40 Anos de Acrobacia no Ar - Aeroclube de Bebedouro
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COMEÇO A VOAR<br />
Meu or<strong>de</strong>nado era 750.000 (setecentos e cincoenta mil réis) por mês, or<strong>de</strong>nado este fabuloso, na<br />
época, correspon<strong>de</strong>nte mais ou me<strong>no</strong>s hoje a 10 salários mínimos, mas não ia dar com três horas <strong>de</strong> vôo,<br />
lá se ia meu or<strong>de</strong>nado, pois já era casado, <strong>de</strong>sculpem-me, mas eu não gosto <strong>de</strong> coisas sinistras, por isso<br />
não me referi antes, <strong>no</strong> dia seguinte <strong>de</strong> <strong>no</strong>vo <strong>no</strong> hangar, <strong>de</strong> bicicleta, <strong>de</strong>sta vez com manchão <strong>no</strong>s dois<br />
pneus, entrei em conversa com este fabuloso Anísio, dinheiro <strong>no</strong> bolso, para uma hora <strong>de</strong> vôo, e <strong>de</strong>pois<br />
um breve bate papo com o mesmo, a rolagem; era época <strong>de</strong> enchente <strong>no</strong> Rio Tietê , o campo estava todo<br />
alagado, Anísio foi taxiando contornando as lagoas até a cabeceira da pista do campinho, não houve<br />
cheque, naquele tempo não se usava essas coisinhas, o motor roncou forte e saímos espirrando água por<br />
todos os lados, a primeira coisa que me assustou, foi ver as rodas girando fora do chão; eu tive a<br />
impressão <strong>de</strong> um automóvel capotado, em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> que eu já tinha capotado várias vezes com carro, e<br />
sempre vi roídas girando fora do chão. Passado esse momento o avião já tinha ganho altura, eu comecei a<br />
pensar porque tinha parado <strong>de</strong> correr, não tinha a me<strong>no</strong>r idéia <strong>de</strong> velocida<strong>de</strong>, mas tudo embaixo era tão<br />
lindo, uma coisa que não conseguia saber aon<strong>de</strong> estava, e como falei antes, era época <strong>de</strong> enchente e lá<br />
embaixo era água para todos os lados, eu tive a impressão que a enchente tinha subido muito, <strong>de</strong>pois da<br />
<strong>de</strong>colagem e não tinha lugar para <strong>de</strong>scer, tudo era água, <strong>de</strong>pois daquelas explicações pa<strong>no</strong>râmicas diz,<br />
Anísio, vamos <strong>de</strong>scer, pensei eu <strong>de</strong>scer aon<strong>de</strong> se tudo é água esse troço não tem barco embaixo, aí Anísio,<br />
mostrou-me 0o campo, pensei comigo, o avião não cabe naquele lugar <strong>de</strong> terra que sobrava fora da água,<br />
aterramos gostei da coisa.<br />
Passaram-se alguns dias sem eu po<strong>de</strong>r voltar ao campo. Nesses dias em que fiquei fora do campo,<br />
contei a alguns amigos o que eu estava fazendo, foi reprovado por todos inclusive por meus chefes e<br />
patrões, minha família não podia saber.<br />
Retornei a voar com Anísio, posteriormente, <strong>de</strong> 10 a 15 minutos por dia, a enchente tinha acabado e<br />
o campo tinha ficado muito maior mesmo, sendo peque<strong>no</strong> como ele era.<br />
Depois <strong>de</strong> 3 horas <strong>de</strong> vôo, Anísio pediu ao Camargo que voasse comigo, eu não morei na jogada,<br />
mas fui com o Sr. Camargo, <strong>de</strong>pois <strong>no</strong> mesmo dia voltei a voar com Anísio após mais uma aterrisagem,<br />
Anísio <strong>de</strong>sceu do Teco-Teco <strong>no</strong> fim do campo perto da lagoa que existia na cabeceira da pista, e disse, vai<br />
sozinho (lache, na época), a minha cabeça começou a trabalhar <strong>de</strong>pressa, fazia nada mais <strong>de</strong> um mês que<br />
eu estava naquela, não entendia nada, não tinha tido nem uma aula <strong>de</strong> teoria, não sabia para que serviam<br />
aqueles reloginhos todos que estavam <strong>no</strong> painel, pois até então eu só tinha lidado com o manche e a<br />
manete.<br />
Eu nunca relutei com máquina, se ele mandou, ele sabe o que faz, pensei eu, alinhei o bicho na pista<br />
e soltei os cavalinhos, em poucos segundos estava <strong>no</strong> ar sozinho, o manche da frente mexia sozinho, isso<br />
me apavorou um pouco. Era um sonho aquilo que eu tinha visto em 1920, estava sob meu domínio aquilo<br />
tudo, estava acontecendo a me<strong>no</strong>s <strong>de</strong> um mês, fiz o tráfego como tinha <strong>de</strong>terminando Anísio, a lagoa na<br />
cabeceira da pista era a referência, encostado a lagoa estava ele, eu olhei mais para ele do que para o<br />
campo e <strong>de</strong>veria estar com o avião muito mole, porque Anísio gritou, dá motor, e eu <strong>de</strong>i, as rodas tocaram<br />
o chão a três metros além da lagoa, foi uma aterragem curtíssima, mas nada <strong>de</strong> a<strong>no</strong>rmal.<br />
Depois <strong>de</strong>sta aterragem, passei vários dias sem voar por causa do mau tempo, mas também por<br />
causa da verba que estava estourada. Nos dias <strong>de</strong> mau tempo, os cobras não apareciam <strong>no</strong> campo, dias<br />
côo esses, as vezes eu ficava conversando com Anísio, ele muito mo<strong>de</strong>sto, voava muito bem, entendia da<br />
teoria daquele tempo. Eu me enquadrava com Anísio, muito bem <strong>no</strong>sso nível social e econômico era<br />
mais ou me<strong>no</strong>s igual, nessas conversas, mais <strong>de</strong> amigo do que <strong>de</strong> instrutor, Anísio disse uma vez, você vai<br />
ser piloto, mas, um dia você vai se arrepen<strong>de</strong>r, e vai continuar voando um dia você vai ser envolvido por<br />
mau tempo, quando não tem mais esperança <strong>de</strong> sair daquele enrosco em que você não vê mais nada, aí<br />
você vai pensar o mundo é tão gran<strong>de</strong>, cabe tanta gente lá na terra e eu enfiado nesta gaiola sem saber o<br />
que vai acontecer.<br />
O Campinho como era chamado, todo mundo era amigo, mas ninguém sedava com ninguém, era um<br />
verda<strong>de</strong>iro curtiço <strong>de</strong> lava<strong>de</strong>iras, se acontecesse algum <strong>de</strong>sastre, o pessoal todo era solidário, mas se o<br />
<strong>de</strong>sastre fosse só material era motivo <strong>de</strong> festa, <strong>no</strong>s outros hangares <strong>no</strong> campinho todos eram do<strong>no</strong>s, mas<br />
ninguém era do<strong>no</strong> <strong>de</strong> nada, a pauleira maior era contra o A.C.S.P..