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Guia Politicamente Incorreto Da - Leandro Narloch

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Unidos. E, sim, sabia que desencadearia uma reação americana (maior potência nuclear<br />

do mundo) no mesmo nível sobre as cidades cubanas.<br />

Essa postura ficou bem clara logo após a Crise dos Mísseis, em 1962, um dos<br />

momentos em que o mundo mais esteve perto de uma Terceira Guerra Mundial. Em<br />

outubro daquele ano, aviões de espionagem americanos fotografaram instalações<br />

militares de Cuba. Mostraram que mísseis nucleares de médio alcance (apontados para<br />

os Estados Unidos) estavam sendo instalados no oeste da ilha. Tratava-se de 42 mísseis<br />

soviéticos – 20 deles com ogivas nucleares – e mais meia dúzia de lança-mísseis também<br />

armados com ogivas. O presidente dos Estados Unidos, John Kennedy, criou um bloqueio<br />

marítimo à ilha e exigiu a retirada imediata dos armamentos. Graças à diplomacia entre<br />

as duas superpotências, os soviéticos acabaram cedendo – nem Moscou, nem Washington<br />

achavam uma boa ideia começar uma guerra de armas atômicas. Mas o governo de<br />

Havana, sim. A retirada dos mísseis foi uma decisão dos soviéticos que deixou os líderes<br />

cubanos revoltados e irritados. Fidel Castro chamou o russo Nikita Kruschev de “filho da<br />

puta, cagão e bunda-mole”. 42 “Fidel ficou puto da vida, e eu também”, disse Che ao seu<br />

amigo Ricardo Rojo. “Para descarregar a tensão que havia se acumulado, Fidel deu uma<br />

volta de 180 graus e soltou um pontapé na parede.” 43<br />

Che não conseguiu esconder sua decepção com a moderação e a prudência dos russos.<br />

Sonhava com uma guerra nuclear e disse isso em voz alta durante entrevistas que se<br />

seguiram à crise. “Se os mísseis tivessem ficado em Cuba, usaríamos todos, apontandoos<br />

para o coração dos Estados Unidos, inclusive Nova York, para nos defendermos da<br />

agressão”, disse ao London <strong>Da</strong>ily Worker, o jornal do Partido Comunista da Inglaterra.<br />

Ele sabia que os americanos revidariam o ataque, provocando um massacre nuclear em<br />

Cuba e o sacrifício de centenas de milhares de cubanos. Mas era isso mesmo que<br />

desejava, conforme escreveu meses depois:<br />

[Cuba] é o exemplo tremendo de um povo disposto ao autossacrifício nuclear, para que suas cinzas sirvam de alicerce<br />

para uma nova sociedade. 44<br />

Para quem considerava o homem não um fim em si mesmo, mas um meio para a revolução, matar ou sacrificar<br />

pessoas era perfeitamente racional e correto. Rebeldes como Che acreditavam que revoluções anteriores tinham<br />

fracassado porque seus líderes hesitaram em agir em nome de um ideal. Como em tantos casos do século 20, foi o<br />

desejo radical de mudar o mundo que nutriu a barbárie.<br />

Se um sujeito quer dedicar a vida ao autossacrifício em nome de um ideal, é seu<br />

direito. Deve ter a liberdade de fazer o que bem desejar com a própria vida. Mas não<br />

pode, por mais fotogênico que seja e por mais belo que considere seu ideal, obrigar<br />

milhões de outros indivíduos a tomar o mesmo caminho. A instalação de mísseis em<br />

Cuba havia sido decidida em sigilo por Fidel e Raúl Castro, Che e outros três líderes<br />

cubanos. Apenas seis pessoas. 45 Os milhões de cidadãos cubanos não sabiam, mas seu<br />

admirado líder Che Guevara tinha decidido levá-los a um holocausto nuclear.<br />

Prevendo ataques americanos, os líderes da revolução logo se preocuparam em<br />

perguntar ao embaixador soviético, Alexander Alexeyev, se havia espaço no abrigo<br />

antiaéreo da embaixada soviética em Cuba. 46 Não tiveram a mesma preocupação com o<br />

resto dos cubanos.

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