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palidez das faces, e a sombra transparente dos seus triguenhos cabelos banhavamlhe<br />
a fisionomia num doce eflúvio levedado de ouro.<br />
Quem o visse naquele instante, tomá-lo-ia por um prematuro asceta, cujo<br />
espírito apenas roçasse de leve pela terra, distraído e ligeiro repouso dos seus vôos<br />
místicos.<br />
No silêncio da alcova palpitava monotonamente o balbuciar das orações de<br />
Genoveva.<br />
De repente, Gabriel abriu a chorar numa explosão de soluços, e afastou-se<br />
para o jardim com o rosto escondido nas mãos.<br />
Quando Alfredo voltou com o médico, Jorge havia já morrido.<br />
E pouco depois o amante de Ambrosina vagava pelas ruas, sem consciência<br />
do tempo nem do lugar.<br />
Como todo aquele que sente uma decepção de amor, comprazia-se ele em<br />
deixar levar à toa, arrastado pelos seus próprios desgostos. Enquanto errava pelas<br />
ruas, lhe patinavam no espírito, com os chapins em brasa todas as saudosas<br />
recordações da sua extinta ventura.<br />
Duas horas. A noite enchia a natureza de mistérios. O arrabalde dormia;<br />
polícias dispersos cabeceavam encostados pelas esquinas ou ressonavam à soleira<br />
das portas fechadas. Por entre uma nuvem de pó, os varredores da rua<br />
desenhavam-se confusamente, como espectros; a noite envelhecia, e as primeiras<br />
névoas da madrugada iam galgando as serras, que cercam o Rio de Janeiro num<br />
círculo de granito. Uma mulher, vestida de branco e com os cabelos soltos,<br />
passeava de um para o outro lado da calçada.<br />
Gabriel reparou que havia entrado na cidade.<br />
CAPÍTULO XXXII<br />
VISITA DE ZANGÃO<br />
Ambrosina e Laura, chegadas à Bahia, hospedaram-se no hotel Figueiredo.<br />
Daí colheram informações sobre a cidade e seus costumes, e logo depois se<br />
achavam instaladas na Barra em uma casinha alugada com os móveis.<br />
Levaram uma vida especial as duas belas fugitivas, à qual os sobressaltos e<br />
as apreensões emprestavam um capitoso encanto de aventura romanesca.<br />
Inteiramente desconhecidas, concentravam só em si toda a atividade dos seus<br />
instintos e toda a mórbida curiosidade dos seus sentidos. Laura deixava-se dominar<br />
em absoluto pela companheira, não tinha vontade própria, nunca fazia uma objeção<br />
aos reclamos de Ambrosina, que em compensação não desdenhava meios de<br />
proporcionar à amiga tudo que lhe pudesse trazer alegria, propondo-lhe<br />
divertimentos na cidade, excursões ao campo, e oferecendo-lhe jóias, modas e<br />
dinheiro.<br />
Laura, porém, começava a enfraquecer. O seu lindo corpo delgado, e<br />
outrora tão roliço, principiava a denunciar sinistros ângulos. A pele ia se tornando<br />
mais transparente, descorada e seca, os lábios menos vermelhos, as mãos úmidas.<br />
De toda ela se desprendia um ar melancólico de sofrimento e resignação, tinha<br />
agora o andar vagaroso e os movimentos demorados. Ficava horas perdidas a olhar<br />
abstratamente para o espaço, boca ansiosa, respiração convulsa, braços<br />
esquecidos.<br />
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