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Bubble Gum – Lolita Pille Página 1 - CloudMe

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empresários, dos jogadores de futebol, dos médicos, dos toureiros, dos barmen, dos<br />

farmacêuticos, dos carteiros, dos agricultores e, sobretudo, dos mendigos. Eles também<br />

queriam cantar, porra. Eles cantavam nas ruas, o microfone na mão, o amplificador no ombro,<br />

tentando cantar mais alto que o vizinho. Os microfones eram vendidos em todo lugar. A gente<br />

comprava facilmente um. Eles foram proibidos. Mas a população não se deu por vencida. Foi<br />

criado um verdadeiro mercado negro do microfone. Começaram as guerras entre as gangues<br />

rivais pelo monopólio do tráfico de microfones. Nas ruas, ninguém mais cantava: para fazer<br />

com que o cara perto de você se calasse, e vice-versa, os manifestantes foram às vias de fato,<br />

mais que às vias de fato: aos amplificadores: os manifestantes derrubavam-se uns aos outros<br />

com golpes de amplificador. Houve mortos. O mundo era só violência. Tinham-no imbecilizado<br />

demais com novelas, videoclipes e variedades de merda.<br />

A merda estava resumida a emoções fáceis. "A gente não vai conseguir nada de bom<br />

inundando o mundo com emoções fáceis, quando o mundo precisa de emoções fortes", havia<br />

gemido um manifestante antes de morrer apedrejado com golpes de amplificadores. Mais<br />

tarde, foi descoberto que este homem era um dos principais líderes de um grupelho obstinado<br />

que morava nos esgotos e cuja atividade principal consistia em furtar os armazéns onde foram<br />

escondidos os últimos exemplares restantes dos discos e filmes proibidos, para depois<br />

escamoteá-los debaixo do casaco e redistribuí-los. Os revolucionários marcharam para a sede<br />

social de uma rádio nacional, que tomaram de assalto. Durante alguns minutos, antes de<br />

serem controlados pelas forças competentes, e depois exterminados, tiveram tempo de<br />

piratear as ondas e fazer uma transmissão integral da Sinfonia n°6 de Ludwig van Beethoven.<br />

Sem realmente entender por que, o mundo inteiro começou a chorar ao lado do seu rádio.<br />

Havia razões de sobra: mais ninguém tinha o que comer, visto que os agricultores cantavam,<br />

os transportes não funcionavam mais, visto que os motoristas cantavam, o comércio estava<br />

fechado, visto que os comerciantes cantavam. A gripe era mortal, visto que não hav ia mais<br />

ninguém para tratá-la. O dinheiro se desvalorizou. O escambo também perdera o sentido, visto<br />

que não havia mais nada para trocar. A violência redobrou: não era mais o problema das<br />

canções, era uma questão de sobrevivência. Nas ruas cobertas de fogo e sangue, logo não<br />

havia mais ninguém para cantar. Os derradeiros vestígios da civilização, a televisão e o rádio,<br />

pararam de transmitir: o mundo acabou num chiado.<br />

13 E se tudo isso...<br />

MANON - "Acorde, senhora! Acorde, senhora!"<br />

Eu estou com a cabeça explodindo, como se houvesse bebido demais, e estou vendo tudo<br />

embaçado, como se meus olhos estivessem cheios d'água, estou no meu quarto do Ritz, deve<br />

ser meio-dia, e tudo parece mais ou menos normal — acordar tarde, ressaca, vontade de<br />

quebrar tudo, como sempre que acordo tarde ou estou de ressaca —, tudo parece quase<br />

normal, digo eu, se não fosse esse sujeito de libré me sacudindo como se eu fosse um objeto, e<br />

ainda por cima berrando, como se não soubesse que eu solto os cachorros por muito menos<br />

que isso.<br />

— Acorde, senhora! Hei! A senhora está me escutando, mademoiselle?<br />

— Ei, tire essas patas imundas de cima de mim, idiota, quem foi que deixou você entrar? Estou<br />

dormindo!<br />

— Quem permitiu que a senhora entrasse?<br />

— O quê?<br />

— É isso aí, quem permitiu que a senhora entrasse aqui? A senhora está me entendendo? Isto<br />

aqui é um hotel, mademoiselle, e não a casa da sogra!<br />

— Ah, é? Verdade? Engraçado, eu podia jurar que você era a minha sogra, ainda por cima com<br />

a sua combinação.<br />

— Combinação... a senhora... acha que estou de combinação...?<br />

— Mas é claro que sim, seu babaca. Agora dê o fora daqui e me deixe dormir.<br />

<strong>Bubble</strong> <strong>Gum</strong> <strong>–</strong> <strong>Lolita</strong> <strong>Pille</strong> <strong>Página</strong> 71

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