107não lhe faz perguntas e reza pela alma pagã <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>. Todas as suas frustrações são<strong>de</strong>scontadas nas orações. Qualquer motivo basta-lhe para que vá silenciosamente, assustada etrêmula, rezar aos pés <strong>de</strong> <strong>Santa</strong> Catarina, sua santa <strong>de</strong> <strong>de</strong>voção. Essas atitu<strong>de</strong>s são vistas como“fraquezas <strong>de</strong> mulher” (1992, p. 115) pelo mari<strong>do</strong>. Essa submissão também ocorre durante asrefeições. Nesses momentos ela espera pacientemente que Teo<strong>do</strong>ro sirva a comida primeiro epermanece calada e cabisbaixa até que ele termine <strong>de</strong> se alimentar.D. Almerinda é uma prisioneira em seu próprio lar. Não fala o que pensa por me<strong>do</strong> dasatitu<strong>de</strong>s <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>, aten<strong>de</strong> as or<strong>de</strong>ns que ele lhe dá com passos ligeiros e <strong>de</strong>sliza pela casasem fazer o menor ruí<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> percebe que ele está nervoso, pois, tem por obrigaçãogarantir-lhe um ambiente <strong>de</strong> paz e tranqüilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> casa. Dessa maneira, vive triste esolitária. Dentre todas as personagens femininas até aqui estudadas ela é a que mais seaproxima, em seus gestos e atitu<strong>de</strong>s, <strong>do</strong> sofrimento e da repressão enfrenta<strong>do</strong>s pela mulhergaúcha da época em uma socieda<strong>de</strong> machista e autoritária.Também fazem parte <strong>do</strong> enre<strong>do</strong> da obra o casal Janguta e Francisca. Eles vivem há anosno interior <strong>de</strong> São João Batista. Janguta está velho e sente-se fraco, não tem coragem <strong>de</strong>enfrentar os man<strong>do</strong>nismos <strong>do</strong> Coronel Teo<strong>do</strong>ro. Francisca e Rosa passam seus dias a cuidar<strong>do</strong> rancho e das poucas coisas que tem <strong>de</strong>ntro.Quan<strong>do</strong> recebem a visita <strong>de</strong> Lobo, para entregar a intimação, convidam-no para entrarna pequena peça on<strong>de</strong> há somente <strong>de</strong> mobília uma mesa <strong>de</strong> tábua <strong>de</strong> caixão, duas ca<strong>de</strong>irasbrancas, uma com a perna quebrada e, crava<strong>do</strong> no esteio, uma folhinha <strong>de</strong> santo. Nessemomento Francisca não compreen<strong>de</strong> o significa<strong>do</strong> da palavra “intimação”, mas suspeita quenão se trate <strong>de</strong> boa coisa pela entonação com que foi pronunciada. Isso <strong>de</strong>monstra que ela nãotem muito conhecimento <strong>de</strong> mun<strong>do</strong>, pois vive isolada e em situação miserável naquele fun<strong>do</strong><strong>de</strong> campo. Essa mulher sente-se in<strong>de</strong>fesa e <strong>de</strong>samparada diante da situação em que seencontram e não se imagina moran<strong>do</strong> na cida<strong>de</strong>, está <strong>de</strong>snorteada.Ricar<strong>do</strong> é que dá um pouco <strong>de</strong> esperança à sua família, amenizan<strong>do</strong>, a situação comnovos pensamentos, pois tem um maior conhecimento <strong>do</strong> assunto, além <strong>de</strong> manter-seinforma<strong>do</strong> e com novos pensamentos em relação ao assunto. Enquanto o filho e Jangutaconversam, Francisca permanece quieta, ouvin<strong>do</strong> atenciosamente, mas não participa <strong>do</strong>assunto. Rosa, por sua vez, pouco compreen<strong>de</strong> o que o irmão fala, recosta-se na pare<strong>de</strong> e olha
