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Guia Politicamente Incorreto Da - Leandro Narloch

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hispano-americana: planejada, coordenada, guiada e guerreada por milhares de índios<br />

nahuas, zapotecas e mixtecas, e algumas centenas de espanhóis, em nome de suas cidades,<br />

dos deuses mesoamericanos, de Cristo e da Coroa espanhola”, afirma a historiadora<br />

Laura Matthew. 123 Diante desse protagonismo indígena ao exterminar seus conterrâneos, é<br />

fácil entender o que quis dizer o conquistador espanhol Francisco de Bracamonte, em<br />

1576, quando escreveu a seguinte frase:<br />

Posso dizer com toda a honestidade que sem os índios nós nunca teríamos conquistado esta terra. 124<br />

Os índios não foram excluídos das decisões políticas<br />

Não é correto, é claro, cometer o equívoco oposto e acreditar que os espanhóis não<br />

protagonizaram ação alguma, só acompanharam os índios em seus conflitos internos. Ou<br />

que não provocaram uma tremenda reorganização da vida dos índios. Mas a ideia do<br />

índio conquistador mostra como é exagerado e simplista dizer que os povos locais da<br />

América Latina foram marginalizados e excluídos de suas decisões políticas. Líderes e<br />

guerreiros locais não só estabeleceram alianças estratégicas para impor sua vontade<br />

como, muito depois de a conquista espanhola se estabelecer, continuaram participando da<br />

elite política.<br />

No dia a dia colonial, as famílias de nobres indígenas se adaptaram às novas<br />

instituições criadas pelos espanhóis. Chefes de clãs e das cidades indígenas se tornaram<br />

governadores, chefes dos cabildos (os conselhos municipais) e caciques, ao mesmo<br />

tempo senhores dos índios locais e donos de terras. Bem ao costume pré-hispânico, o<br />

cacique cedia terra aos índios em troca de impostos em mercadorias. Além dos cargos de<br />

representação política, os índios fizeram parte da administração burocrática da colônia<br />

como juízes, fiscais ou tesoureiros. “Desde o século 16 se generalizou a prática de<br />

utilizar índios nobres como comissários, representantes do governo para resolver<br />

diferenças, levar a cabo auditorias e às vezes exercer a máxima autoridade em povos<br />

distantes de sua residência”, conta o historiador mexicano Tomás Jalpa Flores. 125 É<br />

verdade que, durante a conquista, houve uma diminuição do número de famílias indígenas<br />

nobres e que a influência delas mudava de acordo com as ordens reais e a relação de<br />

cada região com o reino. No entanto, como afirma Flores sobre as famílias da região de<br />

Chalco:<br />

É preciso reconhecer que, na prática, durante os séculos 16 e 17, as linhagens indígenas seguiram participando da vida<br />

política da província; ocuparam os principais postos e, como consequência, administraram, como parte dos cacicados, as<br />

terras das comunidades e o seu patrimônio particular. Sua posição na sociedade permitiu a eles explorar a força do<br />

trabalho e continuar se beneficiando dos tributos e outros serviços que exigiam dos povoados. 126<br />

Esses índios logo deixaram os seus costumes de lado para entrar na sociedade<br />

espanhola. Não demoraram a adotar nomes europeus, vestirem-se como aristocratas<br />

espanhóis, criar rebanhos de ovelhas, morar em casas coloniais com camas, colchões,<br />

mesas e cadeiras, ter cavalos, espadas e armas de fogo. Alguns viraram até mesmo<br />

senhores escravistas. “Os testamentos e inventários de suas posses mostram uma adoção

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