MUHM - Museu de História da Medicina

Para além da medicina da alma
ou não com asas, possuindo sempre uma simetria em seu
todo, razão pela qual suas partes demonstrariam a sabedoria
do Auctor. Observa, ainda, que, para alguns autores, os
insetos deveriam apresentar uma série de características que
acabariam por excluir uma boa parte dos animalillos. Sánchez
Labrador classifica os insetos por famílias, entre as quais estavam
a dos que voavam, a dos que se arrastavam ou a dos que
pareciam que se arrastavam. Entre essas famílias existiriam distinções
quanto aos corpos dos insetos, que poderiam se constituir
de anéis, nós, placas e outras divisões. Afirma, ainda,
que os insetos, diferentemente de outros animais, não tinham
reconhecidas suas virtudes terapêuticas, porque os médicos os
depreciavam por seu tamanho.
No último capítulo do livro De los insectos, pertencente
à quarta e última parte do Paraguay Natural Ilustrado,
encontramos os 21 insetos cujas virtudes terapêuticas são
apresentadas por Sánchez Labrador. São eles: as abelhas
(abejas) 11 , as vespas (abispas) 12 , os escorpiões (alacranes), as
aranhas (arañas), as cantáridas 13 (cantárides), os percevejos
(chinches) 14 , a centopeia (cientopies) 15 , a cigarra (cigarra) 16 ,
11 De acordo com Labrador, as abelhas poderiam ser utilizadas como um ótimo diurético,
após serem reduzidas a um pó, que deveria ser tomado todas as manhãs
em jejum, na medida de meia dragma. Para que pudesse ser ingerido, a ele deveria
ser acrescentado extrato de zimbro (enebro) ou ser consumido dentro do vinho.
Este pó, também, quando colocado na cabeça, seria eficiente contra a calvície
(Alopecia) e faria crescer os cabelos ainda mais grossos do que anteriormente. “Las
sales de las Abejas son muy volatiles; de aqui es, que secas, y en polvo, y despues
tomadas por la boca, son diuréticas, y diaphoreticas (diaforética/sudorífera).” (SÁ-
NCHEZ LABRADOR, 1771, p. 361.)
12 As vespas teriam as mesmas propriedades terapêuticas atribuídas às baratas (cucarachas)
e à cochonilha (cochinilla), pois podiam ser utilizadas também na eliminação
de cálculos renais. Labrador defende que deveriam ser utilizadas de forma similar
ao tabaco, devendo ser mascadas inteiras. De acordo com ele, alguns indivíduos
acreditavam que prendendo algumas vespas na mão esquerda era possível se livrar
da febre quartana (calentura quartana).
13 “Inseto coleóptero heterômero de cor verde-brilhante (Litta vesicatoria), comum
no Sul da Europa. Preparação de cantáridas secas, aplicada externamente como
rubefaciente e vesicante poderoso; esquentária. Tomada em doses moderadas,
é diurética e estimulante dos órgãos urinários e reprodutores, porém altamente
venenosa em doses grandes.” CANTÁRIDA. Dicionário Michaelis. Disponível em:
Acesso em: 9 set. 2014.
14 Sobre os percevejos, Sánchez Labrador afirma que “estos hediondos animalillos
contienen mucha sal volátil, y óleo” (SÁNCHEZ LABRADOR, 1771, p. 362), podendo
ser também utilizados para provocar a urina, isso porque se mantinham dentro do
canal por onde ela passava e, com a titilação, faziam com que o canal se ampliasse
e relaxasse o esfíncter da bexiga, permitindo que a urina pudesse fluir normalmente.
Os percevejos também podiam ser tostados e ingeridos sob a forma de pó.
15 As centopéias planas, quando secas, moídas e diluídas em água, podiam ser, segundo
Labrador, eficazes contra as dores de moelas se aplicadas nas bochechas duas
vezes ao dia. Já as centopeias redondas podiam ser moídas e colocadas sobre a
região atingida por uma flecha ou por um espinho, pois ajudavam na sua eliminação.
16 Este inseto seria rico em óleo e sal volátil, útil contra cólicas e problemas na bexiga:
as cochonilhas (cochinillas) 17 , as baratas (cucarachas) 18 , os
besouros (escarabajos) 19 , os carrapatos (garrapatas) 20 , os grilos
(grillos), as formigas (hormigas) 21 , os gafanhotos (langosta),
os vermes (lombrices) 22 , as moscas (moscas) 23 , os mos-
“la ceniza de la Cigarra es diurética; administrase en dosis de seis hasta doce granos
en masa, o en bebida contra el mal de piedra” (SÁNCHEZ LABRADOR, 1771,
p. 363). Para sua utilização medicinal era necessário tostá-las, reduzindo-as a pó.
