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MUHM - Museu de História da Medicina

Um acervo vivo que faz ponte entre o ontem e o hoje.

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Luciano Raul Panatieri e Veridiano Farias<br />

os mal-entendidos e ao mesmo tempo cui<strong>da</strong>r dos crescimentos<br />

do bem-estar moral e material <strong>da</strong>s populações aborígenes<br />

[...]” (ATA DA CONFERÊNCIA, Berlim, 26 fev. 1885).<br />

Essa foi a maneira <strong>de</strong> acalmar os ânimos <strong>da</strong>s potências e <strong>de</strong><br />

levar a “civilização” à África. Os portugueses per<strong>de</strong>m espaços nesta<br />

região, motivo: fraco po<strong>de</strong>rio militar (ASSUMPÇÃO, 2008). 10<br />

A Itália, país <strong>de</strong> origem do lado paterno <strong>de</strong> Luciano Panatieri,<br />

recebeu como território, via Conferência <strong>de</strong> Berlim, a<br />

região <strong>da</strong> Eritréia, atual Etiópia (ou Abissínia), país <strong>de</strong> origem<br />

do lado materno do médico negro.<br />

Destaca-se que os africanos resistiram às ingerências externas.<br />

Contudo, a ocupação <strong>da</strong> África era irreversível, como <strong>de</strong>stacou<br />

Silvério (2013, p. 345), principalmente pela vantagem tecnológica<br />

e militar dos europeus. Essa vantagem não significou<br />

falta <strong>de</strong> resistências, <strong>de</strong>vido à força <strong>da</strong>s populações africanas.<br />

Os africanos nunca se haviam resignado à pacificação em<br />

uma resistência movi<strong>da</strong> por i<strong>de</strong>ologias racionais e inovadoras<br />

em movimentos <strong>de</strong> resistências significantes como os ocorridos<br />

em Senegal (1861-1892), Egito (1881), Sudão (1896), Tunísia<br />

(1881), Marrocos (1881), Daomé, Golfo <strong>da</strong> Guiné (1880-<br />

1900), Costa do Ouro e Serra Leoa (1880), Quênia (1880) etc.,<br />

ca<strong>da</strong> qual com sua característica (SILVÉRIO, 2013). A Libéria e<br />

a Etiópia sobreviviam in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes. 11<br />

Tem-se na Somália, território <strong>de</strong> fronteira com a Etiópia,<br />

um teatro <strong>de</strong> rivali<strong>da</strong><strong>de</strong>s coloniais entre a Itália, o Reino Unido<br />

e a França. Na reali<strong>da</strong><strong>de</strong> todos estavam voltados para a Índia<br />

e a Ásia. A partilha do país somali estava termina<strong>da</strong> em 1897<br />

(SILVÉRIO, 2013, p. 347), no mesmo ano <strong>de</strong> nascimento <strong>de</strong><br />

Luciano Raul Panatieri.<br />

Conforme um documento localizado na residência <strong>de</strong><br />

sua filha, Dona Elvira, em uma escrita <strong>de</strong> si, conforme já citado,<br />

elaborado pelo próprio médico, sem <strong>da</strong>ta, mas que<br />

provavelmente tenha sido redigi<strong>da</strong> na déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1970, têm-<br />

10 Na divisão do território africano, após a Conferência presidi<strong>da</strong> por Bismark,<br />

<strong>da</strong> Alemanha, com influência <strong>de</strong> Leopoldo II <strong>da</strong> Bélgica, a Itália tomou posse <strong>da</strong><br />

Eritréia e <strong>da</strong> Somália.<br />

11 A Libéria resistiu a expropriações e ao controle externo por meio <strong>de</strong> representações<br />

diplomáticas junto aos Estados Unidos, já a Etiópia conseguiu, a partir<br />

<strong>da</strong> resistência arma<strong>da</strong>, expulsar os italianos <strong>de</strong> seus territórios em 1896, na batalha<br />

