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<strong>Anais</strong> do <strong>VII</strong> <strong>SIC</strong> 1174<br />
Sendo O Chamado de Cthulhu uma produção em preto e branco, o diretor utilizou-se de<br />
lâmpadas específicas (ou em alguns pontos a ausência delas), aliadas à maquiagem pálida, para criar<br />
propositalmente o sentimento de horror extremo e sugerir um descontrole emocional sofrido pelos<br />
personagens que caracteriza o gênero gótico.<br />
No que diz respeito ao conto, uma unidade de horror foi então desenvolvida na obra<br />
Lovecraftiana através da soma de vários traços/características fundamentais à criação, dentre estes<br />
pontos que alicerçam a obra está a atmosfera e sua indispensável singularidade. Já afirmou o<br />
próprio Lovecraft que a “atmosfera é o grande desideratum da ficção fantástica” (LOVECRAFT,<br />
2009, p. 155). Assim, há uma ênfase considerável na ambientação e nos efeitos que ela proporciona,<br />
e estes devem ser maiores ao ponto de tornarem-se elementos centrais da história.<br />
Em determinado momento da obra, percebe-se o uso da ambientação propensa a<br />
“enfatizar os pontos críticos da história” (LOVECRAFT, 2009, p. 154), quando o escultor Wilcox<br />
relata mais uma vez sobre os seus pavorosos sonhos:<br />
[...] o escultor teve um sonho sem precedentes de enormes cidades ciclópicas erguidas com<br />
blocos titânicos e monólitos altaneiros, tudo vertendo uma gosma verde e sinistra co o<br />
horror latente. Hieróglifos cobriam os muros e pilastras, e de algum lugar lá embaixo vinha<br />
uma voz que não era uma voz; (p. 105) ²<br />
O cenário, segundo Martin (2007, p.62), tem mais importância no cinema do que no<br />
teatro. Ele diz respeito desde as paisagens naturais englobando até as construções humanas. A<br />
utilização do cenário em estúdios ocorre na tentativa de se buscar uma maior verossimilhança, ou<br />
economia, todavia, alguns também são construídos em função do simbolismo, significação.<br />
No filme O Chamado de Cthulhu o “cenário ciclópico”, isto é, de grande porte, se<br />
enquadra no cenário expressionista arquitetural que é caracterizado por cenários grandiosos. Na<br />
cena em que se depara com o cenário arquitetural de seus sonhos, o horror transparece e Wilcox, é<br />
apoderado pelo medo.<br />
Utiliza-se nessa sequência do filme o plano aproximado para focalizar a expressão de<br />
medo da personagem e, dando continuidade, um plano geral para engrandecer o majestoso cenário.<br />
A utilização do plano geral exprimirá “a impotência às voltas com a fatalidade” assim como “a<br />
inscrição dos protagonistas em um cenário infinito e voluptuoso”, entre outros (MARTIN, 2007, p.<br />
38). Essa representação da atmosfera Lovecraftiana, fruto dos pesadelos do jovem escultor Wilcox,<br />
sugere simbolicamente uma superioridade do cenário e da Coisa, algo maior que a própria<br />
existência humana.<br />
O cenário de proporções imensas contribui para a imagem do personagem enquanto ser<br />
inferior, ou como se o cenário fosse engolir a personagem quase que insignificante diante de<br />
enormes monolitos. Segundo Martin (2007, p.64), esse cenário é, na maior parte das vezes, criado<br />
artificialmente para ser análogo à dominante psicológica da ação. O autor ainda acrescenta dizendo<br />
que:<br />
[...] caracteriza-se por cenários grandes e majestosos, destinados a engrandecer a ação épica<br />
que ali se passa, ou por um extraordinário delírio inventivo [...] ou ainda pela utilização de<br />
cenários sinistros, onde o horror e o assombro transparecem com toda naturalidade.<br />
(MARTIN, 2007, p.65)<br />
O narrador do conto também conta o relato de alguns policiais que foram checar<br />
reclamações de um possível ritual de vudu em uma região pantanosa do Sul. Neste local mais uma<br />
vez a ambientação é explorada:<br />
__________________<br />
² LOVECRAFT, H. P. O Chamado de Cthulhu e Outros Contos. Trad. Guilherme da S. Braga. São Paulo: Hedra,<br />
2009.<br />
ISBN: 978-85-7621-031-3