Indeterminação e Improvisação na Música Brasileira ... - CCRMA
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codificação escrita, processo que atinge seu ápice no século XX, não é capaz de evitar a<br />
presença de elementos casuais e indetermi<strong>na</strong>dos <strong>na</strong> interpretação instrumental. Levando tal<br />
raciocínio mais longe, nem mesmo a música eletroacústica escapa a esse nível de<br />
indetermi<strong>na</strong>ção: embora prescinda do intérprete no sentido tradicio<strong>na</strong>l, por ser uma música<br />
gravada diretamente sobre suporte tecnológico (portanto, virtualmente sempre “idêntica” em<br />
todas as execuções), a apresentação fi<strong>na</strong>l desse tipo de criação composicio<strong>na</strong>l não está isenta<br />
de sofrer variações significativas em situação de concerto, podendo variar de acordo com a<br />
acústica da sala, com a quantidade e a qualidade das caixas de som, e mesmo com a atuação<br />
do intérprete das músicas eletroacústicas, isto é, o responsável por difundir os sons no espaço<br />
da sala de concerto, através de manipulação dos controles da mesa de som.<br />
Por outro lado, qualquer processo de composição também está permeado de elementos<br />
casuais e subjetivos; nenhum compositor pode escapar disso. Mesmo para um compositor<br />
serial que buscasse conscientemente controlar todo o processo composicio<strong>na</strong>l segundo<br />
esquemas formais abstratos e precisos, o percurso da criação ofereceria inúmeros problemas,<br />
opções e caminhos sinuosos, e o compositor teria sempre que tomar decisões. Tais decisões<br />
nunca deixarão de ter, ao menos em parte, impulsos pessoais subjetivos e casuais.<br />
Em resumo, queremos dizer que, desde o processo de elaboração composicio<strong>na</strong>l até a<br />
realização fi<strong>na</strong>l de uma música, existe a interferência de elementos indetermi<strong>na</strong>dos (ou<br />
indetermináveis) e casuais. Uma importante questão está, portanto, no grau de consciência e<br />
aceitação dessa indetermi<strong>na</strong>ção por parte do compositor. Na música ocidental, é fácil perceber<br />
que essa problemática já se colocava de diferentes formas em cada época histórica, conforme<br />
poderemos constatar mais adiante em seção dedicada à história da improvisação. Desde as<br />
improvisações vocais medievais, passando pelo baixo contínuo barroco até as cadências<br />
clássicas e românticas, sempre houve o lado da prática musical que dava vazão à capacidade<br />
criativa dos músicos <strong>na</strong> forma da criação no ato da execução. Tais manifestações musicais<br />
instantâneas vinham sempre integradas dentro de um universo estilístico e de um conjunto de<br />
regras em constante confronto e diálogo com a liberdade e a inventividade dos músicos-<br />
improvisadores. Com a progressiva sedimentação de processos de escritura e de formas<br />
musicais, e também com o fortalecimento da tríade compositor-obra-intérprete, a<br />
improvisação foi se tor<strong>na</strong>ndo uma atividade cada vez mais margi<strong>na</strong>l e periférica.