plausível, como acontecia normalmente com as brigas típicas daquele lugar.De súbito, uma mesa ficou virada <strong>de</strong> pernas para o ar e um maço <strong>de</strong> cartasvoou para o chão. Dois homens praguejavam e lutavam um contra o outro,parecendo ursos enraivecidos. Um <strong>de</strong>les agarrou-se ao pescoço do outro eabanou-o, e o adversário dobrou o braço, para lhe respon<strong>de</strong>r com um golpedo punho no queixo. Ambos cambalearam, com os corpos engalfinhadosum no outro, e foram cair sobre outra mesa. Os copos caíram e partiram--se, salpicando o chão com marcas escuras das bebidas. Os outros clienteserguiam-se ou gritavam, enquanto a empregada se dirigia com ar cansadoem direcção do telefone, por <strong>de</strong>trás do balcão.Sem manifestar qualquer reacção no seu rosto, Rooker <strong>de</strong>sviou-se parao lado, evitando o conflito. Já tinha visto muitas lutas em bares; esta era monotonamenteigual às outras. Dirigiu-se à porta e embrenhou-se no meio daescuridão, sem olhar para trás. Concluiu que o melhor era ir para casa, semque pensasse nela, neste contexto, como a casa. Ficava a <strong>de</strong>z minutos <strong>de</strong> distânciadali, subindo <strong>de</strong> novo a encosta, mas no sentido contrário ao do novohotel. Caminhou sem pressas, com as mãos enfiadas nos bolsos do impermeável,sem se dar conta do frio ou da neve que voltara <strong>de</strong> novo a cair.A casa compunha-se <strong>de</strong> dois andares e tinha um aspecto mais antigoque as da vizinhança, com beirais salientes e um pequeno pórtico à frente.Nas poucas e preciosas semanas <strong>de</strong> Verão, iriam <strong>de</strong>spontar flores nos vasosfeitos com bidões <strong>de</strong> gasolina e pintados <strong>de</strong> azul, colocados <strong>de</strong> cada um doslados da porta, <strong>de</strong>baixo dos can<strong>de</strong>eiros <strong>de</strong> ferro forjado. Mas agora havia aliapenas camadas <strong>de</strong> neve, a escorrer entre os galhos nus, e beatas <strong>de</strong> cigarroamontoadas ao acaso. Marta não permitia oficialmente que se fumasse<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> casa.Rooker arrastou-se para o interior. No átrio encontrou um aroma acarne frita, um bengaleiro <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira e cerca <strong>de</strong> centena <strong>de</strong> quadros emoldurados.Marta adorava fazer bric-a-brac. No início, quando ela lhe alugarao quarto, ele tivera <strong>de</strong> batalhar para a obrigar a retirar meta<strong>de</strong> da tralha quelhe atravancava o espaço.Ao colocar o pé no primeiro <strong>de</strong>grau, Marta assomou a cabeça à portaque dava para os seus domínios, nas traseiras da casa.— Qué tal, Rook?Marta tinha uma gordura <strong>de</strong>scomunal, mas um rosto encantador, coma pele clara e suave, e uns olhos escuros e melancólicos. O marido <strong>de</strong>ixara-ae ela estava ansiosa por o substituir. Rooker saudou-a, sem suspen<strong>de</strong>r a suasubida das escadas.Tinha alugado meta<strong>de</strong> do piso superior da casa. As janelas davam parauma encosta rochosa e não havia ali muita luz, mas durante o tempo invernosonão havia muita luz em lado algum, pelo que isso pouco importava.10
Ele não sabia on<strong>de</strong> iria estar quando o Verão finalmente chegasse, mas erapouco provável que ainda se encontrasse ali.Pendurou o casaco e <strong>de</strong>sapertou as botas. Ao lado da pequena salamandra,havia um roupeiro, uma estante, uma mesa com duas ca<strong>de</strong>iras eum recanto recuado, com uma tina e uma cozinha rudimentar. Noutro recanto,estavam a cama e uma cómoda. A casa <strong>de</strong> banho ficava no exterior,e Rooker partilhava-a com o chefe <strong>de</strong> cozinha <strong>de</strong> um dos restaurantes paraturistas, que alugara a parte da frente do piso.