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CAPÍTULO XIV<br />
DESCOBRE-SE O AUTOR DAS MOFINAS<br />
www.nead.unama.br<br />
As mofinas desde que se converteram para Melo Rosa em fonte de receita,<br />
tornaram-se muito mais desabridas e aleivosas. Melo excedia à expectativa do<br />
comendador Moscoso.<br />
O coronel, coitado! já não as lia, porque nesses últimos três anos quase não<br />
se levantava da cama. "Esperando pelo desfecho. .." dizia ele com indiferença.<br />
Gaspar, a partir de então, não lhe abandonava mais a cabeceira e lhe<br />
prestava desveladamente o duplo serviço de médico e de enfermeiro. Mas o pobre<br />
velho sacudia os ombros, e pedia-lhe que saísse do caminho e não estivesse a<br />
contrariar a morte!<br />
— É melhor deixar que isto acabe por uma vez! disse-lhe ele certa manhã,<br />
durante a qual Gaspar lhe pareceu mais sucumbido e triste. Tu, que és moço e<br />
devias ter esperanças tu, meu filho, atravessas a existência como um espectro!<br />
Como consentiste que a mulher, a quem dedicaste todo o teu amor e a melhor parte<br />
do teu coração, levasse consigo para sempre a alegria e os sorrisos da tua<br />
mocidade?... E queres exigir deste pobre velho a coragem que te falta! Não!<br />
renuncia a tal intento e reage contra a tua tristeza, procura viver, para que ao menos<br />
possa eu fechar os olhos, na doce ilusão de que o perseguidor de teu pai há de ser<br />
um dia punido por tuas mãos!<br />
— Juro-lhe, meu pai! juro-lhe, por minha honra, que o senhor, ou a sua<br />
memória, serão vingados!<br />
— Assim! fala-me deste modo, meu Gaspar! dá a este coração amargurado<br />
uma idéia consoladora! Ah! sabes perfeitamente que nunca fui rancoroso e jamais<br />
me compraza com o sofrimento alheio; mas tanto e tanto fel me verteram cá dentro,<br />
tanta e tanta lama me atiraram, que afinal todo eu me converti em lama e fel! Sintome<br />
mau! Eu, que fazia dantes consistir a minha felicidade no comprimento do dever<br />
e toda a minha aspiração em ser bom e leal, eu sou hoje cruel e vingativo! Sim!<br />
Preciso saber desde já que serás inexorável na vingança! Que calcarás debaixo dos<br />
pés o meu verdugo! Prometes, não é verdade, meu filho? Não é verdade, que serás<br />
ainda mais cruel do que eu? Fala!<br />
— Sim! sim! meu pai! Juro-lhe por minha honra!<br />
E os dois abraçaram-se comovidos.<br />
No resto da sala corria um silêncio que já era de morte.<br />
De repente, porém, ouviu-se uma voz, fresca sonora, gritar da porta:<br />
— Gaspar! Ó Gaspar! onde diabo estás tu?!<br />
Aquela voz alegre despedaçou escandalosamente o silêncio compacto da<br />
sala. Gaspar levantou-se de um silêncio e precipitou-se nos braços de Gabriel, que<br />
voltava dos seus estudos acadêmicos.<br />
— Meu filho! dizia ele chorando e rindo; minha vida!<br />
E beijava-o na testa e nas faces.<br />
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