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Alex.<br />
Não consigo evitar: solto um pequeno grito de alegria.<br />
Fora do quarto, ouço uma batida, como algo atingindo a parede. Ouço tio William murmurar:<br />
— Droga!<br />
Alex entra na via estreita que separa nossa casa — na verdade, só uma faixa de grama, uma árvore<br />
anêmica solitária e uma grade que bate na cintura — da casa vizinha. Aceno freneticamente para ele. Ele<br />
desliga o motor, levantando a cabeça para a casa. Ainda está muito escuro, então não sei se ele consegue<br />
me ver.<br />
Arrisco chamar seu nome suavemente, para o quintal.<br />
— Alex!<br />
Ele vira a cabeça na direção de minha voz, com um sorriso se formando em seu rosto, abrindo os<br />
braços como se dissesse Você sabia que eu viria, não é?, e me lembro de como ele parecia na primeira vez<br />
em que o vi, na galeria no laboratório, todo brilho e luz, como uma estrela piscando na escuridão só<br />
para mim.<br />
E, naquele segundo, estou tão preenchida de amor que é como se meu corpo se transformasse em<br />
um único feixe ardente de luz, subindo, subindo, subindo, para além do quarto, das paredes e da cidade:<br />
como se tudo tivesse ficado para trás, e Alex e eu estivéssemos sozinhos no ar, totalmente livres.<br />
Então a porta do quarto se abre e William começa a berrar.<br />
De repente, a casa se torna barulho e luz, passos e gritos. Tio William está na entrada, gritando para<br />
Carol, e é como em um daqueles filmes de terror, quando a fera adormecida acorda, mas, neste caso, a<br />
casa é a fera. Pés ressoam na escada — os reguladores, suponho — e, no fim do corredor, Carol sai<br />
rapidamente do quarto, com a camisola voando como uma capa e a boca aberta em um grito longo e<br />
indecifrável.<br />
Empurro a tela com toda a minha força, mas ela está emperrada. Abaixo de mim, Alex também está<br />
gritando algo, mas não consigo entender com o ronco da motocicleta, que ganha vida outra vez.<br />
— Parem ela! — Carol berra, e William volta à vida, voltando a se mexer, entrando no quarto. A<br />
dor queima meu ombro quando empurro a tela novamente e sinto-a dobrar para fora um pouco e<br />
depois resistir. Não dá tempo, não dá tempo, não dá tempo. A qualquer segundo William irá me agarrar,<br />
e será o fim.<br />
Então, Gracie grita:<br />
— Espere!<br />
Todos congelam por um segundo. É a primeira e única vez em que Gracie falou com eles em voz<br />
alta. William tropeça sozinho e encara a neta, boquiaberto. Carol para na entrada, e, atrás dela, Jenny<br />
esfrega os olhos como se estivesse convencida de que está sonhando. Até os reguladores — os dois —<br />
hesitam no alto da escada.<br />
Aquele segundo é tudo de que preciso. Empurro mais uma vez a tela, que treme e sai, caindo na rua.<br />
E antes que eu possa pensar no que estou fazendo, ou na altura de dois andares até o chão, estou<br />
passando pela janela e soltando-a envolvida pelo ar como um abraço, então por um instante meu<br />
coração canta novamente e penso Estou voando.<br />
Em seguida, atinjo o chão com tanta força que minhas pernas cedem e fico sem ar. Meu tornozelo<br />
esquerdo se torce e uma dor absurda passa por todo o meu corpo. Avanço engatinhando, rolando<br />
encostada à grade. Acima de mim, a gritaria começou de novo, e logo depois a porta da casa se abre de<br />
repente e dois homens aparecem na varanda.<br />
— Lena!<br />
É a voz de Alex. Levanto o olhar. Ele está inclinado sobre a grade, com a mão estendida. Ergo um<br />
braço e ele me pega pelo cotovelo, quase me arrastando por cima da grade; algumas pontas dela<br />
prendem minha camiseta, rasgando o tecido e ferindo minha pele. Não há tempo para ficar assustada. Na