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Manual de Audiência e Prática Trabalhista - Gustavo Cisneiros - 2017

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serviços.<br />

6.1.<br />

Efeitos do pré-contrato na competência territorial<br />

O pré-contrato <strong>de</strong> trabalho é capaz <strong>de</strong> influenciar na fixação da competência territorial. A pré-contratação está prevista no<br />

art. 48 do CDC e no art. 427 do CCB, normas que são aplicadas subsidiariamente ao direito do trabalho, pela sintonia que têm<br />

com os princípios do direito laboral – inteligência do art. 8º da CLT.<br />

Art. 48 do CDC. As <strong>de</strong>clarações <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> constantes <strong>de</strong> escritos particulares, recibos e pré-contratos relativos<br />

às relações <strong>de</strong> consumo vinculam o fornecedor, ensejando inclusive execução específica, nos termos do art. 84 e<br />

parágrafos.<br />

Art. 427 do CCB. A proposta <strong>de</strong> contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos <strong>de</strong>la, da<br />

natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso.<br />

Art. 422 do CCB. As partes são obrigadas a respeitar, seja na pactuação, na execução ou na conclusão do<br />

contrato, os princípios <strong>de</strong> probida<strong>de</strong> e boa-fé.<br />

A base do direito do consumidor é a mesma do direito do trabalho: o princípio da proteção ao hipossuficiente. Esse <strong>de</strong>talhe<br />

fortalece ainda mais a aplicação subsidiária do CDC à relação <strong>de</strong> emprego.<br />

Nos Estados do Nor<strong>de</strong>ste do Brasil a arregimentação <strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra rural é um fato corriqueiro. Digamos que uma Usina,<br />

localizada no interior <strong>de</strong> São Paulo, esteja com dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> conseguir cortadores <strong>de</strong> cana na região e a solução é “importar”<br />

empregados <strong>de</strong> outras localida<strong>de</strong>s. Um representante da Usina vai até a Zona da Mata <strong>de</strong> Pernambuco e consegue 300<br />

trabalhadores rurais, os quais acertam os <strong>de</strong>talhes do trabalho ainda em Pernambuco, sendo transportados <strong>de</strong> ônibus para São<br />

Paulo. Chegando ao local <strong>de</strong> trabalho, fazem exame médico e têm as carteiras assinadas. No fim da safra, os trabalhadores são<br />

levados <strong>de</strong> volta a Pernambuco. Por não terem recebido verbas rescisórias, <strong>de</strong>sejam buscar a Justiça do Trabalho. Caso as<br />

reclamações sejam propostas em Pernambuco, possivelmente a Usina, em sua <strong>de</strong>fesa, irá opor exceção <strong>de</strong> incompetência em<br />

razão do lugar, alegando que a prestação <strong>de</strong> serviços ocorreu exclusivamente no interior <strong>de</strong> São Paulo, on<strong>de</strong> fica a se<strong>de</strong> da<br />

empresa, pelo que <strong>de</strong>ve incidir o caput do art. 651 CLT. Por cautela, a Usina também <strong>de</strong>monstrará que o § 3º do art. 651 da<br />

CLT não po<strong>de</strong> ser aplicado ao caso, afinal os empregados foram contratados no interior <strong>de</strong> São Paulo, sendo este também o<br />

local da prestação <strong>de</strong> serviços. Ora, se o local da contratação coinci<strong>de</strong> com aquele da prestação <strong>de</strong> serviços, o § 3º do art. 651 da<br />

CLT per<strong>de</strong> o seu fato gerador. O advogado do excepto (reclamante), quando for se pronunciar sobre a exceção <strong>de</strong><br />

incompetência em razão do lugar, <strong>de</strong>verá levantar a tese da pré-contratação, falando dos arts. 48 do CDC e 427 do CCB. Dirá<br />

que os empregados foram “pré-contratados” em Pernambuco e prestaram serviços em São Paulo, requerendo a aplicação do § 3º<br />

do art. 651 da CLT, afirmando, com vigor, que esta norma garante ao obreiro o ajuizamento da ação no local da “précontratação”,<br />

da contratação ou da prestação <strong>de</strong> serviços, <strong>de</strong>monstrando que trata-se <strong>de</strong> preceito <strong>de</strong> lei que merece interpretação<br />

extensiva, pois nasceu com o escopo <strong>de</strong> proteger a parte mais frágil da relação.<br />

Lei do Pavilhão ou da Ban<strong>de</strong>ira<br />

Encontra-se na Convenção <strong>de</strong> Havana, ratificada mediante o Decreto 18.871/ 1929, conhecido por Código <strong>de</strong> Bustamante.<br />

Não estamos discutindo a competência em razão do lugar, pois ela já está <strong>de</strong>finida no art. 651 da CLT. Nesse tópico, a exemplo<br />

do anterior, o <strong>de</strong>bate envolve a legislação trabalhista a ser aplicada. Segundo a Lei do Pavilhão, a legislação a ser aplicada às<br />

relações <strong>de</strong> trabalho da tripulação <strong>de</strong> navios <strong>de</strong>ve ser a do local da matrícula da embarcação. A regra, contudo, não é absoluta,<br />

comportando exceções, a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r do caso. Significa dizer que a Lei do Pavilhão (ou Lei da Ban<strong>de</strong>ira) não é o critério<br />

<strong>de</strong>finitivo em matéria <strong>de</strong> aplicação da legislação trabalhista. À luz dos princípios norteadores do Direito laboral pátrio, o<br />

aplicador do Direito sempre vai enxergar a existência <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> emprego entre o tripulante (empregado) e a empresa que<br />

explora o navio (“armador”). O empregador, por conseguinte, não é necessariamente o proprietário da embarcação, mas a<br />

empresa que a utiliza (art. 2º da CLT). Isso se encontra, inclusive, no Decreto 64.618/1969, art. 3º, que trata das embarcações<br />

pesqueiras: “Consi<strong>de</strong>ra-se empregador, para os efeitos <strong>de</strong>ste Regulamento, o armador da embarcação pesqueira, seja ou não o<br />

proprietário <strong>de</strong>la”.<br />

Digamos que Maria seja contratada por uma empresa brasileira para trabalhar em um navio italiano que vai realizar<br />

diversos cruzeiros na Grécia. Maria, brasileira, po<strong>de</strong> ajuizar reclamação aqui no Brasil, pois não existe norma internacional<br />

prevendo o contrário (§ 2º do art. 651 da CLT). A legislação trabalhista a ser aplicada pelo juiz do trabalho é a brasileira, diante<br />

da nacionalida<strong>de</strong> do seu empregador.

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