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Gaspar foi noutro tempo muito meu amigo, dava-me bons conselhos, ralhava-me às<br />
vezes...<br />
E Ambrosina fazia-se muito amiga, muito camarada de Gaspar.<br />
— Não sei como este ingrato se lembrou de vir cá!...<br />
— É que lhe tenho de falar... em particular...<br />
E como ela fizesse um movimento malicioso:<br />
— Descanse, estou velho, não farei ciúmes a ninguém...<br />
— Por mim, não os importunarei, declarou o Coelho Rocha, levantando-se<br />
com seus bigodões. Esperam-me para jantar.<br />
— Eu também vou, disse o Lopes Filho, imitando-o. E foram beijar a mão da<br />
Ambrosina.<br />
— Visto isso... acrescentou o Reguinho, depois de chupar os dentes.<br />
— Mas eu, nesse caso, vim incomodá-los... Minha visita é rápida... observou<br />
o médico.<br />
Seguiram-se grandes protestos de cortesia. Houve risos, apertos de mão,<br />
oferecimentos de casa, e afinal os três deixaram o campo livre.<br />
— Venha para cá, doutor. Ficamos aqui mais à vontade, disse Ambrosina,<br />
passando o braço na cintura de Gaspar e conduzindo-o para um gabinete reservado.<br />
Agora, bem! Podemos livremente conversar.<br />
E fechou a porta.<br />
O Médico Misterioso não tinha ainda voltado a si do pasmo, que lhe causava<br />
tão inesperado acolhimento por parte de Ambrosina. Ele, que se lembrava ainda<br />
muito bem das suas últimas cenas com ela, pensou encontrá-la pouco disposta a<br />
atendê-lo, e eis que a caprichosa rapariga lhe dispensava agora todas aquelas<br />
amabilidades e se mostrava como nunca atenciosa.<br />
— Ainda está muito zangado comigo?... perguntou ela, assim que os dois se<br />
viram a sós no gabinete.<br />
— De forma alguma! respondeu Gaspar, e confesso que não contava ser tão<br />
bem recebido.<br />
— O passado, passado! Não pensemos mais em tal. Além disso, naquela<br />
época, o senhor tinha toda a razão; eu é que era uma estonteada.<br />
— Valha-nos isso! Estimo encontrá-la em tão boa disposição. Sabe? espero<br />
sair daqui devendo-lhe um grande obséquio...<br />
— A mim?... Qual é?...<br />
— Vai saber...<br />
E o médico tirou da algibeira a carta, que tão engenhosamente havia<br />
substituído pela outra que rompera.<br />
— Eu surpreendi esta carta sua, dirigida a meu enteado, guardei-a, e depois<br />
a li, com o consentimento do dono...<br />
— Ah! E ele?...<br />
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