208 História<strong>se</strong> realiz<strong>ou</strong> em São Paulo em 1997. Por tudo isso e pelagrande contribuição que traz ao discutir conosco questõesrelativas ao preparo de profissionais para trabalharemna área da educação, às mudanças com as quais nosdeparamos em nossa realidade e em nossa profissãoque nos esclarecem e nos fazem refletir sobre nossasposições pessoais e profissionais, nosso reconhecimento.Cruces: Você poderia <strong>se</strong> apre<strong>se</strong>ntar para nós efalar um p<strong>ou</strong>co sobre <strong>sua</strong> formação e <strong>sua</strong> trajetóriaprofissional? Sei que você tem uma formaçãodiferente da nossa por ter sido feita em L<strong>ou</strong>vain,na Bélgica, e acredito que ela caracteriza muito de<strong>sua</strong>s concepções, de <strong>sua</strong> maneira de atuar e defazer Psicologia, não é?Maluf: O meu interes<strong>se</strong> pela educação é “qua<strong>se</strong>genético”, nascido do cotidiano com uma mãe apaixonadapelo ensino de crianças, nos anos longínquos em que <strong>se</strong>rprofessora era não só uma missão de vida e cidadaniacomo também um reconhecimento de mérito pelasociedade e pelos órgãos públicos responsáveis pelaeducação nacional. As circunstâncias e um certo nívelde escolha pessoal levaram-me ao curso de Psicologiadepois de cursar Pedagogia.Minha formação em psicologia, que <strong>se</strong> estendeu atéo d<strong>ou</strong>torado, numa universidade estrangeira, de “primeiromundo”, a Universidade Católica de L<strong>ou</strong>vain, na Bélgica,proporcion<strong>ou</strong>-me um modo de entender a ciênciapsicológica que em alguns aspectos diferenci<strong>ou</strong>-<strong>se</strong> doque mais tarde verifiquei que era mais comum no Brasil,nos cursos de psicologia nascentes: estamos no final dosanos 60. É verdade que, de volta ao meu país, que <strong>se</strong>debatia aprisionado por um governo de exceção, foinecessário um período de re-adaptação para dar-meconta das peculiaridades de <strong>se</strong> fazer psicologia daeducação nas contingências políticas, socioculturais eeconômicas vigentes em um país integrante da AméricaLatina conturbada daqueles anos difíceis, chamados noBrasil de anos de chumbo.Penso que recebi uma formação que me permitiuuma preocupação constante com a demarcação doconhecimento científico, com a ética e com asnecessidades concretas da sociedade brasileira, nacomplexidade das interações que nos colocam problema<strong>se</strong> contradições nunca completamente resolvidas. Por<strong>ou</strong>tro lado, minha convivência, às vezes muito intensa,com <strong>ou</strong>tras culturas – quero dizer, em diferentes paí<strong>se</strong><strong>se</strong> continentes, com pessoas diversas quanto à etnia,religião, visão de mundo, escolarização- bem como asnumerosas oportunidades de intercâmbio compesquisadores psicólogos através de reuniões científicas,congressos, sociedades científicas internacionais, fizeramcom que <strong>se</strong> consolidas<strong>se</strong> em mim uma visão de ciênciamuito proces<strong>sua</strong>l, em construção, distante de toda equalquer perspectiva dogmática e cristalizada. Não merefiro à adoção de uma epistemologia relativista etamp<strong>ou</strong>co ao ecletismo. Refiro-me ao reconhecimentoefetivo e ao respeito pelas diferenças, ao reconhecimentoda dignidade inerente do <strong>ou</strong>tro, à provisoriedadede muitas de nossas convicções. Por muito convictosque estejamos de nossas certezas, tudo pode mudar. Semlevar ao pé da letra, esta postura tem a ver com a te<strong>se</strong>de Heráclito para quem a água do rio nunca é a mesma.Resta responder: e o rio é o mesmo? Caberá a cada umdecidir, <strong>se</strong>gundo o <strong>se</strong>u conceito de rio. E haveremos deconvir que diferentes respostas poderão <strong>se</strong>r igualmenteverdadeiras!