Bubble Gum – Lolita Pille Página 1 - CloudMe
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Os não-filmes não custavam muito caro, visto que não havia nem equipe, nem equipamento,<br />
eles não eram muito caros, mas não rendiam absolutamente nada, já que não foram feitos<br />
para serem vistos. O não-cinema não era uma questão de dinheiro, era arte pura.<br />
Os não-filmes não deixavam nenhum vestígio atrás deles, eles eram voláteis como o éter,<br />
implacáveis como a vida. A gente comprometia nosso destino neles, e não havia sequer uma<br />
avant-première. Os não-filmes acabavam mal.<br />
Este aqui recebeu de mim o título de <strong>Bubble</strong> gum, porque tudo nele parecia oco, rosa e<br />
pegajoso: cenários, argumentos, emoções, até os próprios personagens, inclusive eu, eram<br />
ocos, rosa e pegajosos, à beira de estourar, e aquilo que perseguiam, a sacrossanta redenção,<br />
a sacrossanta celebridade, se tornava, durante as pseudofilmagens do não-filme,tão oco, rosa,<br />
banal e breve como uma pequenina bola de chiclete, a qual acabaria inexoravelmente<br />
explodindo na sua cara.<br />
Era a sua bola cor-de-rosa que Manon queria, era o que Manon buscava, foi por isso que numa<br />
noite, há quase dois anos, ela me vendeu sua alma.<br />
Esta fora a primeira sequência, a cena de abertura, o começo do fim. Eu tinha encontrado a<br />
garota, ou melhor, a matéria, e me propus a comprar sua alma ao som de Paint it black, dos<br />
Stones.<br />
Eu a levei para onde eu moro, e dei uma má trepada com ela. Eu me mandei antes que ela<br />
acordasse porque já não a suportava mais. Música: Roxanne, do Police.<br />
No dia seguinte, eu a mandei à Chanel com meu cartão papa as compras e meu motorista para<br />
sequestrá-la. Ela voltou para o hotel com suas roupas novas e seus escrúpulos baratos.<br />
Monólogo. Trepada.<br />
Música: Souvenirs, do The Gathering (trilha sonora do não-filme). Fim do prólogo.<br />
Em seguida, comprei a agência Vanity, que estava à beira da falência. Comprei-a e pus todo<br />
mundo na rua. Eu fiz o book de Manon e iniciei o casting. Precisava de sósias, muitos sósias.<br />
Em Paris, Nova York, Moscou, Milão, Londres, abri ou tomei conta de agências, soltei os<br />
caçadores, coloquei anúncios. Cinquenta pessoas recebendo era tempo integral reviravam sem<br />
trégua as ruas, os bares, as boates, as agências de modelos, os parques, as saídas do colégio e<br />
os shoppings à procura de sósias. A partir do argumento inicial do não-filme. eu havia<br />
estabelecido uma lista exaustiva dos sósias de que precisava. Recusei quatro cópias do Werner<br />
Schreyer antes de encontrar o que servia rodando bolsinha num bar homossexual em<br />
Montreal. Encontrei a irmã gêmea de Natasha Kadysheva na própria agência de Natasha, a<br />
coitadinha era polonesa e não conseguia vender uma foto, apesar, ou por causa, de sua<br />
semelhança com a top model. Eu precisava de cópias idênticas de toda a fauna mundana, da<br />
moda, televisão, cinema. Eu precisava de modelos e de figurantes. Após ter reunido um<br />
número suficiente de elenco, eu os mandei para uma velha pensão suíça, reformada sob meus<br />
cuidados, onde Mirko, ajudado por uma antiga professora de dança aposentada e um estilista<br />
heroinômano expulso do Balenciaga devido aos seus problemas de cheiração, os informava<br />
"daquilo que precisavam saber" para terem o ar perfeito de criaturas de clipe. No programa:<br />
relooking, os rapazes aprendiam o uso do gel desestruturação e a se vestir como uma vítima<br />
da moda sem ficar com cara de babaca, as garotas a rebolar e a arte do "fuck-me-look", havia<br />
aulas de dialeto: o falar nova-iorquino, aulas de postura — os sósias tinham de adquirir um ar<br />
completamente descontraído em todas as circunstâncias, a gente precisava então ensiná-los<br />
como segurar um garfo e uma faca satisfatoriamente —, havia também sessões artificiais de<br />
fotografia, aulas de name-dropping, muitos testes de literatura: comentar esta frase de Bret<br />
Easton Ellis: "Quanto mais magnífica você fica, mais lúcida você está", aulas magistrais de<br />
cultura geral: casais de estrelas, quem fode quem em Hollywood, os dez fotógrafos com quem<br />
vocês deveriam ter trabalhado, a obra de David Lynch, de Larry Clark, de Gregg Araki, com<br />
historinhas de cocheira e apreciações generalizantes a respeito do cinema underground, os<br />
hotéis na Rússia os prós e os contras da guerra no Iraque, os prós e os contras dos Beckham, a<br />
isso se seguindo aulas práticas de conversa de salão, e sobretudo, sobretudo, a matéria<br />
principal intitulada: "As mil e uma sacanagens a serem feitas com Manon". Os animaizinhos<br />
<strong>Bubble</strong> <strong>Gum</strong> <strong>–</strong> <strong>Lolita</strong> <strong>Pille</strong> <strong>Página</strong> 85