz, antes, nos olhos das mulheres,<br />
como Lucas [24.16] diz dos dois discípulos: seus olhos foram impedidos<br />
de reconhecê-lo. Não diríamos, pois, que Cristo estava continuamente<br />
assumindo novas formas, como Proteus, 4 mas que está no poder de<br />
4 Proteus (Πρωτεύς), rei egípcio, é mencionado por Heródoto, o qual conta que em Memphis,<br />
sua região natal, um magnificente templo foi erigido em honra dele. O historiador<br />
cita como suas autoridades os sacerdotes egípcios com quem mantinha diálogo e que lhe<br />
contaram com detalhes as mais memoráveis transações desse reinado, conectado com<br />
a ida de Helena ao Egito. E ele produz passagens da Ilíada e da Odisséia para provar que<br />
Homero estava bem familiarizado com tais fatos, ainda que decidisse dissimulá-los ou<br />
paliá-los, com o fim de criar melhores figuras em sua história (Heródoto, Livro II.112-116).<br />
A chave para a presente ilustração, contudo, deve ser encontrada nos fabulosos contos<br />
de Proteus, como uma divindade marítima a quem Ovídio descreve como Protea Ambiguum,<br />
Proteus que varia de forma (Metamorfose, Livro II. Fábula I. v. 9), e cujo alegado<br />
hábito de frequentemente mudar sua forma passou a ser um provérbio. “Ele (diz Lempriere)<br />
recebera de Netuno o dom de profecia, e de seu conhecimento da humanidade futura<br />
recebeu os maiores serviços. Ele era de difícil acesso, e, quando consultado, se recusava<br />
a dar respostas, assumindo imediatamente formas diferentes e evitando que fosse apreendido<br />
caso não fosse adequadamente preso por grilhões.” Referências proverbiais a essa<br />
fábula ocorrem frequentemente nos escritores antigos.