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MUHM - Museu de História da Medicina

Um acervo vivo que faz ponte entre o ontem e o hoje.

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<strong>Medicina</strong> militar no rio gran<strong>de</strong> do sul<br />

registrou nove filhos em Rio Gran<strong>de</strong> e, por ocasião <strong>da</strong> invasão<br />

espanhola, passou a morar em Viamão e Rio Pardo. Sebastião<br />

permaneceu ativo por muitos anos no Continente e faleceu<br />

em 1783 na sua estância entre os rios dos Sinos e Caí, terra<br />

resultante <strong>da</strong> concessão <strong>de</strong> sesmaria. Foi ele o primeiro a exercer<br />

a medicina no Rio Gran<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Pedro. Sérgio <strong>da</strong> Costa<br />

Franco afirma sobre a época:<br />

O cirurgião, indispensável para reduzir fraturas, praticar<br />

amputações <strong>de</strong> membros e realizar curativos em<br />

ferimentos <strong>de</strong> combatentes, era figura obrigatória em<br />

to<strong>da</strong>s as uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s dos exércitos e <strong>da</strong>s marinhas. E<br />

sendo o Rio Gran<strong>de</strong> do Sul, por longos anos, mera<br />

comandância militar, on<strong>de</strong> a ativi<strong>da</strong><strong>de</strong> bélica ocupava<br />

o primeiro plano <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as funções estatais, po<strong>de</strong>-se<br />

facilmente concluir que a medicina militar teve<br />

absoluta primazia em relação às funções civis <strong>da</strong> arte<br />

médica.<br />

Durante todo o século XVIII, só houve cirurgiões exercendo<br />

a medicina no Rio Gran<strong>de</strong> do Sul sempre vinculados a<br />

uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s militares e seus hospitais. Eles eram poucos e seu<br />

número só aumentava em função <strong>de</strong> acontecimentos militares<br />

extraordinários. Tal ocorreu quando Gomes Freire veio para<br />

estabelecer fronteiras em função do Tratado <strong>de</strong> Madrid (1750)<br />

e para guerrear com os índios <strong>da</strong>s Missões que não aceitavam<br />

o estabelecido pelas cortes, ou quando Portugal concentrou<br />

forças no Rio Gran<strong>de</strong> para expulsar os espanhóis em 1776.<br />

O certo é que em 1779 existiam três hospitais militares, do<br />

tipo enfermaria, localizados em Porto Alegre, Rio Pardo e Rio<br />

Gran<strong>de</strong>. Havia um cirurgião em ca<strong>da</strong> um <strong>de</strong>les e apenas o<br />

hospital <strong>de</strong> Porto Alegre contava com um aju<strong>da</strong>nte <strong>de</strong> cirurgia.<br />

Para bem conhecer <strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong>sempenha<strong>da</strong>s por um cirurgião<br />

na época, transcrevo trecho do relatório <strong>de</strong> Francisco<br />

Ferreira <strong>de</strong> Souza, cirurgião-mor do Primeiro Regimento <strong>de</strong> Infantaria<br />

do Rio <strong>de</strong> Janeiro e que viera para integrar as forças<br />

encarrega<strong>da</strong>s <strong>da</strong> expulsão dos espanhóis, que ocupavam o Rio<br />

Gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1763. Francisco foi consi<strong>de</strong>rado por Guilhermino<br />

Cesar como um dos primeiros cronistas a escrever sobre o<br />

Rio Gran<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Pedro (CESAR, 1981). Testemunhou como<br />

poucos o surgimento do gaúcho e, no constante às ativi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

médicas, <strong>de</strong>ixou relatório em que analisa sua atuação, sempre<br />

usando a terceira pessoa:<br />

Dos espanhóis feridos, uns a espa<strong>da</strong> e outros a<br />

mosquete, se recolheram para o hospital vinte e<br />

sete (menos o capitão Dom José que no dia do ataque<br />

pereceu) os quais foram dirigidos ao cirurgiãomor<br />

Francisco Ferreira <strong>de</strong> Souza, a quem tocou (por<br />

or<strong>de</strong>m) a inspeção <strong>de</strong>stes enfermos, dos quais só<br />

faleceram (<strong>de</strong>ntro do hospital) dois. Do ataque do<br />

chefe Mc Doval (sic) se recolheram para o hospital<br />

vinte e nove enfermos (menos o capitão <strong>de</strong> mar e<br />

guerra Antônio José Pegado), dos quais só faleceram<br />

dois. O cirurgião-mor supra dito, a cujo cargo<br />

estava a assistência <strong>de</strong> tais enfermos amputou no<br />

dia 20 <strong>de</strong> abril quatro pernas, dois braços, e reduziu<br />

entre pernas e braços fraturados sete, e os mais<br />

feridos todos eram <strong>de</strong> muita circunspeção, o dito<br />

cirurgião-mor assistia num <strong>de</strong>svelo incessante em<br />

continua<strong>da</strong> visita, tanto a estes enfermos, como<br />

aos espanhóis, com muita cari<strong>da</strong><strong>de</strong>, amor e <strong>de</strong>svelo.<br />

Até como uma homenagem a Abeillard Barreto, pesquisador<br />

capaz <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir crônicas <strong>de</strong>ste cirurgião militar na<br />

Biblioteca Pública <strong>de</strong> Évora e na Biblioteca <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> Coimbra, repito trechos <strong>de</strong>ssas crônicas, sem divulgar sua<br />

má vonta<strong>de</strong> para com as maltrata<strong>da</strong>s mulheres continentinas:<br />

“[...] usam <strong>de</strong> um pano aberto pelo meio, a que chamam poncho,<br />

pela abertura metem a cabeça, e também lhe serve <strong>de</strong><br />

cobertor ou chale”. Mais adiante, sobre a educação ou a falta<br />

<strong>de</strong>sta, escreveu: “Os meninos logo <strong>de</strong> tenra i<strong>da</strong><strong>de</strong> apren<strong>de</strong>m a<br />

laçar cachorros, quando maiores terneiros, e quando homens,<br />

potros, potrancas, éguas, cavalos, quer domésticos quer xucros<br />

[...]. A ler e escrever não se empregam, pois todo o <strong>de</strong>stino<br />

é laçar, é arrear e bolear”. Mesmo em tempos <strong>de</strong> paz, exerciam<br />

os cirurgiões seu trabalho nos quartéis e acampamentos,<br />

sempre envolvidos com a elite jovem <strong>da</strong> população que gravitava<br />

em torno <strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong><strong>de</strong>s guerreiras. Construir fortins,<br />

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