Alice estivera a recordar-se da visão que tivera do jardim, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong>conseguir chegar até junto dos arbustos e construir as suas grutas nas sebes.Tão gran<strong>de</strong> como o país inteiro, enquanto o lago pantanoso com as rãs lheparecera um imenso mar.— A certeza? — repetiu ela.— Em relação a não ires para o Sul.— Sim, tenho. Em termos realistas, em que iria consistir o meu estudoali?Era mais fácil falar assim com Trevor, não só porque ele se interessavapelos resultados das suas investigações nas rochas sedimentológicas, mastambém porque ouvia o que ela dizia, quer se relacionasse ou não com aciência.— Daquilo que sei não vais precisar <strong>de</strong> te candidatar a um subsídio.Limitas-te a ir, a investigar aquilo que te interessar e Sullavan paga a factura.Isso não acontece todos os dias, não é?Quase todos os projectos <strong>de</strong> pesquisa pressupunham uma fase <strong>de</strong>dicadaao trabalho <strong>de</strong> campo, para o estudo das formações das rochas e arecolha <strong>de</strong> amostras <strong>de</strong>stinadas à análise laboratorial. A organização das expediçõesa sítios remotos era dispendiosa e exigia um apoio complexo. Ascandidaturas tinham <strong>de</strong> ser redigidas em termos precisos e bem cuidados,<strong>de</strong> forma a suscitar a aprovação e o apoio financeiro suficiente da parte dasorganizações subsidiárias, o que acabava por ser habitualmente a parte maisdifícil do processo. Alice estava ainda à espera <strong>de</strong> saber se lhe seria concedidauma bolsa para a pesquisa dos próximos seis meses.— Em que é que consiste o projecto?Não <strong>de</strong>ra à própria Margaret a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se alargar muito sobreo assunto, pelo que a mãe não era a única culpada em não ouvir. Por vezes,pensava ela, nós realçamos o lado pior <strong>de</strong> cada uma. Colidimos contra osprincípios uma da outra, erguendo farpas e arestas.Trevor lançou a beata do cigarro para a sebe. — Trata-se <strong>de</strong> uma produçãoin<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, como seria <strong>de</strong> esperar <strong>de</strong> qualquer coisa que se relacionassecom Sullavan. Kandahar fica localizada na base da península daAntárctida. Foi construída na década <strong>de</strong> 1950 pela British Antarctic Survey,que acabou por a fechar no final da década <strong>de</strong> 1990, por se ter tornado<strong>de</strong>masiado dispendiosa. A baía gela durante o Inverno, tornando-se difícilabastecer a estação em termos anuais. Estavam prestes a <strong>de</strong>smontar osedifícios e a limpar a zona, quando Sullavan apareceu e se ofereceu para acomprar para servir <strong>de</strong> base ao seu projecto <strong>de</strong> estimação: a União Europeiana Antárctida. Para a BAS saía muito mais barato ven<strong>de</strong>r o local, tal comoestava, que custear as <strong>de</strong>spesas da limpeza, pelo que Sullavan conseguiu obteruma pechincha. Agora, ele precisa <strong>de</strong> dotar o projecto <strong>de</strong> uma compo-36
nente científica respeitável; provavelmente não está muito preocupado emsaber exactamente qual, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que ela motive a a<strong>de</strong>são popular e que estejaassociada, <strong>de</strong> preferência, a alguns nomes famosos. É aqui que Margaret seenquadra.E a sua filha, por arrastamento, pensou cada um <strong>de</strong>les, sem o dizer.— Estou a ver.— Não te sentes tentada?Algures, a uma distância curta, ouvia-se o chiar <strong>de</strong> um cortador <strong>de</strong>relva. O jardineiro seria provavelmente Roger Armstrong, um matemáticocujos terrenos, do outro lado do relvado, eram cuidados com uma precisãomilimétrica, num contraste total com o <strong>de</strong> Peel. Trevor gostava <strong>de</strong> <strong>de</strong>ambularpor entre a vegetação e balançar-se em bicos <strong>de</strong> pés a espreitar paraos seus canteiros repleto <strong>de</strong> emaranhados <strong>de</strong> flores. Achava que um jardim<strong>de</strong>via ser um sítio para caminhar ou para se sentar a reflectir, um santuárioe não um local <strong>de</strong> trabalho. Nesse dia, como a testemunhar o seu ponto <strong>de</strong>vista, aquele local resplan<strong>de</strong>cia no meio do <strong>de</strong>salinho. As moitas <strong>de</strong> vergas<strong>de</strong>-ouroreflectiam a luz do sol e até o míldio nos ásteres tinha um brilhoesplendoroso. Graças à labuta <strong>de</strong> Roger Armstrong, o ar estava repleto doaroma luxuriante da relva no fim <strong>de</strong> estação.— De forma alguma — afirmou Alice, a sorrir. Era fácil dizê-lo, cominteira segurança.O pai ro<strong>de</strong>ou-a com o braço e apertou-a <strong>de</strong> encontro a si. No seu cheirohavia, como sempre, uma mistura a tabaco, a lã e a algo <strong>de</strong> si mesmo,perfeitamente limpo, mas também animal, como um cavalo ou um cão. Afilha roçou-lhe no ombro com uma das faces.— Estão está bem. Fico contente por te sentires assim tão realizada— comentou Trevor tranquilamente.Ao erguer a cabeça, Alice ouviu um suspiro seguido <strong>de</strong> um clique,como se o tempo tivesse parado pela segunda vez. Percorreu o caminhocom o olhar, até se fixar nas vergas-<strong>de</strong>-ouro, vendo-as como nunca as antesvira, marcadas por ondas <strong>de</strong> cor em vários cambiantes, enquanto escutava ozunido do cortador da relva numa série <strong>de</strong> notas vibrantes, que se espalhavamno ar como gotas <strong>de</strong> metal fundido.Era este o significado da felicida<strong>de</strong>? dizia para si. Apenas isto?O pensamento reflectia-se na sua cabeça como uma nota surda.Em seguida, o mundo voltou a lembrar-se do seu curso e seguiu emfrente. Tratava-se simplesmente <strong>de</strong> flores amarelas irregulares, nada maisque ervas daninhas em conjunto com o som do vizinho a trabalhar no seujardim, numa manhã <strong>de</strong> Verão cheia <strong>de</strong> sol.— E em relação à mãe? — perguntou Alice. — Vai conseguir fazê-la<strong>de</strong>scansar durante as férias?37
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— Oh, Deus — exclamou Becky, co
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chas acastanhadas eram as suas pró
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vazia - tudo o que não necessitava
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um milhão de centros nervosos.Porq
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dos CDs. Comeu muito pouco, mas est
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Heathrow a piscar à distância. Tr