Edith sempre gostara <strong>de</strong> chamar a atenção, nomeadamente dos homensnos bares, e essa noite não fora uma excepção. Vestira uma saia curtaque lhe realçava as coxas morenas e uma blusa justa, sem alças, ocultando-lheapenas uma parte mínima dos seios. Antes <strong>de</strong> saírem <strong>de</strong> casa, elaandava já a voltejar à sua frente, a rir com exagero e a lançar-lhe pequenosolhares flamejantes por entre as pestanas. Rooker sabia que mesmo quea amasse, mesmo que a inundasse da admiração e do afecto suficientespara a sufocar, isso não seria o bastante para satisfazer Edith. Ela nascerapara se sentir insatisfeita e estava con<strong>de</strong>nada a querer mais do que podiaalcançar. Se o possuísse a ele, o seu <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> afirmação levá-la-ia a <strong>de</strong>sejartambém outros homens. Se o sentisse mais distante, iria adulá-lo, <strong>de</strong>safiá-loe seduzir, até que ele se ren<strong>de</strong>sse. Antes <strong>de</strong>ssa noite em Dallas já setinham separado duas vezes. Mas Edith sabia sempre qual o botão on<strong>de</strong><strong>de</strong>via tocar.Naquela noite ela estava com um comportamento bravio, instigadopela irritação que sentia por ele e pelo <strong>de</strong>sprezo em relação ao resto domundo. Mal acabara a primeira bebida, já tinha metido a língua na boca <strong>de</strong>um tipo qualquer. O homem enfiou logo as mãos no interior da camisola<strong>de</strong> Edith e Rooker empurrou-o violentamente para trás, apertando-o <strong>de</strong>encontro ao balcão. No entanto, ao mesmo tempo que o fazia, perguntavapara si próprio porque agia assim. Não <strong>de</strong>sejava estar ali com ela, mas nãoconseguia imaginar qualquer outro sítio on<strong>de</strong> quisesse estar.— Não faça isso — disse Rooker calmamente ao novo amigo <strong>de</strong>Edith.Este tentou sorrir. — Ah, peço-lhe <strong>de</strong>sculpa. Só pensei…— nos pêlos,sobre o lábio superior, tinham-se formado gotículas <strong>de</strong> suor.Rooker teve a sensação <strong>de</strong> que estava ao lado <strong>de</strong> si próprio e observava,contrafeito e <strong>de</strong>sgostoso, o seu comportamento. Deixou cair as mãos aolongo do corpo.— Vamos embora — disse para Edith.No exterior, esta roçou o corpo por ele. Estava tensa e ágil como umgato. — Olá! — sussurrou-lhe ao ouvido. Como <strong>de</strong> costume, a agressivida<strong>de</strong><strong>de</strong> Rooker excitava-a.A noite, que começara já mal, foi-se agravando <strong>de</strong> forma consistente.Seguiram-se outros bares e bebidas. Acabaram num lugar munido <strong>de</strong> umapista <strong>de</strong> dança e no momento seguinte, Edith estava já a dançar, completamentefora <strong>de</strong> si, <strong>de</strong>sprovida da pequena saia e da blusa justa. Andava umhomem por ali, <strong>de</strong> braços grossos e vermelhuscos a condizer com um cabeloáspero e ruivo, e Rook reparou num daqueles braços a <strong>de</strong>slizar entre ascoxas <strong>de</strong> Edith. Com uma sensação opressiva <strong>de</strong> tristeza, Rook puxou-a pelaparte <strong>de</strong> trás do pescoço, como se ela fosse <strong>de</strong> facto um gato, <strong>de</strong>sviando-a do14
alcance do outro. A seguir enfrentou o homem ruivo, vendo pelo canto doolho o pessoal <strong>de</strong> segurança do bar a dirigir-se na direcção <strong>de</strong>les.— Mariconço — rugiu o outro.— Lá para fora — rispostou Rook.A noite estava quente e pesada. De início, Rook quase não se conseguiamover, tolhido pela pressão da contrarieda<strong>de</strong> e da repugnância, mas quandoo punho do homem lhe bateu no canto do olho quase por acaso, a doracen<strong>de</strong>u-lhe na cabeça um rastilho com a brancura do fósforo. Deu-lhe umsoco, e outro soco logo a seguir. O homem caiu quase instantaneamente.Rook viu-lhe o rosto completamente <strong>de</strong>scomposto, com os <strong>de</strong>ntes e ossosdiluídos numa massa <strong>de</strong> sangue, e teve a sensação <strong>de</strong> que o tinha matado.Um horror doentio e uma onda <strong>de</strong> memórias vieram ao seu encontro, fazendo-orecuar <strong>de</strong> mãos erguidas para ocultar aquela cena.Deixou o homem jazido no meio do chão. Tinha largado Edith algures,no interior do bar, pelo que voltou para casa no meio <strong>de</strong> um movimentolento, doloroso e confuso. No chão da casa <strong>de</strong> banho viam-se asmarcas dos pés <strong>de</strong> Edith, em contornos <strong>de</strong> pó <strong>de</strong> talco. Esfregou-as como flanco do punho, parecendo-lhe que o chão se inclinava para ambos oslados e que a cara esmagada do homem o olhava fixamente, do outro ladodo espelho.Quando voltou a acordar, Rooker viu que estava na cama, completamentevestido, e que ela dormia a seu lado. Olhou-a <strong>de</strong> revés, porque sóconseguia abrir um dos olhos. Edith tinha a cara esborratada <strong>de</strong> pintura àvolta dos olhos e formavam-se bolhas entre os lábios inertes à medida querespirava. A luz do quarto tinha uma tonalida<strong>de</strong> cinzento-escura e respirava-seum ar pesado. Sentou-se muito <strong>de</strong>vagar, estremecendo com a dor. Naalmofada on<strong>de</strong> pousara a cabeça havia sangue pisado. A saliva tinha umsabor amargo na boca.Tenho <strong>de</strong> me afastar daqui, disto, pensou ele.Antes <strong>de</strong> conseguir fazer outro movimento, Edith mexeu-se. Olhoupara ele, com os olhos a piscar e concentrou-se por momentos no que via.— Meu Deus — murmurou.Rooker levantou-se e virou lentamente a cabeça em direcção ao espelhodo guarda-vestidos. O olho esquerdo estava inchado, com a pele numtom <strong>de</strong> carmesim brilhante. As pestanas estavam reduzidas a espigões pretos,envolvidas nos tecidos contundidos. Tinha um corte grosseiro cujosbordos, em sangue, subiam <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o centro do queixo até ao canto do olho.O homem <strong>de</strong>via usar um anel enorme. Ergueu os <strong>de</strong>dos para tocar naquelaárea, enquanto a memória do que tinha acontecido na noite anterior ia regressandoem pequenos fragmentos nada agradáveis. Edith continuava nomesmo sítio, sem se mexer.15
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pela cabina de rádio-transmissão,
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pessoas. No quarto reservado ao alo
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Parecia ter-se já estabelecido que
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Capítulo SeisAlice estava de pé,
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As paredes do átrio da Sullavanco
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Por detrás das janelas fumadas da
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a exploração e a descoberta cient
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— O que posso eu fazer? — pergu
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— Oh, Deus — exclamou Becky, co
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vazia - tudo o que não necessitava
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um milhão de centros nervosos.Porq
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dos CDs. Comeu muito pouco, mas est
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Heathrow a piscar à distância. Tr