Direito à memória e à verdade - Ministério da Justiça
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De qualquer forma, cabe destacar que, ao fixar a <strong>da</strong>ta<br />
inicial de abrangência <strong>da</strong> Anistia em 2 de setembro de<br />
1961, os legisladores entenderam que, já na crise política<br />
<strong>da</strong> renúncia do presidente Jânio Quadros, a normali<strong>da</strong>de<br />
democrática havia sido rompi<strong>da</strong> por uma intervenção<br />
militar inconstitucional.<br />
Nos meses que antecederam a aprovação <strong>da</strong> lei, o<br />
Comitê Brasileiro pela Anistia encaminhou ao senador<br />
alagoano Teotônio Vilela, presidente <strong>da</strong> Comissão<br />
Mista forma<strong>da</strong> para examinar a matéria no Congresso<br />
Nacional, um amplo dossiê com a história dos mortos<br />
e desaparecidos. Mais tarde, esse documento foi sistematizado<br />
e ampliado pela Comissão de Familiares e<br />
pela Comissão de Ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia e <strong>Direito</strong>s Humanos <strong>da</strong> Assembléia<br />
Legislativa do Rio Grande do Sul, servindo de<br />
base para inúmeros trabalhos posteriores.<br />
A orientação imposta por Figueiredo <strong>à</strong> tramitação do<br />
projeto de anistia era contrária <strong>à</strong> defendi<strong>da</strong> pelos parentes<br />
dos perseguidos políticos e pelos Comitês de Anistia.<br />
Uma <strong>da</strong>s poucas sobreviventes <strong>da</strong> chama<strong>da</strong> Guerrilha<br />
do Araguaia, Criméia Alice Schmidt de Almei<strong>da</strong>, aponta<br />
as inconsistências <strong>da</strong>quele projeto: “a isonomia prevista<br />
na Constituição era desrespeita<strong>da</strong> de modo flagrante<br />
quando pessoas já condena<strong>da</strong>s por crimes de opinião eram<br />
contempla<strong>da</strong>s, ao passo que se excluíam aquelas com<br />
processo ain<strong>da</strong> em an<strong>da</strong>mento. Além de não anistiar os<br />
participantes nas organizações e operações de resistência<br />
arma<strong>da</strong>, a proposta deixava brechas para auto-absolvição<br />
dos agentes do Estado envolvidos em crimes de tortura,<br />
seqüestro, assassinato e ocultação de cadáveres”.<br />
O artigo 1º <strong>da</strong> lei, explica Criméia, fala em crimes políticos<br />
ou conexos com estes, frase que deu margem <strong>à</strong><br />
interpretação de que abrange to<strong>da</strong>s aquelas mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>des<br />
de ação repressiva. “No entanto, o nome de ca<strong>da</strong><br />
anistiado era publicado formalmente no Diário Oficial <strong>da</strong><br />
União, ao passo que nenhum agente <strong>da</strong> repressão política<br />
teve seu nome incluído nesses anúncios. Dezenas de presos<br />
políticos permaneceram encarcerados após a Anistia,<br />
sendo soltos apenas por força de mu<strong>da</strong>nças introduzi<strong>da</strong>s,<br />
meses antes, na Lei de Segurança Nacional”.<br />
Segundo Belisário dos Santos Junior, advogado e membro<br />
<strong>da</strong> Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos<br />
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Políticos desde 2001, “para tentar esvaziar a campanha<br />
pela Anistia, o Governo Geisel obteve, como um de seus<br />
últimos atos, a aprovação de uma nova Lei de Segurança<br />
Nacional, a de número 6.620, em dezembro de 1978,<br />
mantendo como base a Doutrina de Segurança Nacional,<br />
mas introduzindo a diminuição de to<strong>da</strong>s as penas,<br />
em função de que inúmeros presos políticos foram soltos,<br />
pela adequação de suas condenações <strong>à</strong> nova lei”.<br />
Mais de dez anos depois, persistindo na batalha permanente<br />
para obter informações e denunciar os crimes cometidos<br />
pelo Estado sob o regime militar, os brasileiros<br />
que buscavam o paradeiro de seus filhos, pais, irmãos<br />
e amigos desde os anos 70 reavivaram a esperança em<br />
4 de setembro de 1990, com a descoberta de uma vala<br />
comum no cemitério Dom Bosco, em Perus, periferia <strong>da</strong><br />
ci<strong>da</strong>de de São Paulo. Escavações revelaram 1.049 ossa<strong>da</strong>s<br />
onde, provavelmente, se misturavam restos mortais<br />
de opositores políticos, indigentes e vítimas dos esquadrões<br />
<strong>da</strong> morte. Não por acaso, no mesmo cemitério<br />
haviam sido encontrados, em 1979, os restos mortais de<br />
Luiz Eurico Tejera Lisbôa, o primeiro desaparecido político<br />
a ser localizado, depois de a viúva, Suzana Keniger<br />
Lisbôa, perseguir pistas durante sete anos.<br />
Suzana e outros familiares retomaram, em 1990, a investigação<br />
<strong>da</strong>s suspeitas envolvendo aquele cemitério como<br />
local onde os agentes <strong>da</strong> repressão política ocultavam cadáveres.<br />
O jornalista Caco Barcellos produziu matéria para<br />
o programa Globo Repórter, mas a emissora preferiu não<br />
exibir a reportagem naquele momento. O caso só foi adiante,<br />
de fato, pela determinação <strong>da</strong> prefeita Luiza Erundina<br />
(1989-1992), que após a abertura <strong>da</strong> vala de Perus assumiu<br />
as investigações e apoiou a criação de uma Comissão<br />
Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara Municipal de<br />
São Paulo, para examinar a questão, contribuindo para<br />
ampliar a discussão na socie<strong>da</strong>de.<br />
Em 1992, pressões exerci<strong>da</strong>s sobre o presidente <strong>da</strong> República,<br />
Fernando Collor de Mello (1990-1992), levaramno<br />
a determinar a devolução dos arquivos do DEOPS<br />
de São Paulo, que tinham sido transferidos para a Polícia<br />
Federal como precaução do governo militar quando<br />
o PMDB venceu as eleições estaduais. Em segui<strong>da</strong>, eles<br />
foram abertos para consultas dos familiares, advogados e<br />
jornalistas, repetindo-se a transparência já demonstra<strong>da</strong>