MÚSICA DE FESTIVAL: - Arte, Cultura e Sociedade na América ...
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– cruza fronteiras entre a oralidade e a escrita, entre a cultura popular e a cultura letrada. Ao<br />
apropriar-se da voz do gaucho, mas ao mesmo tempo distanciando-se dela, Hernández anda<br />
pelas bordas de um campo de tensões. (LOIS, 2004: 39) Nesse sentido, a literatura gauchesca<br />
constitui-se como um híbrido que, não livre de conflitos, mostra-se como a “aliança de<br />
classes”, algo extremamente interessante dentro de um projeto de consolidação do Estado-<br />
Nação.<br />
Pois bem, de que maneira a construção desse perso<strong>na</strong>gem-chave dentro do contexto<br />
literário argentino passa a fazer algum sentido quando pensamos no nosso “gaúcho<br />
brasileiro”? Para Maria Elizabeth Lucas (1990), o regio<strong>na</strong>lismo gaúcho 48 no estado do Rio<br />
Grande do Sul é uma construção intelectual fundada em níveis distintos de percepção (ou<br />
visões de mundo) e em uma experiência primordial (ou <strong>na</strong> falta dela) com a cultura pastoril do<br />
Rio Grande do Sul. Nesse sentido, através de uma análise da construção semântica da palavra<br />
“gaúcho”, a autora pôde perceber como as imagens e representações da sociedade sulista - que<br />
produziram o regio<strong>na</strong>lismo gaúcho como uma construção ideológica - mostraram como os<br />
intelectuais (tanto do Rio Grande do Sul, quanto de outros estados) traduziram condições<br />
sócio-econômicas e interesses de classe específicos em uma herança histórica e uma<br />
identidade cultural comum. Assim, a autora identifica três momentos distintos no panorama<br />
dos movimentos revitalizadores da chamada cultura gaúcha: num primeiro momento - <strong>na</strong><br />
virada do século XIX - uma idealização, por parte dos intelectuais locais, de grêmios<br />
recreativos para cultivar as tradições gaúchas 49 . A partir da II Guerra Mundial, um novo<br />
momento se estrutura com a criação de Centros de Tradições Gaúchas (CTGs) por estudantes<br />
secundaristas de Porto Alegre 50 . Por fim, um último momento relacio<strong>na</strong>-se à emergência, nos<br />
anos 1970, do que se chamou de “<strong>na</strong>tivismo” dos festivais de música, baseados também <strong>na</strong><br />
valorização dessa cultura gaúcha.<br />
Passemos a uma análise mais detalhada destes três momentos decisivos para a<br />
consolidação de representações em torno da cultura gaúcha atualmente, levando em conta,<br />
obviamente, o contexto de pesquisa ao qual me insiro. De acordo com Álvaro Santi (2004), <strong>na</strong><br />
segunda metade do século XIX, a região da campanha sul-rio-grandense sofreu grandes<br />
48 De acordo com Santi (2004), no contexto do RS, usa-se habitualmente o termo “regio<strong>na</strong>lismo” com um<br />
significado que extrapola a literatura, para desig<strong>na</strong>r qualquer aspecto da cultura característico do Estado, da<br />
culinária à maneira de vestir.(SANTI, 2004:17)<br />
49 De acordo com Ruben Oliven (1992), em 1868, é fundado em Porto Alegre o “Partenon Literário”, uma<br />
sociedade de intelectuais e letrados que tentava unir os modelos culturais vigentes <strong>na</strong> Europa com a visão<br />
positivista da oligarquia sul-rio-grandense através da exaltação da temática regio<strong>na</strong>l gaúcha. E em 1898, por<br />
iniciativa do republicano e positivista João Cezimbra Jacques, surge a primeira agremiação tradicio<strong>na</strong>lista, o<br />
Grêmio Gaúcho de Porto Alegre. (OLIVEN, 1992: 71-73)<br />
50 Como é o caso do “35 CTG”, primeiro CTG fundado em 1948.<br />
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