01- Delírio

— Não. — Enterro meu rosto em seu peito, abraço-o e o aperto. Inimaginável, incompreensível:
uma vida sem ele. A ideia me arrasa, o fato de que ele está quase chorando me arrasa; ele ter feito isso
por mim, ele acredita que eu valho todo esse trabalho, e isso me mata. Ele é meu mundo, e meu mundo
é ele, e sem ele não há mundo. — Não vou fazer a intervenção. Não vou levar isso adiante. Não posso.
Quero ficar com você. Preciso ficar com você.
Alex segura meu rosto e se curva para fitar meus olhos. Seu rosto parece radiante agora, cheio de
esperança.
— Você não tem que levar a intervenção adiante — diz ele. Suas palavras saem atrapalhadas. Ele,
obviamente, vem pensando nisso há muito tempo e apenas tentou não dizer. — Lena, você não precisa
fazer nada. Poderíamos fugir. Para a Selva. Simplesmente fugir e nunca mais voltar. Mas... Lena, não
poderíamos voltar jamais. Você sabe disso, não é? Eles nos matariam ou nos prenderiam para sempre....
Mas, Lena, poderíamos fugir.
Eles nos matariam. Claro, ele tem razão. Uma vida fugindo: foi isso o que acabei de dizer que quero.
Dou um passo para trás, sentindo-me tonta de repente.
— Espere — digo. — Espere um segundo.
Ele me solta. A esperança em seu rosto acaba de uma vez, e por um instante ficamos olhando um
para o outro.
— Você não falou sério — diz ele, finalmente. — Não estava falando sério.
— Não, eu falei sério, mas...
— Mas você está com medo.
Alex caminha até a janela e observa a noite, recusando-se a olhar para mim. Suas costas parecem
assustadoras de novo: tão sólidas e impenetráveis, uma parede.
— Não estou com medo. Eu só estou... — Combato uma sensação sombria. Não sei o que estou.
Quero Alex e quero minha vida antiga, quero paz e felicidade, e sei que não posso viver sem ele: tudo ao
mesmo tempo.
— Não tem problema. — A voz dele está abatida. — Não precisa se explicar.
— Minha mãe — digo. Alex se vira, parecendo espantado. Estou tão surpresa quanto ele. Eu não
imaginava que diria essas palavras até elas saírem. — Não quero ser como ela. Você não entende? Vi o
que aconteceu com ela, vi como ela ficou... Isso a matou, Alex. Ela me abandonou, abandonou minha
irmã, abandonou tudo. E tudo por essa coisa, essa coisa dentro dela. Não serei como ela.
Nunca falei sobre isso, e estou surpresa com a dificuldade. Agora preciso me virar, sentindo malestar
e vergonha porque as lágrimas começaram de novo.
— Porque ela não foi curada? — Alex pergunta com um tom delicado.
Por um instante, não consigo falar, apenas me permito chorar, agora em silêncio, torcendo para que
ele não perceba. Quando consigo controlar minha voz, digo:
— Não é só isso.
Então, tudo volta de repente, os detalhes, as informações que nunca compartilhei com ninguém
antes:
— Ela era tão diferente de todo mundo! Eu sabia disso, que ela era diferente, que nós éramos, mas
no início não era algo assustador. Parecia nosso segredinho delicioso. Meu, dela e de Rachel também,
como se estivéssemos em um casulo. Era... era incrível. Mantínhamos todas as cortinas abaixadas, para
que ninguém nos visse. Fazíamos uma brincadeira em que minha mãe se escondia no corredor e Rachel
e eu tentávamos passar em disparada e, então, ela saltava para nos pegar; ela chamava isso de brincar de
duende. E sempre terminava em uma guerra de cócegas. Ela estava sempre rindo. Nós estávamos sempre
rindo. Às vezes, quando éramos muito barulhentas, ela colocava as mãos sobre nossa boca e ficava tensa
por um segundo, escutando. Acho que tentava ouvir movimentações dos vizinhos, para se certificar de
que nenhum deles tinha se alarmado. Mas ninguém nunca apareceu.