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Bubble Gum – Lolita Pille Página 1 - CloudMe

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patético como de uma doença contagiosa. Não tinha amigos. O mundo, com Derek, era<br />

pequeno demais, nisso a gente concordava. Derek num roupão do "Ritz". Derek num roupão do<br />

"Hôtel de Paris". Derek num roupão do "Il Pelicano". Derek num roupão do "Príncipe di Savoia".<br />

Derek num roupão do "San-Regis". Derek num roupão "Delano ", se sentindo ridículo. Derek<br />

num roupão do "Château de Ia Messardière". Derek num roupão do "The Dorchester", Derek<br />

num roupão do "Hilton" no aeroporto deDubai (numa escala um pouco longa), Derek num<br />

roupão do "Château Marmont", depois Derek num roupão bordado com seu monograma, na<br />

casa dele em Saint-Tropez. Lindo de tirar o fôlego, charuto na boca, sobrancelhas franzidas,<br />

sempre com uma boa razão para estar nas últimas. Eu me perguntava de vez em quando por<br />

que o odiava tanto. Talvez porque eu odiasse a mim mesma.<br />

Talvez também porque ele fizesse de tudo para ser odiado por mim. Já não tinha, de qualquer<br />

jeito, mais forças para odiá-lo como gostaria.<br />

Estava simplesmente exausta.<br />

Retornamos a Paris para preparar o lançamento.<br />

10 Summertime<br />

DEREK - Da varanda onde me instalei sozinho e sem nada, nem livro, nem companhia, nem<br />

sequer telefone, olho para o sol cansado das sete horas da noitinha, e o vejo laranja através<br />

dos meus óculos, quase ocre, cor de Bagdad Café, e cujo reflexo se perde no mar infinito, o<br />

mar que não consigo deixar de descobrir cintilante, apesar do clichê, me dá a estranha<br />

impressão de ondular ao ritmo daquele velho disco de Janis Joplin que acabo de encontrar no<br />

fundo de uma gaveta no quarto de minha mãe e, certamente porque estou um pouco doidão<br />

de tudo e qualquer coisa (vinho, maconha, alguns comprimidos de Temesta), estou<br />

absolutamente convencido de que tudo o que vejo é esta música, sejam as rosas, as mimosas e<br />

todas as flores que se agitam, cujos nomes não sei, ou este colchão fosforescente esquecido<br />

na superfície da piscina, sacudido pelo sopro do mistral, ou uma toalha Hermès que voa e<br />

some, os rochedos escurecidos, apanhando das ondas, sobretudo as ondas, a fumaça do meu<br />

charuto, e minha sombra alongada no muro branco, e o horizonte, o horizonte, o horizonte, e<br />

mais do que a convicção de que era um clipe ruim, mais do que esta visão que me enche de<br />

entusiasmo, de um entusiasmo um pouco amargo, porque está faltando algo de humano, mais<br />

do que esta música pretérita, há a sombra de minha mãe, bela e sutil, como num super-8, com<br />

seus Wayfarer e o maiô Missoni, arrumando com um gesto impaciente as mechas que<br />

escaparam de seu turbante, em precário equilíbrio nesses mesmos penhascos, me chamando,<br />

me chamando para que eu saia da canoa: "Derek, Derek", me chamando para entrarmos na<br />

casa. E é preciso que o sol se esconda finalmente por trás do morro em frente para que o<br />

encantamento se rompa, para que tudo passe do ocre ao cinza-azulado para que eu tire meus<br />

óculos escuros dos quais já não mais preciso, para enfim perceber que estou chorando.<br />

Manon passa neste instante, e ela me vê. Interrompe o passo por uma fração de segundo, viu<br />

o rosto, as lágrimas, e a velocidade com que repus os óculos de sol, e a maneira como evito<br />

seu olhar. Ela desvia o seu e passa.<br />

Ela também usa óculos escuros, quando já é quase noite fechada. Ela está agora platinada, os<br />

cabelos curtos, cortados logo acima do pômulo. É pele e osso. Está com os lábios tão inchados<br />

que parece ter levado uma surra. Não pára de escutar no seu walkman a última música de<br />

Shaggy, que se chama Salopes. Ela continua com um gosto de merda. Rebola em câmera lenta,<br />

como uma putinha de cinco euros. Pelo seu andar vacilante, sei que acabou de vomitar. Sei<br />

também tudo o que se poderia descobrir caso se fizesse um exame de sangue nela. Sei que ela<br />

se odeia. Sei que me odeia também. Melhor assim, alivia minha consciência.<br />

Na luz irreal desse videoclipe, ela se parece com um ícone morto.<br />

Ela desaparece na pool house, e vou juntar-me a ela para transar.<br />

Sua semelhança com Julie crescia todos os dias, junto a isso crescia meu mal-estar. Julie era<br />

uma aristocrata de rosto esculpido, voz cristalina, impossível de ficar despenteada, mesmo no<br />

<strong>Bubble</strong> <strong>Gum</strong> <strong>–</strong> <strong>Lolita</strong> <strong>Pille</strong> <strong>Página</strong> 55

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