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Guia Politicamente Incorreto Da - Leandro Narloch

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crueldade máxima na América. Francisco Pizarro, semanas antes de encontrar o inca<br />

Atahualpa, queimou vivos índios que haviam atacado seus homens; decapitações<br />

aconteceram com frequência; no México, o conquistador Nuño de Gusmán era famoso<br />

por torturar caciques e atirá-los a cães. Esses atos, no entanto, não eram em geral<br />

considerados corretos: a morte dos índios e a degradação das comunidades locais<br />

provocaram denúncias indignadas de padres e conquistadores, além de uma intensa<br />

discussão ética entre os espanhóis. A ponto de o imperador Carlos V, em 1550,<br />

interromper as ações de colonização para debater a moralidade da conquista espanhola.<br />

O debate de Valladolid, travado entre os frades Bartolomé de las Casas e Juan<br />

Sepúlveda naquele ano, marca um dos primeiros momentos da história em que um povo<br />

levantou questões humanitárias e se preocupou com o outro. Também pela primeira vez<br />

na história um império parou para refletir sobre as consequências éticas de seus atos. O<br />

debate de Valladolid ratificou as “novas leis” que tinham proibido, oito anos antes, a<br />

exploração do trabalho dos índios pelo sistema de encomienda. As leis provocaram<br />

revoltas entre os conquistadores – basta lembrar que um dos irmãos de Pizarro, Gonzalo,<br />

foi executado pelo reino espanhol depois de ameaçar proclamar-se rei do Peru em<br />

protesto à proibição de explorar o trabalho dos índios por meio do sistema de<br />

encomiendas. Como sua morte atesta, o valor da vida humana, noção que tantos ativistas<br />

usam para tentar corrigir injustiças históricas, não chegaria à América não fosse a bordo<br />

das caravelas.<br />

Quando Hernán Cortés e seus aliados conquistaram Tenochtitlán, uma de suas<br />

primeiras ações foi mandar lavar as escadarias astecas para retirar as manchas de sangue<br />

seco e envelhecido que vertia dos corpos atirados por ali. Hoje, cinco séculos depois,<br />

ainda há crianças nas escadarias das pirâmides indígenas. Elas brincam, correm e contam<br />

alegremente quantos degraus cada monumento possui.<br />

A descoberta do índio conquistador<br />

Um antigo costume dos índios nahuas era o de registrar a história em grandes pinturas<br />

em tecido, como os astecas e seus vizinhos. Os lienzos, como os espanhóis chamaram<br />

essas peças, retratam os feitos dos soberanos, as conquistas militares e as migrações que<br />

os povos empreenderam. Como peças de comunicação interna, eram expostos em muros<br />

durante cerimônias das grandes cidades do México pré-colombiano, para que os<br />

moradores se lembrassem da história de seu povo e da importância de seus líderes. Essa<br />

tradição avançou pelo século 16: para deleite dos pesquisadores, há telas com registros<br />

preciosos de episódios da conquista espanhola da América. Algumas dessas raridades<br />

foram decifradas recentemente por historiadores, que ficaram estupefatos com o que<br />

descobriram ali.<br />

A história que aqueles pictogramas contavam não parecia em nada com os relatos<br />

tradicionais da Conquista Espanhola propagados hoje em dia nas escolas, nos palanques<br />

de campanha eleitoral ou nos manifestos de ativistas. Não havia destaque aos episódios<br />

de violência praticada pelos europeus ou para a resistência indígena. Na verdade, as<br />

imagens tinham pouca diferença daquelas criadas antes da chegada das caravelas. Os

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