<strong>de</strong> Adwa. O resultado <strong>da</strong> batalha teve profun<strong>da</strong> influência na história <strong>da</strong>s relações<br />

entre Europa e África. A Etiópia ganhou prestígio em to<strong>da</strong> a região do Mar Vermelho.<br />

Intelectuais negros do mundo manifestaram interesses pelo último estado<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>da</strong> África, visto que a Libéria fora forma<strong>da</strong> por afro-estaduni<strong>de</strong>nses<br />

(SILVÉRIO, 2013, p.374).<br />

se os indícios <strong>de</strong> sua origem bem como <strong>da</strong> relação íntima <strong>de</strong><br />

seus pais: “Não sei se minha mãe casou ou não com meu pai.<br />

Apenas sei que ele era italiano <strong>de</strong> Gênova, oficial <strong>da</strong> Marinha<br />

e que fora obrigado a fugir <strong>de</strong> uma guerra na África. Santiago<br />

Panatieri. Minha mãe era <strong>de</strong> pouca conversa” (PANATIERI,<br />

[s.d.], p. 1).<br />

Detém-se nestas duas passagens do escrito acima para<br />

interpretações. Primeiro, a questão <strong>da</strong> fuga <strong>de</strong> seu pai <strong>de</strong> “uma<br />

guerra na África” e, segundo, “a pouca conversa <strong>de</strong> sua mãe”.<br />

Notou-se que em nenhum momento Luciano Panatieri<br />

fez alusão ao imperialismo europeu em solo africano, e muito<br />

menos cita a tentativa <strong>de</strong> domínio italiano sobre a Etiópia e a<br />

Somália. Seria a fuga <strong>de</strong> seu pai, Santiago Panatieri, gera<strong>da</strong><br />

pelas resistências africanas?<br />

Segundo matéria noticia<strong>da</strong> no Jornal AMRIGS, produzi<strong>da</strong><br />

com o auxílio do neto <strong>de</strong> Luciano, Ramiro Panatiere, seu<br />

bisavô Santiago, militar, veio à América do Sul, mais precisamente<br />

ao Uruguai, atraído por oportuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> Guerra do<br />

Paraguai (1864-1870) (AMRIGS, 2006, p. 15). A partir <strong>de</strong>sta<br />

constatação, po<strong>de</strong>-se enten<strong>de</strong>r que Santiago veio com Abrelina<br />

para a América antes do conflito ítalo-abissínio, o que vai<br />

ao encontro <strong>da</strong>s informações obti<strong>da</strong>s em entrevista concedi<strong>da</strong><br />

pela filha <strong>de</strong> Luciano, Dona Elvira. Possivelmente seu avô era<br />

um mercenário que, provavelmente, transitava entre a Itália e<br />

a África. Segundo suas palavras:<br />

Meu avô enxergou, essa minha avó, dizem que era<br />

muito bonita e se apaixonou por ela, vieram para<br />

o Uruguai [...], se conheceram na Itália, porque ele<br />

estava fazendo a rota para vir pra cá, eu acho que<br />

ele era esse tipo <strong>de</strong> pessoa que se ven<strong>de</strong> pra lutar<br />

[...] mercenário [...] (ELVIRA, 2015, p. 3).<br />

Mas o silêncio notado por Luciano Panatieri no que tange<br />

às falas <strong>de</strong> sua mãe teria relação com as mágoas <strong>de</strong>correntes<br />

<strong>de</strong>ste contexto <strong>de</strong> conflitos? Como teria sido a relação <strong>da</strong>s<br />

pessoas que geraram Panatieri? Algo <strong>de</strong>nota muita atenção<br />

nesta escrita: o fato <strong>de</strong> Panatieri não saber se os seus pais<br />

realmente eram casados. Destaca-se que sua mãe recebeu o<br />

nome e sobrenome <strong>de</strong> seu companheiro.<br />

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