Direito à memória e à verdade - Ministério da Justiça
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Ao final dos trabalhos a CEMDP, além dos 132 nomes<br />
do Anexo <strong>da</strong> Lei, aprovou 221 casos e indeferiu 118. As<br />
indenizações não obedeceram a um cronograma preestabelecido.<br />
O critério único de cálculo foi o <strong>da</strong> expectativa<br />
de vi<strong>da</strong> de ca<strong>da</strong> um dos mortos ou desaparecidos.<br />
O critério único de cálculo foi o <strong>da</strong> espectativa de vi<strong>da</strong><br />
de ca<strong>da</strong> um dos mortos e desaparecidos. O piso foi fixado<br />
em R$ 100 mil e a maior indenização paga — R$<br />
152.250,00 — foi para os familiares de Nil<strong>da</strong> Carvalho<br />
Cunha. O primeiro pagamento, feito em maio de 1996,<br />
beneficiou a gaúcha Ermelin<strong>da</strong> Mazaferro Bronca, mãe<br />
de José Huberto Bronca, desaparecido no Araguaia. Com<br />
quase 90 anos, ela era a mais velha entre os familiares.<br />
No ano seguinte, Ermelin<strong>da</strong> ofereceria parte do dinheiro<br />
<strong>da</strong> indenização para financiar a busca dos corpos na<br />
ci<strong>da</strong>de de Xambioá, hoje estado de Tocantins.<br />
Para o atual presidente <strong>da</strong> CEMDP, Marco Antônio Rodrigues<br />
Barbosa, os mortos e desaparecidos políticos<br />
<strong>da</strong> ditadura sempre retornam, não descansam. “O que<br />
não é assimilado pela História reaparece como sintoma”,<br />
diz. Para ele, em primeiro lugar, o trabalho <strong>da</strong><br />
Comissão Especial é a possibili<strong>da</strong>de, com a resposta<br />
do Estado, <strong>da</strong> restauração <strong>da</strong> justiça e <strong>da</strong> paz, para<br />
que perseguições, mortes e desaparecimentos forçados<br />
nunca mais voltem a acontecer neste país. Depois,<br />
esses trabalhos possibilitam a cicatrização de feri<strong>da</strong>s:<br />
a luta dos familiares constitui uma decisão com força<br />
de um destino trágico grego, “pois, como Antígona em<br />
sua luta para <strong>da</strong>r sepultura ao irmão, assim eles fazem<br />
com relação aos seus entes queridos mortos e desaparecidos,<br />
muitos deles assassinados pela ditadura e<br />
enterrados como indigentes”.<br />
“Nessa atribuição de reconhecer a morte ou desaparecimento<br />
dos perseguidos políticos e de indenizar seus<br />
familiares, a Comissão Especial desempenhou um papel<br />
histórico, pois desmontou a mentira oficial dos órgãos<br />
de repressão em vários casos”. A opinião é de Augustino<br />
Veit, ex-presidente e ain<strong>da</strong> integrante <strong>da</strong> CEMDP. “Para<br />
ca<strong>da</strong> morto, apresentavam uma justificativa, mas nunca<br />
assumiam a culpa ou explicavam os detalhes contraditórios”.<br />
Ele avalia que os problemas enfrentados para<br />
fazer instrução processual dos casos estu<strong>da</strong>dos sempre<br />
ocorreram pela não-abertura de arquivos ain<strong>da</strong> guar<strong>da</strong>dos,<br />
ou até mesmo ditos incinerados.<br />
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COMISSÃO ESPECIAL SOBRE MORTOS E DESAPARECIDOS POLÍTICOS<br />
Augustino Veit reforça a importância, <strong>da</strong>qui para a<br />
frente, de localizar os restos mortais dos desaparecidos,<br />
assinalando a necessi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> colaboração <strong>da</strong>s Forças<br />
Arma<strong>da</strong>s e <strong>da</strong> Polícia Federal, tanto na abertura dos<br />
arquivos quanto na orientação sobre localização de<br />
corpos e pistas que ajudem. “Nunca houve normativa<br />
de que documentos fossem destruídos. Acredito que<br />
tiveram destino irregular”, afirma, assumindo que<br />
não se pode aceitar a alegação de que os arquivos já<br />
foram destruídos.<br />
Busca dos corpos<br />
A partir de 1996, conquista<strong>da</strong> a Lei nº 9.140 e instala<strong>da</strong><br />
a CEMDP, os familiares passaram a se concentrar<br />
mais na busca dos corpos. Embora a primeira<br />
etapa dos trabalhos tivesse sido difícil, pela urgência<br />
de análise dos diversos casos, a busca dos despojos<br />
mostrou-se muito mais desgastante. Miguel Reale<br />
Junior conta que precisou insistir com o <strong>Ministério</strong><br />
<strong>da</strong> Defesa, mostrando ser “impossível que se desconhecesse,<br />
pela envergadura <strong>da</strong> operação militar no<br />
Araguaia, onde tinham ocorrido confrontos e onde os<br />
revoltados haviam sido presos e mortos”.<br />
Desde 1990, a descoberta <strong>da</strong> vala de Perus, onde foram<br />
identifica<strong>da</strong>s duas ossa<strong>da</strong>s – Frederico Eduardo Mayr e<br />
Denis Casemiro – havia demonstrado que essa busca<br />
valia a pena. Depois disso, outras valas comuns foram<br />
localiza<strong>da</strong>s e abertas, como a do Cemitério Ricardo de<br />
Albuquerque, no Rio de Janeiro, e do Cemitério <strong>da</strong> Várzea,<br />
em Recife. No entanto, pelas dificul<strong>da</strong>des financeiras<br />
e falta de colaboração dos órgãos oficiais, foram<br />
diminutos os avanços.<br />
Em abril de 1996, corroborando o argumento dos familiares<br />
de que ain<strong>da</strong> existem arquivos não revelados, escondidos<br />
em repartições oficiais ou em mãos priva<strong>da</strong>s,<br />
o jornal O Globo publicou reportagem sobre a Guerri-<br />
lha do Araguaia, na qual teriam desaparecido quase 70<br />
pessoas. Pela primeira vez, um órgão <strong>da</strong> grande imprensa<br />
reforçava a hipótese de que muitos militantes teriam<br />
sido presos antes de ser eliminados.<br />
O jornal publicou uma foto de Maria Lúcia Petit <strong>da</strong> Silva,<br />
integrante do PCdoB, morta naquela operação mili-