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Direito à memória e à verdade - Ministério da Justiça

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DIREITO À MEMÓRIA E À VERDADE<br />

Segundo o testemunho de Zalfa de Lima Soares, esposa de Wilson, e de Eunice Ferreira <strong>da</strong> Silva, emprega<strong>da</strong> doméstica na residência <strong>da</strong><br />

família, e levando em conta as declarações dos próprios assassinos, sabe-se que <strong>à</strong>s 9 horas do mesmo dia, os três dirigiram-se <strong>à</strong> casa de<br />

Wilson Soares <strong>da</strong> Cunha, na rua Osvaldo Cruz, 203, naquela ci<strong>da</strong>de mineira. Maurilio Avelino de Oliveira aproximou-se dos três ocupantes<br />

de um Jeep Land Rover – o pai Otávio e os filhos Augusto e Wilson – fazendo-se passar por amigo. Depois de retirarem a chave do jipe, os<br />

fazendeiros passaram a atirar. Augusto teve morte imediata. O pai, Otávio, então com 70 anos, já alvejado, ain<strong>da</strong> conseguiu sair do veículo,<br />

engatinhou tentando refugiar-se no interior <strong>da</strong> casa, mas foi perseguido por Lindolfo, que o atingiu no rosto. Faleceu três dias depois, no<br />

hospital. Wilson Soares <strong>da</strong> Cunha, gravemente ferido, sobreviveu. Os assassinos ain<strong>da</strong> foram ao hospital procurar o outro filho de Otávio, o<br />

médico Milton Soares, que foi protegido pelos colegas médicos e enfermeiros.<br />

O alvo principal <strong>da</strong> incursão seria o filho Wilson, que sobreviveu aos disparos, e sabi<strong>da</strong>mente apoiava as ativi<strong>da</strong>des de Chicão em defesa<br />

<strong>da</strong> Reforma Agrária, tendo também ligações políticas com o jornalista Carlos Olavo, conhecido nacionalmente por defender as Reformas<br />

de Base e o governo João Goulart por meio do jornal tablóide O Combate, de Governador Vala<strong>da</strong>res. O jornalista Carlos Olavo conseguiu<br />

escapar <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de com a família, obteve exílio no Uruguai e só retornou ao Brasil em 1979, com a decretação <strong>da</strong> anistia.<br />

A viúva Guiomar Soares <strong>da</strong> Cunha conseguiu do delegado Paulo Reis a abertura de Inquérito Policial. Segundo o jornal Última Hora, em 72<br />

horas o delegado Bastos Guimarães tinha o nome dos criminosos e os denunciou ao juiz Alves Peito, que decretou a prisão preventiva dos<br />

mesmos. Os assassinos passaram <strong>à</strong> condição de foragidos. A partir <strong>da</strong>í travou-se uma batalha política envolvendo os coronéis Pedro Ferreira<br />

e Altino Machado, o major do exército Henrique Ferreira <strong>da</strong> Silva, a Associação Ruralista de Governador Vala<strong>da</strong>res e outros apoiadores do<br />

novo governo, resultando na decisão do coronel Dióscoro Gonçalves do Vale, coman<strong>da</strong>nte do ID-4, de requisitar, com base no primeiro Ato<br />

Institucional, que o processo <strong>da</strong>s mortes fosse transferido para a <strong>Justiça</strong> Militar.<br />

O InquEerito Policial Militar (IPM) foi chefiado pelo Major Célio Falheiros. Em 19/08/1966, o Conselho Extraordinário de <strong>Justiça</strong> do Exército, na<br />

sede <strong>da</strong> Auditoria <strong>da</strong> 4ª Região Militar, homologou a farsa jurídica inicial. O promotor Joaquim Simeão de Faria pediu ao Conselho que decidisse se,<br />

“no dia do crime ain<strong>da</strong> se considerava em Estado Revolucionário, pois apesar dos tiros terem sido desfechados pelas costas, se estivessem em estado<br />

Revolucionário haveria de ser considera<strong>da</strong> a situação em que tais tiros foram desfechados” ou se os acusados simplesmente cometeram homicídio<br />

doloso. Os advogados dos criminosos alegaram que os três acusados “estavam no estrito cumprimento do dever legal”, que a “situação era revolucio-<br />

nária e estavam em guerra”, que “os acusados, ao receberem voz de prisão, tentaram a fuga, o que determinara a reação dos acusados, que somente<br />

poderiam tomar atitude enérgica e viril eis que de dentro <strong>da</strong> casa onde tentaram refugiar não se sabia o que de lá viria”.<br />

Na decisão, o conselho mandou apurar as responsabili<strong>da</strong>des <strong>da</strong>s pessoas aponta<strong>da</strong>s como subversivas e, por maioria de votos, 4 contra 1,<br />

absolveu os acusados Wander Campos e Lindolfo Rodrigues Coelho e, por 3 a 2, absolveu o acusado Maurílio Avelino de Oliveira. O Minis-<br />

tério Público recorreu ao STM, que reformou a sentença.<br />

Em Governador Vala<strong>da</strong>res, havia sido ofereci<strong>da</strong> denúncia contra os assassinos em 17/05/1965. Os réus obtiveram no STF habeas-corpus<br />

recolhendo os man<strong>da</strong>dos de prisão. Depois de uma série de tramitações judiciais, o STM, em 11/1/1967, condenou os três criminosos a 17<br />

anos e meio de reclusão, por unanimi<strong>da</strong>de. O jornal Estado de Minas de 03/11/1996, com o titulo Memória de um crime em matéria assina<strong>da</strong><br />

por Tim Filho, informa que os criminosos foram indultados por intermediação do governador Rondon Pacheco.<br />

O relator na CEMDP concluiu que, “há decisões jurídicas comprovando que os três criminosos desempenhavam serviço de natureza policial convoca-<br />

dos por autori<strong>da</strong>des militares. Tanto é que foram julgados, absolvidos e condenados no âmbito <strong>da</strong> <strong>Justiça</strong> Militar. Comprova<strong>da</strong> está também, farta-<br />

mente, a motivação política dos crimes. Duas pessoas foram mortas, com tiros pelas costas e uma feri<strong>da</strong>, estando to<strong>da</strong>s desarma<strong>da</strong>s, após receberem<br />

ordem de prisão. Preenchidos estão todos os requisitos exigidos pela Lei nº 9.140/95”, 9.140/95 e votou pelo deferimento do processo.<br />

O general Oswaldo Pereira Gomes solicitou vistas ao processo e lavrou o seguinte voto vencido: “Verificamos que o STF tomou uma<br />

decisão política por 4 a 3 votos, man<strong>da</strong>ndo julgar pela <strong>Justiça</strong> Militar um ato Revolucionário de civis que obviamente não poderiam<br />

ser punidos, por terem sido vitoriosos e, se fosse o caso de punir, o julgamento deveria ter-se realizado na <strong>Justiça</strong> Comum. Ao final de<br />

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