O itiano era alto e feio, além do que ela tinha imaginado ser possível. Era maior do que umser humano alto, por volta dos dois metros e pouco. Na verdade parecia um homem magro emusculoso, mas sem a pele. Todos os músculos, tendões e ossos ficavam horripilantemente à mostra,como um corpo dissecado.— Que os chacais devorem sua mão direita, deixando apenas a esquerda para se limpar ecomer! – gritou Lina, enquanto o monstruoso alienígena lhe aferrava com mãos fortíssimas.A bordo do grande caça itiano em forma de asa-delta, Lina foi despojada de tudo, inclusivesuas roupas, e amarrada em um aparelho que lhe prendia braços e pernas abertas. A mesma cordaelástica utilizada para capturá-la era usada como chicote para açoitá-la repetidas vezes nas articulações,nas mãos e nos pés. Sua mente registrava a dor apenas como uma informação, já que aprivação de água e o espancamento contínuo a tinham levado a ultrapassar seu limiar. Felizmentea absoluta falta de conhecimento entre as espécies evitava que os itianos conhecessem a fisiologiaterrestre. Assim o soldado não se dava conta de que a tortura estava sendo bastante ineficaz. Sesoubesse aplicar a dor nos pontos exatos...— O que vocês querem de mim, cães-demônios? Sequer entendem o que eu falo? Ahhhh!Que seus dejetos petrifiquem dentro do seu ventre! — gritava Lina para eles.Imaginava se a estavam castigando pela morte dos colegas ou se apenas era algum ritual cominimigos capturados. Sem dúvida não tinham qualquer intenção de interrogá-la. Saberiam falar ouentenderiam o linguajar humano? Quem sabe por quanto tempo os itianos tinham ficado à espreitada humanidade?Ao final de algum tempo, o itiano pareceu satisfeito com o espancamento e deixou a sala,sem fazer qualquer menção de desamarrá-la. Virou-se e foi, como se a tivesse esquecido.O tempo passou sem que pudesse ser medido por ela, que submergia cada vez mais em fasesde inconsciência.Finalmente acordou deitada em uma lisa prateleira metálica presa à parede de outra sala danave, bem menor. Deve ter sido drogada em algum momento, talvez por algum gás quando oalienígena a deixara sozinha. Por um momento ou dois perguntou-se se teria morrido e se estariaem uma câmara funerária. Pouco a pouco entendeu que estava em uma minúscula cela.As marcas do chicote eram recentes em seu corpo, o que indicava que não se passara muitotempo. Em seu braço havia uma agulha ligada a uma cânula de material elástico que se prendia aum frasco.Estava sendo alimentada!Lina somente conseguia ver que estava em uma tipo de laboratório ou sala de trabalho pequena.Uma mesa de proporções itianas ficava na sua frente.Livrou-se da agulha e abriu o frasco, curvando-se para se sentar na prateleira, já que a celaera pouco maior do que seria uma gavetão de morgue. Só que gavetas de morgue não possuem telasmetálicas... Provavelmente a nave onde estava era utilizada em missões científicas e a cela nãofosse mais do que um contendor de animais, de cobaias.Dentro do frasco havia um soro claro e adocicado, que Lina bebeu sem prazer. Antes tomouo cuidado de umedecer os lábios e a boca, terrivelmente rachados pela secura do deserto. Ao menosse sentia melhor por ter descansado e o líquido parecia bastante revigorante.68LEONARDO CARRION
Devo estar sendo levada para a nave-mãe itiana, na melhor das hipóteses para interrogatório.Poderia facilmente imaginar outras coisas bem piores.Sanchez, o que devo fazer?, pensou.Enquanto imaginava diversas cenas nas quais roubava a pistola de um dos itianos e disparavacontra eles, começou a ouvir batidas como uma chuva pesada caindo em telhas de zinco. Aos poucoso som das pancadas foi crescendo sem que houvesse qualquer indicação de movimento da nave.Também não se via na cabine o seu captor itiano ou ouvia-se outro som que não o das pancadas.O ruído agora era ensurdecedor e algumas pancadas vinham acompanhadas de sacudidas danave. A nave sofreu uma inclinação brusca com uma pancada mais forte, fazendo com que Linafosse jogada dentro da pequena cela batendo fortemente com a cabeça. Ela se segurava na gradequando, do outro lado, uma batida foi tão violenta que a parede foi amassada de forma que ela pôdecolocar a mão para fora pelo vão. Conseguiu alcançar o trinco da porta e sair bem a tempo, pois apróxima pancada reduziu a cela à metade de seu tamanho, fazendo Lina chocar-se com os objetosda sala onde se encontrava.Sem perder um segundo ela correu, agarrando uma haste de metal pesado cuja utilidadeoriginal desconhecia e não se importou em especular, mas que daria um excelente porrete casocruzasse com um de seus captores. A porta se encontrava aberta e ela saiu para a sala onde foratorturada. Pareceu-lhe que era a sala de controle da nave porque, às costas do local onde estiveraamarrada, via-se uma enorme janela transparente à frente de um painel com controles.Surpreendeu-se ao ver que, ao contrário do que pensava, ainda se encontrava no solo e Carina-1469 brilhava alto em seu segundo dia como sobrevivente no planeta. Uma espécie de ave, parecidacom um corvo gigante, esvoaçava do lado de fora trazendo nas patas um grande pedregulho negro.Viu outras aves surgirem e, quando se aproximaram suficientemente, deixaram cair a cargacontra a nave itiana como se fosse uma bomba. Algumas carregavam pedras muito maiores emconjunto de quatro ou cinco animais, e Lina imaginou que seriam capazes de amassar a nave combastante severidade. Não se viam itianos em lugar algum. Sabia que havia animais no planeta, masnão se informara sobre detalhes sobre esles, já que sua função tinha sido levantamento topográficoda parte desértica do planeta. Apesar disso, tinha certeza de que não esqueceria qualquer menção apássaros assassinos jogadores de pedras!Sem pensar muito, sentou-se aos controles, entre pancadas e sacudidas, prendendo-se aocinto de segurança bem maior do que ela. Assim que se viu presa à cadeira olhou para a infinidadede comandos. Não ousava sair da nave, não com aquelas coisas lá fora e, possivelmente, itianos nascercanias.Havia uma série de incompreensíveis alavancas e chaves, botões e cristais no painel de controle.Tudo era marcado com a característica escrita itiana, que se assemelhava ao cirílico. Tentouuma série deles até que sentiu uma vibração na nave, que acreditou ser o motor ligando. Apertoubotões e movimentou alavancas até que, ao alçar uma delas, a nave deu uma sacudida e subiusacolejando bastante. Ao que parecia tinha subido cerca de trezentos metros de uma arrancada só,estabilizando-se nessa altura precária. Antes que Lina pudesse raciocinar muito sobre o assuntopercebeu que, pouco a pouco, a nave perdia altura ladeando-se para a esquerda.Tentou localizar os controles que mantinham a nave estabilizada, movimentando as alavancascom mais suavidade. A nave não respondeu e continuou se inclinando em um ângulo estranho,EL DESERTO E MIRALEJOS69
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