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Direito à memória e à verdade - Ministério da Justiça

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COMISSÃO ESPECIAL SOBRE MORTOS E DESAPARECIDOS POLÍTICOS<br />

Joaquim Câmara Ferreira foi preso em São Paulo no dia 23/10/1970 e morto sob torturas no mesmo dia. Mais conhecido por Toledo, era<br />

considerado o número 2 <strong>da</strong> ALN tendo participado diretamente do seqüestro do embaixador norte-americano, Charles Burke Elbrick, em<br />

setembro de 1969. Se encontrava em Cuba quando Carlos Marighella foi morto, em novembro do ano anterior. Retornou então ao Brasil e<br />

assumiu o comando geral <strong>da</strong>quela organização clandestina.<br />

Sua morte foi divulga<strong>da</strong> na imprensa, mais uma vez, como sendo trunfo do delegado Sérgio Paranhos Fleury, do DOPS paulista, conhecido<br />

chefe de torturas, processado várias vezes como líder maior do Esquadrão <strong>da</strong> Morte. Quem teria levado a polícia a localizar Toledo foi o<br />

militante <strong>da</strong> ALN José <strong>da</strong> Silva Tavares, preso meses antes em Belém e que teria passado a colaborar com os órgãos de segurança. Joaquim<br />

Câmara Ferreira nasceu em Jaboticabal (SP), em 05/09/1913. Era membro do Partido Comunista desde 1933. Jornalista, foi diretor de diver-<br />

sas publicações do partido e, em 1937, passou a atuar de forma clandestina, concentrando seu trabalho no sindicalismo do setor ferroviário.<br />

Durante o Estado Novo foi preso numa gráfica do PCB e torturado no DOPS paulista até perder algumas unhas <strong>da</strong> mão. Em 1946, elegeu-se<br />

vereador em Jaboticabal, mas no ano seguinte, com a cassação do registro eleitoral do PCB, perdeu o man<strong>da</strong>to. Em 1953, atuou de forma<br />

destaca<strong>da</strong> na greve geral de São Paulo. Foi vogal <strong>da</strong> <strong>Justiça</strong> do Trabalho.<br />

Em 1964, foi preso em São Bernardo do Campo, onde realizava palestra para operários sobre o papel <strong>da</strong> imprensa na luta pelas re-<br />

formas de base, sendo libertado pouco depois. Em 1967, acompanhou Marighella na formação do Agrupamento Comunista de São<br />

Paulo, embrião <strong>da</strong> ALN.<br />

Toledo foi preso por volta de 19 horas do dia 23/10/1970, na aveni<strong>da</strong> Lavandisca, bairro de Indianópolis, em São Paulo. A versão divulga<strong>da</strong><br />

foi de que Câmara morrera ao entrar em luta corporal com os agentes que buscavam prendê-lo. Na <strong>ver<strong>da</strong>de</strong>, foi levado para um sítio clan-<br />

destino pelo delegado Fleury, onde morreu no mesmo dia, por volta <strong>da</strong> meia-noite, conforme apurou a CEMDP.<br />

Em telex encontrado nos arquivos do DOPS/PE, o II Exército informa que o DOPS localizara e prendera <strong>à</strong>s 19h30min do dia 23 de outubro,<br />

Joaquim Câmara Ferreira, que investira contra os policiais causando em vários deles ferimentos generalizados, tendo falecido no decurso <strong>da</strong><br />

diligência. Continua a mensagem: “Informo ain<strong>da</strong> foi <strong>da</strong>do conhecer repórteres imprensa fala<strong>da</strong> escrita seguinte roteiro para ser explorado<br />

dentro do esquema montado na área”.<br />

Um Relatório Especial de Informações nº 7/70, exemplar nº 18, do <strong>Ministério</strong> do Exército, assinado pelo general de Briga<strong>da</strong> Ernani Ayrosa<br />

<strong>da</strong> Silva, Chefe do Estado-Maior do II Exército, encontrado nos arquivos do DOPS/SP com o título de prisão e morte de Joaquim Câmara<br />

Ferreira, Toledo ou Velho, registra que o delegado Sérgio Paranhos Fleury, tendo obtido informação de que José <strong>da</strong> Silva Tavares, esteve<br />

com Toledo, antes de seguir para o norte do país, obteve autorização e apoio do II Exército para buscar o preso e trazê-lo para São Paulo.<br />

Depois de cerca de um mês de exaustivo processo de investigação, partindo <strong>da</strong> colaboração do infiltrado, fora levanta<strong>da</strong> uma pista, no dia<br />

21 outubro. No relatório consta que: “sendo submetido a interrogatório, Toledo foi acometido de crise cardíaca, que lhe ocasionou a morte,<br />

apesar <strong>da</strong> assistência médica a que foi submetido”.<br />

A morte de Toledo sob torturas já havia sido denuncia<strong>da</strong> pelos presos políticos <strong>da</strong> época, basea<strong>da</strong> nos relatos de Maria de Lourdes Rego Melo<br />

e Viriato Xavier de Mello Filho, que também foram torturados no mesmo sítio clandestino do delegado Fleury.<br />

Em depoimento prestado <strong>à</strong> CEMDP, Maurício Klabin Segall, que é filho de Lasar Segall, um dos mais importantes artistas plásticos do Brasil,<br />

e convivia com Câmara Ferreira desde a déca<strong>da</strong> de 50, relatou o ocorrido com detalhes bem precisos. Maurício foi preso na tarde do dia 23<br />

de outubro, junto com Maria de Lourdes Rego Melo. Os dois foram levados ao sítio do delegado Fleury. Maurício assim narrou os fatos:<br />

“(...) No sítio, bem primitivo, ao qual chegamos de olhos ven<strong>da</strong>dos, a iluminação era de velas, pois não havia luz elétrica. O sítio aparentemen-<br />

te tinha dois quartos, uma sala/cozinha e um banheiro. Os choques elétricos aplicados no pau-de-arara eram gerados num aparelho, acio-<br />

nado por manivela manual. Já estava lá sendo torturado Viriato, recém chegado de Cuba. (...) Tudo que se passava num dos cômodos, mesmo<br />

com porta fecha<strong>da</strong>, se ouvia nos demais. (...) Quando fui pendurado, o interrogador era o próprio Fleury. (...) Em meio <strong>da</strong> minha tortura no

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