108encantada, embevecida para os argumentos e expressões <strong>de</strong> Ricar<strong>do</strong>. Essa atitu<strong>de</strong> revela aaflição e a preocupação em que se encontram as duas.Francisca revolta-se com a situação, em seu íntimo sente vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> gritar a Lobo e seuajudante “[...] excomunga<strong>do</strong>s!” (1992, p. 91), e em pensamento chama o Coronel Teo<strong>do</strong>ro eseus ajudantes <strong>de</strong> homens ruins, <strong>de</strong>sgraça<strong>do</strong>s e <strong>de</strong>scara<strong>do</strong>s, porém, limita-se a suspirar, nãotem coragem sequer <strong>de</strong> esbravejar em voz alta, resigna-se e cala.A única saída que a família encontra é ir embora <strong>de</strong> on<strong>de</strong> vivem. No <strong>final</strong> <strong>do</strong> romance,Janguta, Francisca e Rosa vão embora <strong>do</strong> campo, a pé, para a cida<strong>de</strong>, o lugar que Franciscatem me<strong>do</strong> <strong>de</strong> morar porque acredita que lá morrerão ligeiro. Seu sonho <strong>de</strong> morrer ali, no lugaron<strong>de</strong> sempre morara, termina naquele instante. Parte <strong>de</strong>siludida.A diferença <strong>de</strong> Francisca e Rosa <strong>de</strong> D. Almerinda é somente o nível social, pois nafazenda, D. Almerinda tem à disposição tecnologias e conforto enquanto Rosa e Franciscanão têm essas mor<strong>do</strong>mias. Mesmo viven<strong>do</strong> com recursos diferentes, elas sofrem da mesmamaneira. São três mulheres que não falam, não participam das <strong>de</strong>cisões e vivem em seumun<strong>do</strong> <strong>do</strong>méstico, cuidan<strong>do</strong> da casa e <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>, sempre angustiadas e nervosas.In<strong>do</strong> para a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São João Batista encontramos outro casal: Dr. Serafim e D.Alcina. Dr. Serafim é advoga<strong>do</strong>, chefe político situacionista que possui gran<strong>de</strong> prestígio juntoao governo estadual. Quan<strong>do</strong> recebe o telefonema <strong>do</strong> Coronel Teo<strong>do</strong>ro, ele preocupa-se emespalhar a notícia da invasão <strong>do</strong>s comunistas com a intenção <strong>de</strong> tirar proveito da situação paraadquirir dinheiro aos cofres <strong>do</strong> parti<strong>do</strong>. Bastante exagera<strong>do</strong> e vai<strong>do</strong>so, Serafim gosta <strong>de</strong>ostentar seu po<strong>de</strong>r e costuma gabar-se <strong>de</strong> suas conquistas, a atual é Lolita, viuvinha discreta e<strong>do</strong> mesmo parti<strong>do</strong>. Exalta-se <strong>de</strong> sua habilida<strong>de</strong> em enganar a mulher todas as noites após ojantar, quan<strong>do</strong> alega que vai dar uma “voltinha cívica” (1992, p. 126)D. Alcina passa os dias a cuidar da casa, é uma mulher religiosa que <strong>de</strong>dica a maioria <strong>de</strong>seu tempo livre à Igreja. Com a visita <strong>do</strong> bispo à cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São João Batista organiza em suacasa um quarto para hospedá-lo. Passa os dias limpan<strong>do</strong>, esfregan<strong>do</strong>, preparan<strong>do</strong> pratos para obispo em companhia <strong>de</strong> suas amigas carolas e nem <strong>de</strong>sconfia <strong>do</strong> relacionamento <strong>de</strong> seumari<strong>do</strong> com Lolita. É uma mulher solitária. Sua vida gira em torno da casa e <strong>do</strong>s afazeres<strong>do</strong>mésticos, <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> e da Igreja. Ela não tem a companhia <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> que trabalha to<strong>do</strong> o
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