MÚSICA DE FESTIVAL: - Arte, Cultura e Sociedade na América ...
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A questão do estilo nos remete a uma discussão interessante. Temos a imagem de um<br />
grande caldeirão a fervilhar e, dentro dele, diferentes ingredientes que lhe dão um aroma, um<br />
sabor e uma coloração única. A imagem da mistura é tentadora, e no caso da música popular<br />
no Brasil, liga-se ao debate sobre a definição problemática de uma cultura brasileira, o famoso<br />
paradigma da mestiçagem. Como a<strong>na</strong>lisa Vian<strong>na</strong>, a música apresenta-se então como uma<br />
“quebra de barreiras”, servindo de elemento unificador de grupos sociais distintos. No<br />
entanto, o atravessar fronteiras não constitui novidade ou surpresa. Sabemos que a música foi,<br />
provavelmente, um dos primeiros elementos culturais a atravessar continentes e oceanos. No<br />
entanto, é preciso notar como ela também ajudou a consolidar fronteiras. No caso da música<br />
tradicio<strong>na</strong>lista gaúcha, o trabalho de construção de um estilo próprio demarca lugares<br />
diferenciais para cada elemento reconhecido como influente. Na leitura que faz de Johan<br />
Matheson – teórico musical alemão do século XVIII – Tiago de Oliveira Pinto (2004) a<strong>na</strong>lisa<br />
que estilos musicais se diferenciam <strong>na</strong> medida em que também o caráter <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l de cada<br />
povo apresenta particularidades. Sendo assim, a constituição de <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lidades, símbolos<br />
regio<strong>na</strong>is, teria um papel fundamental <strong>na</strong> demarcação do que é de “dentro” e do que é de<br />
“fora”, também <strong>na</strong> música.<br />
Parece haver consenso entre os pesquisadores da música tradicio<strong>na</strong>lista gaúcha já<br />
citados, de que a imigração insular (açoria<strong>na</strong>) teria sido a influência mais marcante para a<br />
constituição da música gauchesca. Nesse sentido, a classificação “gêneros de propagação<br />
européia”, utilizada por Oliveira & Vero<strong>na</strong>, questio<strong>na</strong> a importância dada à imigração alemã -<br />
iniciada a partir de 1824 - <strong>na</strong> difusão de gêneros como a valsa, a polca e o schottisch no Rio<br />
Grande do Sul, que já seriam executados em solo <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l desde o início do século XIX 79 .<br />
Interessante que outras fontes, como Menezes Bastos (2005), Sandroni (2001), Lucas (1990) e<br />
Vian<strong>na</strong> (1995), informam que a polca e a valsa teriam chego ao Brasil por volta de 1840 80 .<br />
De fato, tais gêneros não chegam ao Brasil única e exclusivamente devido à imigração alemã,<br />
porém, é interessante pensar como os autores constroem seu argumento, diferenciando-se de<br />
um ponto de vista que consideram equivocado 81 . Sem reificar a questão da exatidão da data,<br />
79<br />
Para fundamentar sua argumentação, os autores citam o livro “Viagem ao Rio Grande do Sul, 1820-1821”, de<br />
Auguste de Saint-Hilaire, onde em 1820 o viajante já teria presenciado a dança da valsa em Porto Alegre e Rio<br />
Grande. Também atentam para a chegada da corte portuguesa em 1808 como um fato importante para a<br />
constatação de que esses gêneros já estariam presentes em bailes da elite. (OLIVEIRA; VERONA, 2006: 25)<br />
80<br />
Vian<strong>na</strong> informa ainda que a polca teria sido introduzida no Brasil por artistas de companhias de teatro<br />
francesas. (VIANNA, 1995: 49)<br />
81<br />
Os autores parecem dialogar, fundamentalmente, com uma de suas referências bibliográficas mais utilizadas, o<br />
livro de Tasso Bangel “O estilo gaúcho <strong>na</strong> música brasileira” (1989). Em uma passagem importante, Bangel<br />
afirma que a partir de 1824, o estilo gaúcho teve um grande impulso com a chegada da colonização alemã <strong>na</strong><br />
Capitania de São Pedro do Sul, “trazendo consigo a liberdade da valsa, da mazurka, do schottisch e da polca<br />
(...)”. (Bangel, 1989: 20)<br />
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