<strong>Para</strong> nosso pensamento ocidental analítico e linear, éas vezes muito difícil entender que para uma mesmaquestão possa existir mais de uma resposta verdadeira.Mas pode! Se as potencialidades humanas são universais,como admito, é porém a cultura que decide quais delas<strong>se</strong> expressam e a forma de que <strong>se</strong> revestem. Somos<strong>se</strong>melhantes a todos os indivíduos humanos em algunsaspectos, <strong>se</strong>melhantes a alguns em <strong>ou</strong>tros aspectos eem alguns aspectos somos únicos. A formação querecebi, os intercâmbios nacionais e internacionais queexperienciei, as reflexões sobre anos de prática docentederam-me uma mente muito aberta e me ensinaram aconviver com a dúvida <strong>se</strong>m me <strong>se</strong>ntir desconfortável.Tive uma formação muito generalista. E isto foi bomporque tive também muitas oportunidades deespecialização. Mas, a formação generalista, <strong>se</strong>gundoob<strong>se</strong>rvo, pode <strong>se</strong>r danosa <strong>se</strong> não for <strong>se</strong>guida por algumaforma de especialização. As vias que percorri meensinaram a conviver bem com a dúvida científica, istoé, admito que a ciência psicológica me ensina muitascoisas mas a experiência pessoal também ensina e aassimetria entre essas duas fontes de conhecimento nãoé constante. Aprendi a fazer escolhas provisórias. Porisso não s<strong>ou</strong> eclética, no <strong>se</strong>ntido de não comprometer<strong>se</strong>com coisa alguma, no <strong>se</strong>ntido do vale tudo. Mas tomodecisões diversas em circunstâncias diversas. Não adotoprincípios universais fora do tempo e do espaço. Ahistória dos grandes sofrimentos da humanidade no<strong>se</strong>nsina muita coisa. As duas grandes guerras do início
História 209do século 20 fizeram ruir grandes esperanças econfianças apressadas no poder humanizador doprogresso das ciências. Ciência e técnica produziramterríveis armamentos e procedimentos que transformaramsonhos em pesadelos. Con<strong>se</strong>qüentemente,convivo bem com a psicologia científica atual na qualcoexistem paradigmas diversos. Nenhum deles mefornece todas as respostas de que preciso para explicara complexidade do comportamento humano. Particularmentequando <strong>se</strong> trata de Psicologia e Educação: emcircunstâncias diferentes precisamos de respostasdiferentes, embora as coordenadas <strong>se</strong>jam aparentementeas mesmas. Estas respostas podem vir da psicanáli<strong>se</strong>,do comportamentismo, das neurociências do comportamento,da fenomenologia, do cognitivismo, doculturalismo... Meu ponto de partida é o problema, <strong>ou</strong><strong>se</strong>ja, a questão concreta para a qual est<strong>ou</strong> procurand<strong>ou</strong>ma explicação. Costumo alertar meus estudantes paraa necessidade de <strong>se</strong> fazer escolhas, mesmo que <strong>se</strong>jamescolhas muito provisórias, para que <strong>se</strong> possa conduzirpesquisas dentro dos paradigmas aceitos na atualsociedade do conhecimento em que estamos in<strong>se</strong>ridos.Na contemporaneidade o saber epistemológico é umconvite à reflexão constante, não no abstrato que gerafalsa erudição, mas sim na exposição ao real com o qualnos deparamos e que deve conduzir-nos ao movimentoconstante prática-teoria-prática. É deste movimento que,<strong>se</strong>gundo acredito, nasce o conhecimento útil compotencial transformador dos indivíduos e sociedades, cujobem-estar deve <strong>se</strong>r objetivo do pesquisador e doprofissional da Psicologia e da Educação.Cruces: Em que medida você considera que <strong>se</strong>jaimportante