— Serve perfeitamente — dissera a Marta, quando esta lhe tinha mostradoo quarto. E serviu, a partir do momento em que conseguiu que ela levassetodas as imagens religiosas, a par das toalhas <strong>de</strong> renda e das almofadas<strong>de</strong> lã que atulhavam o local. Não era esquisito com o lugar on<strong>de</strong> vivia, <strong>de</strong>s<strong>de</strong>que este não chamasse <strong>de</strong>masiado a sua atenção.Começou a preparar a sua refeição. Havia restos <strong>de</strong> um estufado <strong>de</strong>carne com feijão que Marta lhe impingira à força, pelo que colocou a panelasobre a placa eléctrica para a aquecer. Tinha pão, um pedaço <strong>de</strong> queijo <strong>de</strong>sabor forte e algumas salsichas fumadas. Quando acabava <strong>de</strong> colocar umprato na mesa, Rooker escutou o som pouco habitual da campainha da portada frente. Devia ser um amigo <strong>de</strong> Guillermo, o cozinheiro, pensou. Porvezes, até Guillermo dispunha <strong>de</strong> uma noite livre no seu trabalho. Ou talveza Marta tivesse arranjado um novo namorado.Da entrada, chegava-lhe o som <strong>de</strong> vozes, a <strong>de</strong> Marta e outra. A visitaera uma mulher.Marta subiu as escadas, quase sem fôlego, e bateu-lhe à porta.— Rook? Tem uma visita — anunciou ela.Este olhou para a sala à sua volta, procurando instintivamente algo quepu<strong>de</strong>sse revelar algo mais sobre si próprio. Mas o sítio estava praticamentevazio, sem contar com as roupas e alguns livros dispersos pelas prateleiras.— Rook? — insistia Marta. Através dos painéis <strong>de</strong>lgados da porta <strong>de</strong>ma<strong>de</strong>ira, conseguia distinguir-lhe a respiração arquejante. Da outra mulher,quem quer que ela fosse, não vinha qualquer som.Abriu a porta. O corpo <strong>de</strong> Marta quase bloqueava a entrada.— Entre, querida — convidou esta por cima do ombro, no seu sotaqueforte em inglês americano. A visita não seria, portanto, uma pessoa daregião.Ouviu então o som <strong>de</strong> uns passos leves e rápidos, a subir as escadas.Marta encolheu-se para um dos lados e ele viu que era Edith.— Edith? Santo Deus. O que fazes tu aqui?Edith trazia consigo o cheiro do frio. A neve espalhava-se pelos ombrose reluzia-lhe no cabelo. Inclinou a cabeça e arqueou as sobrancelhas.— Que espécie <strong>de</strong> recepção é essa?11
- Page 2: T í t u l o : Sol à Meia-NoiteA u
- Page 5 and 6: Capítulo UmO vento soprava da dire
- Page 7: ficar para o dia seguinte, o que eq
- Page 11 and 12: — Edith, não percebo porque est
- Page 13 and 14: alcance do outro. A seguir enfrento
- Page 15 and 16: para o mandar suturar. Chegou a ter
- Page 17 and 18: cópteros e das aeronaves a levanta
- Page 19 and 20: A blusa da rapariga ergueu-se um po
- Page 21 and 22: do com a sua experiência, a arte e
- Page 23 and 24: pequena mesa rústica, e ainda uma
- Page 25 and 26: Nessa manhã, Margaret respondia a
- Page 27 and 28: tiu que a filha a conduzisse suavem
- Page 29 and 30: são. — Tratava-se sempre da tele
- Page 31 and 32: disposição as infra-estruturas de
- Page 33 and 34: posta, nem teses sem provas. Gostav
- Page 35 and 36: nente científica respeitável; pro
- Page 37 and 38: tas, como um desafio de despedida.
- Page 39 and 40: — Sabes uma coisa, Al? Quando sor
- Page 41 and 42: Alice ficou completamente petrifica
- Page 43 and 44: Capítulo Quatro— A tua mãe não
- Page 45 and 46: puxava o fecho das calças. Depois,
- Page 47 and 48: conseguir descobrir a lógica que a
- Page 49 and 50: cer e começar a correr por todo o
- Page 51 and 52: nados numa sociedade em desintegra
- Page 53 and 54: de poder vir de avião para casa, a
- Page 55 and 56: soa estranha que escutasse o que se
- Page 57 and 58: De repente, viram uma enfermeira a
- Page 59 and 60:
dido coisa alguma. Tudo quanto fize
- Page 61 and 62:
Capítulo CincoCom a aproximação
- Page 63 and 64:
pela cabina de rádio-transmissão,
- Page 65 and 66:
pessoas. No quarto reservado ao alo
- Page 67 and 68:
O céu tinha escurecido, estando ag
- Page 69 and 70:
O céu carregara-se entretanto de n
- Page 71 and 72:
Parecia ter-se já estabelecido que
- Page 73 and 74:
Capítulo SeisAlice estava de pé,
- Page 75 and 76:
As paredes do átrio da Sullavanco
- Page 77 and 78:
Por detrás das janelas fumadas da
- Page 79 and 80:
sobre ela, como se isso lhe transmi
- Page 81 and 82:
a exploração e a descoberta cient
- Page 83 and 84:
— O que posso eu fazer? — pergu
- Page 85 and 86:
— Oh, Deus — exclamou Becky, co
- Page 87 and 88:
chas acastanhadas eram as suas pró
- Page 89 and 90:
vazia - tudo o que não necessitava
- Page 91 and 92:
um milhão de centros nervosos.Porq
- Page 93 and 94:
dos CDs. Comeu muito pouco, mas est
- Page 95 and 96:
Heathrow a piscar à distância. Tr