91impostos pela socieda<strong>de</strong>, pois, mesmo que fale, não é ouvida, é oprimida, não tem voz ativa,vive em função da casa, <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> e <strong>do</strong>s filhos.O casal Alzira e Chiru merece <strong>de</strong>staque em Sem rumo. A jovem Alzira sempre viveu nocampo, a auxiliar sua mãe no serviço da casa. Ela sente-se presa e só naquele fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> campo,não gosta da solidão em que vive, on<strong>de</strong> nem mesmo segre<strong>do</strong>s é possível existir entre ela e suamãe já que não há novida<strong>de</strong>s naquela vida rotineira <strong>de</strong> rincão: “E que segre<strong>do</strong>s iam ter elas,trancafiadas toda vida naquele rincão?” (1997, p. 103)Ao tomar banho na sanga próxima a sua casa, a menina reencontra Chiru, antigo amorjuvenil, que rumava à cida<strong>de</strong> na busca <strong>de</strong> uma vida melhor. A jovem vê nisso a oportunida<strong>de</strong><strong>de</strong> conhecer algo novo, <strong>de</strong> mudar <strong>de</strong> vida, e vai com ele, porém <strong>de</strong>cepciona-se ao conhecer acida<strong>de</strong>. É a primeira vez que ela entra num povoa<strong>do</strong> e imagina encontrar muito requinte econforto, mas se <strong>de</strong>para com a miséria da vida citadina, casas velhas sem reboco, bêba<strong>do</strong>s eruas estreitas. Sua casa é <strong>de</strong> um lance, um rancho <strong>de</strong> capim e torrão.Chiru e Alzira têm um filho. A moça cuida <strong>do</strong>s serviços caseiros enquanto Chiru éboteiro, faz fretes entre Brasil e Uruguai. Essa profissão, porém, não lhe agrada, pois, sereconhece como um homem <strong>do</strong> campo, que já experimentara a liberda<strong>de</strong> e largueza da vida nacampanha:A sua sina tinha que ser outra...outra...bem outra! Os filhos da puta! Quem? To<strong>do</strong>s.Fodam-se! Não nascera para viver arro<strong>de</strong>an<strong>do</strong> o povo. Carregava no sangue umperpétuo apelo á vida que mal esboçara na campanha, guri ainda. Agora, os seusvizinhos, que viviam (viviam?) amontoa<strong>do</strong>s na imundície daquelas bibocas,achavam que estavam bem <strong>de</strong> vida. A profissão <strong>de</strong> boteiro era das melhorzinhas porali... Muitos o invejavam. Coita<strong>do</strong>s, não tinham mais o que invejar! (1997, p. 110)Alzira enfrenta com Chiru todas as dificulda<strong>de</strong>s da vida e assiste a <strong>de</strong>cadência <strong>do</strong>companheiro. Vive sem esperanças <strong>de</strong> um futuro melhor, jamais expressa seus <strong>de</strong>sejos paraChiru, permanece calada, resignada com a vida que leva, aparenta não ter forças, ser tomadapela timi<strong>de</strong>z e aceitar a condição sub-humana <strong>de</strong> miséria em que se encontra:Quan<strong>do</strong> o índio chegou ao rancho, à meia-noite, quase borracho, Alzira, <strong>de</strong> cócoras,assoprava os carvões <strong>do</strong> fogareiro para refogar o guisa<strong>do</strong>. Ao vê-lo, levantou-se comdificulda<strong>de</strong>, que a barriga pesava. [...] Soprou uma viração fresca no oitão,arrepian<strong>do</strong> a quincha mal feita da cumeeira. Dentro <strong>do</strong> rancho ventava como na rua.(1997, p. 110)
92À mulher, na socieda<strong>de</strong>, cabe a condição incontestável <strong>de</strong> cuidar <strong>do</strong> filho e <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>.Essa regra imposta à conduta feminina fica expressa na atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> Alzira em um velório. Jácansada <strong>de</strong> segurar o filho, que não para <strong>de</strong> chorar, ela sente os braços cansa<strong>do</strong>s, uma certafraqueza. Pensa em pedir ajuda ao pai da criança, mas ligeiramente muda <strong>de</strong> opinião aoverificar que na sala há mais mulheres com seus filhos no colo. Rapidamente se recompõe etorna a embalar Joãozinho.Ela, como todas as personagens femininas até aqui mencionadas, é uma mulher semcoragem <strong>de</strong> tentar um <strong>de</strong>stino melhor para sua família, pois mesmo com a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>voltar para o campo, on<strong>de</strong> vivem seus pais, acata as <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> e vive uma vida <strong>de</strong>miséria, cuidan<strong>do</strong> da casa, <strong>do</strong> companheiro e <strong>do</strong> filho. A moça também não sabe como seriasua recepção caso retornasse para o campo, porque sua atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> fugir com um rapaz sem sercasada na Igreja é vista como uma postura indigna <strong>de</strong> uma boa moça.Leonor e Siá Catarina também surgem no <strong>de</strong>correr <strong>do</strong> enre<strong>do</strong>. Em nenhum momento datrama é mencionada alguma união conjugal <strong>de</strong> ambas. Em uma passagem são cita<strong>do</strong>s os filhos<strong>de</strong> Leonor e nunca o seu mari<strong>do</strong>, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que po<strong>de</strong>mos enten<strong>de</strong>r que ela é mãe solteira e,portanto, <strong>de</strong>svalorizada perante a socieda<strong>de</strong>. Siá Catarina e Leonor são negras e empregadas<strong>de</strong> seu Nicanor, auxiliam D. Eufrásia, esposa <strong>do</strong> fazen<strong>de</strong>iro, nas tarefas <strong>do</strong> lar na casa gran<strong>de</strong>da Estância. Quan<strong>do</strong> o patrão muda-se para a cida<strong>de</strong>, cabe às duas serviçais tomar conta dacasa, abrir as janelas <strong>de</strong> vez em quan<strong>do</strong> para arejá-la e evitar o mofo, lavar, passar, cozinhar ecosturar.Ambas presenciam a cena em que Clarimun<strong>do</strong> bate violentamente em Chiru epenalizam-se, sentem vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> interce<strong>de</strong>r e pedir pelo menino, <strong>de</strong> o <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r das relhadas<strong>do</strong> capataz, porém, a única coisa que Siá Catarina consegue dizer durante aquela cena bruta éuma frase <strong>de</strong> aparente indiferença, com a intensão <strong>de</strong> disfarçar seu me<strong>do</strong>: “-Está quente achaleira Evarista? Botou erva nova na cuia? Tu sabes como é esse teu mari<strong>do</strong>.” (1997, p.80)Siá Catarina assume o papel <strong>de</strong> mãe <strong>de</strong> Chiru e auxilia na criação <strong>do</strong> menino, por isso,ao fugir da Estância, ele admite que sentirá sauda<strong>de</strong>s da negra velha: “Siá Catarina, <strong>do</strong>rmin<strong>do</strong>,a negra velha, nem sonhava com aquilo... Era só <strong>de</strong> quem levava sauda<strong>de</strong>.” (1997, p. 82)
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