MÚSICA DE FESTIVAL: - Arte, Cultura e Sociedade na América ...
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Retomando a questão apresentada no início desse capítulo, parece essencial a<strong>na</strong>lisar a<br />
importância que a idéia de cultura recebe entre os diferentes sujeitos do gauchismo. Ser<br />
gaúcho pode representar, primordialmente, um estado de espírito. Mas ele se manifesta em<br />
atividades específicas; isto é, pode ser observado dentro de um conjunto de elementos que os<br />
sujeitos definem como cultura gaúcha. Como vimos, muitos desses elementos foram<br />
interpretados de diferentes maneiras, mesmo que constituindo um imaginário base sobre a<br />
vida dos gaúchos. Acompanhando o raciocínio de Lucas (1990), podemos compreender esse<br />
processo como o resultado da articulação entre sistemas sociais e sistemas simbólico-<br />
culturais. Nesse sentido, as representações coletivas advindas de tal articulação seriam<br />
formadas por um conjunto de imagens, símbolos, temas e conceitos – que alguns teóricos<br />
denomi<strong>na</strong>ram como “imagi<strong>na</strong>ção social” – através dos quais categorias de classe, gênero,<br />
idade, etnia, identidades regio<strong>na</strong>is e <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is são construídas. (LUCAS, 1990: 43) Contudo,<br />
sabemos que elas não são imóveis, mas sim passíveis de mudanças de acordo com as<br />
conjunturas que se apresentam aos sujeitos. Assim, a idéia de cultura parece representar um<br />
elo entre as diferentes interpretações vigentes, criando uma base referencial, algo que<br />
supostamente elimi<strong>na</strong>ria possíveis ambigüidades e desconfortos. Como a<strong>na</strong>lisa José Carlos<br />
Rodrigues (1989), o conceito de cultura é muito útil como rótulo exterior, serve para a<br />
observação a partir de um ângulo externo, mas é muito pobre para compreendermos uma<br />
sociedade desde dentro, assumindo um ponto de vista interior. (RODRIGUES, 1989: 167)<br />
Dessa forma, a idéia de uma cultura gaúcha se apresenta como porto seguro, posto que os<br />
próprios sujeitos que dizem vivenciá-la reconhecem sua diversidade e antagonismos internos.<br />
Pensar em uma forma abstrata e homogênea tor<strong>na</strong>-se, portanto, uma boa maneira de contar a<br />
alguém “de fora” o que é a cultura gaúcha – como aconteceu comigo em várias ocasiões.<br />
Durante a pesquisa percebi que apesar de os músicos <strong>na</strong>tivistas admitirem diferenças<br />
de perspectiva marcantes com relação aos tradicio<strong>na</strong>listas, há uma atitude de respeito quanto<br />
aos feitos do MTG. Embora tenham estabelecido regras prejudiciais à livre expressão da<br />
música <strong>na</strong>tiva, os tradicio<strong>na</strong>listas teriam sido responsáveis por um importante movimento de<br />
valorização da cultura gaúcha, principalmente num momento em que o Brasil estaria sendo<br />
bombardeado por produtos culturais estrangeiros, bem como pela homogeneização cultural<br />
alavancada pelo eixo Rio-São Paulo. Nesse sentido, ainda que alguns músicos <strong>na</strong>tivistas<br />
apontem a folclorização do Rio Grande do Sul pelo MTG como algo prejudicial, consideram<br />
que esse “mal” é necessário.<br />
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