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A Condessa Vésper - Unama

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www.nead.unama.br<br />

inteira! Quanto invejo os que partem deste mundo, sem deixar atrás de si um só eco<br />

de rugir de ódio ou de gargalhar de escárnio!<br />

E voltando para Gabriel, disse-lhe numa agonia crescente:<br />

— Vai! Foge de mim. Evita-me! És moço; vai gozar em paz, vai viver! Casate,<br />

constitui família, faze-te amado por uma mulher digna de ti! Meus carinhos te<br />

secam o sangue, meus beijos te umedecem a inteligência! Foge-me, querido! Amote<br />

muito, para consentir que te associes à minha estrela!<br />

— Onde diabo queres tu chegar com tudo isso. Não te compreendo!<br />

— Quero arrancar-te deste degredo!<br />

— Mas, filha, não foste tu própria quem escolheu isto aqui para morarmos?...<br />

— Sim, porque não previa as conseqüências; agora porém, receio perderte...<br />

Esta solidão está a matar-te lentamente, eu sofro por te ver nesse estado... Não!<br />

não ! É preciso salvar-te!<br />

— Qual! por mim, não! por mim não te incomodes. Em toda a parte me<br />

aborreço do mesmo modo... O mal vem de mim e não do lugar em que me acho...<br />

Se é só por isso, põe o coração à larga, e não te preocupes com os enfados de uma<br />

mudança.<br />

— Mas é que eu própria começo a sucumbir de tédio!<br />

— Ah! isso agora é outra cousa. Compreendo! Sentes falta do ruído da<br />

cidade. O corpo pede-te pândega. Já me tardava, confesso-te!<br />

— E é exato. Esta existência calma, entre cascatas e mangueiras, em vez<br />

de acalmar-me os nervos, tem a propriedade de irritá-los... Não nasci para isto! No<br />

fim de contas, o mais digno e honesto é submeter-se cada qual ao seu<br />

temperamento e deixar-se de hipocrisias; mais vale a franca jovialidade do que uma<br />

austeridade fingida e falsa. Sinto-me bem disposta como nunca; amo e sou amada<br />

— quero viver! quero gozar, em plena expansão de alegria o resto de minha<br />

mocidade ao lado do meu amante. Venham de novo as ceias, os vinhos, os delírios<br />

do jogo e das madrugadas de prazer! Sou de novo a <strong>Condessa</strong> <strong>Vésper</strong>!<br />

Gabriel sacudiu os ombros, enjoado.<br />

— Faze o que entenderes, disse ele; mas talvez te arrependas...<br />

— É difícil... Pois se isto já é um arrependimento de arrependimento!... Não!<br />

Não! Preciso sair daqui. Vou fatalmente! Se me não acompanhares, irei só.<br />

Daí a dias, mudavam-se para a cidade, tomando na Praia da Lapa, em<br />

frente ao mar, um sobradinho de três janelas, que era um brinco. E a <strong>Condessa</strong><br />

<strong>Vésper</strong> começou a reaparecer nos teatros e nas corridas, ao lado do seu taciturno<br />

amante.<br />

Apesar de já inteiramente fora do calendário das mulheres de alto bordo,<br />

fizeram-se logo comentários de todo o gênero a seu respeito. Uns, naturalmente por<br />

espírito de contradição, achavam que ela agora estava ainda mais bela; outros,<br />

sistematicamente pessimistas, pretendiam que a sazonada ex-estrela do Alcazar, já<br />

não valia dois caracóis. E atribuíam-lhe uma grande regeneração por amor, falavase,<br />

por aqui e por ali, ora de uma formidável paixão, que esteve a dar com ela num<br />

convento de freiras, ora de uma moléstia, não menos terrível, que por pouco não lhe<br />

deixara os ossos a descoberto. E citavam com pasmo as toilettes sérias de<br />

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