o treino em pesquisa na formação dopsicólogo e em especial para preparar o psicólogopara trabalhar na área da educação? Comoconciliar essa necessidade com as demais daformação em um curso noturno, por exemplo?Maluf: Pesquisar é produzir conhecimento:conhecimento útil. A utilidade do conhecimento não é<strong>se</strong>mpre evidente, mas assumo que ele <strong>se</strong>mpre <strong>se</strong>rve ainteres<strong>se</strong>s. É portanto indispensável ao pesquisadorbuscar entender na medida de <strong>sua</strong>s possibilidades a queinteres<strong>se</strong>s ele <strong>se</strong>rve quando produz conhecimento.Afirmamos com facilidade que a formação dopsicólogo precisa incorporar a pesquisa. Penso queninguém atualmente afirmaria o contrário. Mas, formarpara a pesquisa parece estar tomando a forma de umfetiche. Há que responder: o que significa, no concreto,formar para a pesquisa? Diferentes significações sãofacilmente atribuíveis a um mesmo enunciado. <strong>Os</strong>teóricos da repre<strong>se</strong>ntação social provavelmente concordariamcomigo e verificariam essa hipóte<strong>se</strong> através depesquisa sistemática. <strong>Para</strong> mim, formar-<strong>se</strong> em pesquisasignifica aprender a não <strong>se</strong> contentar com respostasprontas, sobretudo com aquelas envoltas em falsa<strong>se</strong>rudições e em certezas apoiadas em pressupostosdistantes da verificação e da controvérsia. A pesquisa éuma especialidade. É falso afirmar, por exemplo, quetodo educador, <strong>ou</strong> professor, é <strong>ou</strong> tem que <strong>se</strong>r pesquisador!É possível <strong>se</strong>r um excelente educador <strong>ou</strong> professor<strong>se</strong>m <strong>se</strong>r pesquisador! Assim como um excelentepesquisador pode <strong>se</strong>r um péssimo professor! Pesquisarexige um saber específico, que envolve várias habilidadesa <strong>se</strong>rem sistematicamente aprendidas. Formar-<strong>se</strong> empesquisa significa também aprender a fazer perguntaspara o real e distinguir entre aquelas perguntas que podem<strong>se</strong>r respondidas através de procedimentos metodológicosapropriados e aquelas que não são respondíveis nocontexto da ciência psicológica atual.A certeza é inimiga da ciência. Também o é oceticismo. <strong>Os</strong> paradigmas da pós-modernidade nosconvidam a refletir sobre a complexidade, sobre aorganização do caos, sobre a diversidade e colocam nocentro das preocupações o papel da cultura naconstituição de nossas funções psicológicas superiores,no <strong>se</strong>ntido em que Vygotski as entendeu. Algunspsicólogos contemporâneos enxergam a psicologia comopsicologia cultural. Não penso que es<strong>se</strong> deva <strong>se</strong>r o pontode partida para a formação na pesquisa, mas é umhorizonte a <strong>se</strong>r apontado para os jovens pesquisadores.É preciso que eles o tenham como horizonte mas dêempequenos passos. Dar pequenos passos significa estudarmétodos, aprender diferentes delineamentos lógicos,refletir e experimentar formas possíveis de coletar dados,capacitar-<strong>se</strong> para entender o valor e os limites dosdiferentes tipos de análi<strong>se</strong>, confrontar o real com osconceitos verbais utilizados para expressá-lo.Preparar o psicólogo para trabalhar na área daeducação significa introduzi-lo no conhecimento dofenômeno educação e instrumentalizá-lo para trabalharem instituições, particularmente na escola, instrumentaliza-lopara entender o papel determinante dasinterações: adulto-criança, criança-criança, adulto-adulto,pais, funcionários, professores. <strong>Para</strong> trabalhar bem naárea da educação o psicólogo deve ter adquirido
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