Bubble Gum – Lolita Pille Página 1 - CloudMe
Bubble Gum – Lolita Pille Página 1 - CloudMe
Bubble Gum – Lolita Pille Página 1 - CloudMe
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
12 Intervalo<br />
DEREK - O mundo era bastante escroto, Eu não saía mais de casa. Tornara-me um pouco<br />
parecido com Michael Jackson.<br />
Continuava ainda mergulhado na revolta, em plena pós-adolescência exaltada. Tornara-me um<br />
pouco parecido com Eminem.<br />
Isolava-me lá em cima, na minha torre de marfim. Tornara-me um pouco parecido com um<br />
poeta maldito.<br />
Naquele mundo, as novas fontes de beleza foram esgotadas. A gente vivia das sobras. Eu só lia<br />
os mortos, só escutava os mortos, ou os moribundos. Alguns dentre eles acreditavam gozar de<br />
ótima saúde, ignoravam seu estado agonizante. Visto que, afinal de contas, eles existiam<br />
apenas através do olhar dos outros. E estes outros preferiam assistir à televisão. Mas nada de<br />
programação de filmes autorais.<br />
Neste mundo de milhões de seres, relativamente normais, de forma que bastante frios e<br />
bastante estúpidos, como quer a norma, eles reivindicam seu direito de mostrar sua feiúra e<br />
sua estupidez a milhões de outros seres feios e estúpidos, ignorando que a tela é na verdade<br />
um espelho. A gente pagaria o espelho em vinte e quatro prestações e, para evitar ficar muito<br />
apertado, a gente levantaria um empréstimo para cobrir o crédito, e outro empréstimo para<br />
pagar o primero.. Depois, quando os oficiais de justiça ficarem no nosso pé, a gente só tem de<br />
passar para o outro lado do espelho para dar depoimentos.<br />
Os depoimentos estão entre os males deste século. A gente dá depoimentos contra a<br />
sociedade, porque é verdade, afinal de contas, que é inadmissível que esta sociedade,<br />
responsável por quase todos os males contemporâneos, venha cobrar aquilo que emprestou.<br />
Que ela venha despojar famílias de trabalhadores honestos, tendo que cuidar de não sei<br />
quantos joões-ninguém, QUE ELA VENHA ROUBAR O HOME THEATRE DELES! Uuuhhh para a<br />
sociedade!<br />
Parece que alguns escolhem não escovar os dentes mais do que uma ou duas vezes por mês.<br />
Outros aprendem incríveis verdades metafísicas da própria boca do seus animais de<br />
estimação. Os gatos e cachorros deles falam com eles, mas para o senhor, senhor<br />
apresentador, eles nada dirão, eles não o conhecem, eles estão intimidados com todo este<br />
barulho, os técnicos, o público, há alguns momentos nos camarins, Lulu ficou tão descontraída<br />
que contou a uma maquiadora como sofreu naquele dia em que a mãe dela foi morta por um<br />
caçador numa verde pradaria normanda. Leia o seu livro, ela o escreveu quando ainda era uma<br />
cachorrinha, foi a maneira que encontrou para trabalhar psicanaliticamente este<br />
acontecimento tão triste... Não, não foi ela quem escreveu pessoalmente no seu I-Book com<br />
teta de treze polegadas, ela ditou para mim, pois a gente se comunica por telepatia...<br />
O apresentador faz suas perguntas com grande seriedade. Por um lado, tem o publico dele que<br />
importa, por outro, não é a primeira vez que viu este tipo de iluminado. Ele vai guardar suas<br />
gargalhadas para a edição. É um sujeito abjeto, mas que está, de certa forma, do lado dos<br />
vencedores, a gente não pode gozar com a cara dele. A questão que se impõe é a seguinte.<br />
Num mundo em que o olhar cala mais fundo que tudo o mais, por que se suicidar?<br />
Naquele mundo, a gente se suicida todos os dias. A gente vai lá contar seu estupro, mostrar os<br />
seios dilacerados por um cirurgião plástico inescrupuloso, vender um produto. Os rostos<br />
vaporosos saíram de moda. A gente decidiu operar os peitos para ficar um pouco mais<br />
parecida com uma criaturinha vulgar de videoclipe, a gente é estuprada porque se parece um<br />
pouco demais com uma criaturinha vulgar de videoclipe. Era a televisão que fabricava o<br />
babaca, ou o babaca que fabricava a televisão? A gente podia testar nosso casamento no<br />
almoço, e a nossa incultura no ja ntar. Gurias de oito anos queriam ser sexy. Outras não<br />
encontraram nada mais para chamar a atenção do que ir para o colégio de véu.<br />
No final, o véu foi pura e simplesmente proibido no colégio, e o fio-dental também. Era uma<br />
espécie de problema, digamos, de identidade. Os jovens estavam pirados e tudo era uma<br />
<strong>Bubble</strong> <strong>Gum</strong> <strong>–</strong> <strong>Lolita</strong> <strong>Pille</strong> <strong>Página</strong> 68