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Revista_Black_Rocket_Ed5

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“I’d rather be myself,” he said.“Myself and nasty. Not somebody else, however jolly.”Aldous Huxley, Brave new world“Querida mãe,Não existe outra maneira de começar esta carta. Lamento agora ter perdido todo esse tempo,mas, como você sempre disse, nunca é tarde demais para mudar de estrada. Acredito mesmo quenão seja, que possa haver uma saída para mim e para outros como eu. Graças a pessoas como você,nós ainda existimos. É o que me faz manter a esperança de dias melhores.O tom destas palavras pode dar a entender que me sinto triste. Na verdade, não me lembro deter sido tão feliz desde os seis anos de idade. Mais precisamente, até o dia daquela reunião com acoordenadora da escola, quando fomos informados de que a direção tinha decidido aderir ao MétodoSinapse. Os alunos “incapazes de acompanhar o aprendizado” tinham trinta dias para se adaptarou não poderiam renovar a matrícula para o ano seguinte. Lembro-me das expressões de surpresae revolta, de alguns pais tentando argumentar em meio ao protesto furioso da maioria, da sua mãoapertando a minha, talvez com mais força que de costume, quando deixamos a escola antes dohorário regular. Eu não fazia ideia de que aquela seria a última vez.Em casa, você tentou me explicar o que tinha acontecido, o que provavelmente iriaacontecer dali em diante, mas naquela idade eu não conseguia entender os detalhes. Só como passar dos anos fui compreender as implicações de sua escolha. Ou melhor, de suas váriasescolhas, começando por aquela que você fez assim que nasci e tive de ser levada aoCentro de Cadastramento do nosso bairro. Lá, juntamente com as vacinas contra duzentase catorze doenças e um chip contendo informações sobre outras tantas, ofereceram-lheuma nova tecnologia: um pequeno dispositivo a ser implantado, de forma indolor, sob omeu couro cabeludo. A finalidade era transmitir pulsos elétricos, também indolores, ao cérebrodos bebês, “fortalecendo assim as sinapses e assegurando um aprendizado rápido e omelhor aproveitamento do potencial de cada futuro cidadão”.Esse era o texto do folheto assinado pela Diretoria Federal de Saúde, o qual tambémcontinha um longo histórico acerca da empresa que fabricava o sensor. Chamava-se, justamente,Sinapse, e trabalhava havia muitas décadas no ramo da inteligência artificial,com aplicações nas áreas da educação e da medicina. Seus dispositivos tinhamsido aprovados pelas federações reguladoras de saúde da maioria dospaíses desenvolvidos, por isso não havia nada a temer. Pelo contrário: prevendouma improvável eventualidade, o implante dava direito à assistênciada Mens Sana, a empresa de saúde associada à Sinapse – equem não iria querer tantas vantagens para o seu bebê?Pois justamente você, uma educadora e agente cultural,você, minha mãe, não quis.Sua negativa foi vista com estranheza, mas nãocontestada. A tecnologia era recente; um implante,mesmo subcutâneo, mesmo feito por especialistas,dava um pouco de receio. Várias famílias recusa-www.revistablackrocket.net -89

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