Em uma das receitas, Labrador nos informa que era preciso tostar seis cigarras e
adicionar a elas grãos de pimenta, formando uma pasta que deveria ser servida ao
paciente com pão. No caso de pacientes com problemas na bexiga, estes animais
deveriam ser ingeridos fritos.
17 “Nome comum aos insetos homópteros da família dos Coccídeos, também chamados
piolhos-dos-vegetais. As fêmeas e as formas jovens são ápteras e vivem
permanentemente sugando seiva vegetal de numerosas plantas, constituindose
em verdadeiras pragas. Algumas espécies são úteis por serem produtoras de
substâncias que o homem aproveita em suas indústrias, como o corante chamado
carmim e a goma-laca.” COCHINILHA. Dicionário Michaelis. Disponível
em:
Acesso em: 24 set. 2014. Segundo Labrador,
podiam ser chamadas de Milpies e Puercas de S. Anton, possuindo uma grande
quantidade de sal e “espírito” voláteis, podendo ser utilizadas contra a asma e
contra os problemas nos olhos causados pela condensação da Lympha (Linfa?)
bem como aproveitadas em situações de obstruções das entranhas e em casos de
acidentes.
18 De acordo com o jesuíta, “son muy utiles; porque ayudan a la digestión; disuelven
muy bien, y abren. Por estas buenas qualidades se administran para resolver las
viscosidades acres, y desostruír los órganos. También en la Tiricia, yen el mal de
Piedra, retención de orina, y cólica” (SÁNCHEZ LABRADOR, 1771, p. 365).
19 Os besouros, segundo Labrador, contam com virtudes diuréticas, podendo ser
administrados em doenças como a hidropisia, os reumatismos e a gota. Para serem
utilizados como medicamento, eles deveriam ser reduzidos a um pó, que deveria
ser dado ao doente em doses de dois até oito grãos em água de parietárias. Quando
amassados e cozidos com alguma espécie de unguento, podiam ser aplicados
em lesões do corpo, pois suavizavam as dores dos nervos e as convulsões. Concordando
com Johann Schröder [médico e farmacólogo alemão do século XVII],
Labrador informa que o azeite feito com a infusão dos besouros servia também
contra a dor de ouvido e a surdez, devendo ser posto na região que se encontrava
dolorida. Ratificando as proposições de James e Schröder, o jesuíta afirma que as
antenas dos besouros, em pó, podiam ser utilizadas para contornar partos difíceis.
20 De acordo com Labrador, estes insetos, se tostados até virarem pó e espalhados
pela cabeça, podiam fazer cair o cabelo. Também podiam ser utilizados para curar
a erisipela e a sarna. Já o sangue dos carrapatos podia ser utilizado para curar
feridas e úlceras inveteradas e que tinham fístula.
21 Este inseto, seus ovos e, também, os formigueiros são, segundo Sánchez Labrador,
ricos em “espírito” ácido, sal volátil e óleo, sendo, por isso, um remédio excelente
para o restabelecimento das forças. Este elemento das formigas seria utilizado na
fabricação de um medicamento chamado Aqua magnanimatis, que era utilizado
para os males de cabeza, especialmente os relacionados com o cérebro, como a
apoplexia serosa, vertigens, paralisia e muitos outros que, segundo o autor, provinham
do excesso de fleuma, mais frequente nos idosos: “El óleo de Hormigas
es excelentísimo remedio para aplicarse por fuera. Ponese las Hormigas en aceyte
común, y son mejores las que tienen alas; el vaso se expone al sol por espacio de
[Aco. Drâs]. Tiene este aceyte virtud de vivificar los espíritus, de expeler los flatos,
y cura ulceras malignas” (SÁNCHEZ LABRADOR, 1771, p. 367).
22 Estes vermes, de acordo com Labrador, apresentariam uma grande secreção de sal
volátil e óleo, possuindo, portanto, virtudes diuréticas, sudoríferas e de desobstrução
de canais. Recomenda que fossem utilizados com cautela depois de reduzidos
a pó, pois podiam se tornar prejudiciais, já que do pó dos vermes armazenado por
meses originavam-se novos vermes. Exteriormente o sal e o “espírito” dos vermes
podiam ser utilizados para fazer um unguento contra o pasmo, o reumatismo e
outros problemas causados pelos nervos. Mortos os vermes também podiam ser
aplicados em dentes cariados para diminuir dores.
23 Segundo Labrador, as moscas comuns teriam propriedades emolientes e abster-
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