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Bubble Gum – Lolita Pille Página 1 - CloudMe

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ouço mais nada, nem a sirene da polícia passando ao longe indo para o Norte, nem os passos<br />

apressados daqueles que saem, ou entram, ou riem, nem o trote dos cavalos cansados de<br />

puxar turistas apaixonados, nem os motores que aceleram quando o sinal fica verde, ou<br />

porque o Plaza acaba de se apagar, e o Central Park de desaparecer, e eu de me afogar na hora<br />

em que menos esperava, no meu quarto de Nova York, porque Manon, a quem não amo, que<br />

nunca amei, acaba de me perguntar se não me incomodo de dormir esta noite no outro<br />

quarto, Derek.<br />

— Não — respondo —, nem um pouco, qual é a importância que você acha que isso tem para<br />

mim?<br />

Ela simplesmente inclina a cabeça e pega sua pele da minha mão, vai até o armário e abre as<br />

duas portas com dificuldade, como se as portas do armário fossem pesadas demais para ela, e<br />

arruma a estola com cuidado. Depois vai para o banheiro, claudicando nas suas botas negras,<br />

que larga na entrada, deixando deslizar lentamente seu vestido, e seu sutiã, no chão, entrando<br />

no banheiro sem fechar a porta para que eu a veja se olhar longamente no espelho, sempre<br />

com esse ar distante e altivo, ignorando meu reflexo, para depois soltar suas meias das ligas,<br />

sentada no canto da banheira, abrir a torneira de água quente no máximo e, enquanto a<br />

banheira enche, veste um robe e volta, me pede um cigarro, o qual acendo instintivamente,<br />

buscando seu olhar que se perde na distância, e quando vai se apoiar na janela, parecendo que<br />

vai quebrar o vidro e voar para longe, eu me levanto sem saber muito bem o que vou dizer, e é<br />

o momento em que tocam a campainha e Manon me diz apenas: "Você cuida das bagagens" e<br />

me dá o cigarro dela, e eu escuto, quando vou abrir, a porta do banheiro batendo e a chave<br />

virando na fechadura.<br />

À uma da madrugada, Cipriani Downtown está cheio demais, faz uns bons quinze minutos que<br />

estou esperando Stanislas, e tento por todos os meios disfarçar minha chateação: perguntei ao<br />

gerente como iam as coisas, além das novidades sobre seus parentes, amigos, filhos, mas ele<br />

não tinha filhos e acaba me plantando ali, sozinho, na melhor mesa, quer dizer, a mesa para a<br />

qual todo mundo está sempre olhando, e, por falar nisso, todo mundo tem um olho em cima<br />

de mim, tomando um Bellini atrás do outro, porque não posso fumar um cigarro atrás do<br />

outro, o cenho fechado, olho para um ponto qualquer fingindo uma grande concentração,<br />

acabo descolando um garçom ao qual peço com sotaque francês exagerado que me explique a<br />

composição de um Bellini, junto com a história dele se segue uma leve bebedeira aparente, e<br />

percebo Kurt Cobain na calçada defronte debaixo de uma manta escocesa pedindo esmola, e<br />

penso primeiramente que deve ser um delírio, considerando o fato indiscutível de que já faz<br />

quase dez anos que Kurt Cobain não está mais neste mundo, sem contar que, caso ainda<br />

estivesse vivo, ele certamente não estaria pedindo esmola na West Broadway, considerando a<br />

montanha de dinheiro que ele receberia dos royalties, e àepois de ter conseguido meu garçom<br />

de volta e perguntar: "Você está vendo aquele cara ali, ele de fato está lá, não é, de verdade,<br />

não é?", e ter conseguido uma resposta afirmativa, concluí que aquele cara deve ser<br />

simplesmente uma espécie de sósia, e tranquilizado abro o Wall Street Journal mas, talvez<br />

porque sejam pequenas demais, talvez porque minha mente esteja distante, as letras pretas<br />

no fundo branco se confundem diante dos meus olhos e me dão a impressão inquíetante de<br />

que não fazem nenhum sentido, e isso me deixa apavorado, quando consigo afinal acender um<br />

cigarro, dizendo a mim mesmo que não ousariam me pôr na rua, mas todos sem exceção se<br />

viram para mim, horrorizados e asfixiados, enquanto finjo que nada vi, desaparecendo atrás do<br />

jornal cabalístico, quando escuto:<br />

— Sinto muito, preso no escritório. Trânsito doido. Hora do rush. impossível conseguir um táxi.<br />

Fiquei preso entre duas antas na Times Square. O cab driver era um paquistanês eufórico.<br />

Tinha acabado de ter gêmeos. E como se não fosse o bastante... O que é que você está<br />

fazendo com esse jornal?<br />

— Hum — digo eu —, estou lendo uma matéria interessantíssima sobre a fabricação ilícita de<br />

uma bomba A em Pyongyang, Coréia do Norte.<br />

— Derek, você está segurando o jornal de cabeça para baixo,<br />

<strong>Bubble</strong> <strong>Gum</strong> <strong>–</strong> <strong>Lolita</strong> <strong>Pille</strong> <strong>Página</strong> 44

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