Editorial - Andes-SN
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US41:<strong>Andes</strong> 36 12/07/11 17:22 Página 88<br />
Produção do conhecimento versus produtivismo e a precarização do trabalho docente<br />
ções: a) revogar os decretos; ou, simplesmente, b)<br />
editar um novo em substituição aos anteriores,<br />
modificando sua redação (e conteúdo), mas não<br />
lhes dando “interpretação autêntica”. Qualquer<br />
uma dessas opções significaria o governo admitir<br />
aquilo que está evidente: de fato, a autonomia foi<br />
e está diretamente ameaçada de extinção.<br />
Seria exagerado dizer que não houve um re -<br />
cuo do governo estadual no que se refere aos<br />
con teúdos dos decretos. Mas, por óbvio, tal re -<br />
cuo é assaz pequeno, tendo em vista a impor tân -<br />
cia e a dimensão histórica que o problema sus ci -<br />
ta. É muito provável que o governador Serra, di -<br />
an te de uma conjuntura que lhe é politicamente<br />
favorável 14 , tenha utilizado o Decreto Declara tó -<br />
rio nº 1 com a intenção de fragmentar o movi -<br />
men to grevista.<br />
Quem ganha e quem perde<br />
Embora a revogação dos decretos possa significar<br />
apenas o retorno a uma condição ainda<br />
longe de ser adequada aos interesses da socie -<br />
dade, ela é uma necessidade inconteste. Sem tal<br />
revogação, a luta pela transformação social – que<br />
não se resume à instituição universitária – por<br />
certo tornar-se-á mais difícil. Assim, o desafio que<br />
se abre à sociedade, por meio da luta pela revo -<br />
gação dos decretos, não diz respeito a inte resses<br />
meramente corporativos, pois o que está em jogo<br />
é a garantia do futuro desta e das gera ções vindou -<br />
ras. Quem perde, portanto, com o desfecho das<br />
desocupações e das greves por todo o estado é a<br />
so ciedade paulista e brasileira, na medida em que<br />
não se conseguiu deter mais este passo do pro ces -<br />
so de destruição da universidade pública.<br />
Quem ganha com a manutenção dessa polí -<br />
tica educacional repressiva são os setores mais<br />
con servadores da elite brasileira, a saber, aqueles<br />
diretamente ligados aos interesses do grande ca -<br />
pi tal transnacional e a “burguesia nacional” que,<br />
subordinada a tais interesses, obtém seu quinhão<br />
disputando as migalhas que lhe sobram, a saber,<br />
as atividades do capital para as quais lhes é possi -<br />
bilitada participação sem ferir os interesses do<br />
grande capital; mas sim complementando-os de<br />
forma integrada.<br />
88 - DF, ano XVII, nº 41, janeiro de 2008<br />
Lucram também os grandes empresários do<br />
ensino, cuja “ética” profissional e idéias sobre o<br />
pa pel do ensino superior privado são expressas<br />
de modo paradigmático por João Carlos Di Gê -<br />
nio, proprietário da segunda maior universidade<br />
do país, a Unip, de São Paulo, e João Uchôa Ca -<br />
val canti, fundador e proprietário da Estácio de<br />
Sá, do Rio de Janeiro, a maior universidade brasi -<br />
leira em número de matrículas. O primeiro, ao<br />
ser questionado sobre o fato de que, substancial -<br />
men te, é a rede pública de ensino superior que<br />
produz pesquisas no país, é explícito quanto aos<br />
objetivos da rede privada: “Depois que o gover -<br />
no criou a figura do centro universitário, nin -<br />
guém mais quis abrir universidade. Porque [...]<br />
não precisa fazer pesquisa e nem precisa ter um<br />
terço dos professores em tempo integral, como a<br />
universidade” 15 . Já o segundo é ainda mais elo -<br />
qüente, afirmando que a “pesquisa é uma inu tili -<br />
dade pomposa, é uma perda de tempo fede ral”; ao<br />
que acrescenta veemente: “eu não me in te res sei<br />
[...] e nem acho que eu seja uma pessoa muito in -<br />
teressada pela educação. [...] Estou in teressado no<br />
Brasil? Não, não estou interessado no Brasil. Na<br />
cidadania? Também não. Na so lidariedade? Tam -<br />
bém não. Estou interessado na Estácio de Sá” 16 .<br />
Não nos esqueçamos que há ganhos também –<br />
menores em proporção, é evidente – no interior<br />
das universidades. Os setores que se beneficiam<br />
com a atual política são aqueles que, de modo ge -<br />
ral, trabalham no sentido do benefício privado<br />
com pesquisas, cursos pagos, venda de serviços,<br />
con sultorias a empresas, fundações, “inovações<br />
tec nológicas” e patentes etc. Para estes, eviden te -<br />
mente, não interessa uma universidade autô noma.<br />
Os exemplos não param aí. Dois documentos<br />
divulgados por docentes da Unicamp deixam<br />
isso muito claro 17 : o primeiro, um manifesto assi -<br />
na do por parte dos membros docentes do Con -<br />
selho Universitário (Consu – órgão deli be ra tivo<br />
mais importante da universidade), que, dentre<br />
ou tras coisas, considera “crime comum” as ma ni -<br />
festações estudantis; o segundo, um abaixo-as si -<br />
nado contra os “métodos” dos estudantes, des -<br />
qua lificados como “violentos” e “autoritários”.<br />
Na Unesp/Araraquara, o desfecho da ocupação<br />
Universidade e sociedade