Práticas de Leitura e Escrita - TV Escola
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Praticas <strong>de</strong> <strong>Leitura</strong> e <strong>Escrita</strong><br />
“A literatura é a escola da complexida<strong>de</strong> humana, do entendimento da vida”.<br />
Edgar Morin<br />
No território brasileiro convivem diferentes grupos sociais, com características étnicas e culturais distintas, permeadas por<br />
gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s socioeconômicas. Vivemos num país que se apresenta cheio <strong>de</strong> contradições, no qual ainda encontramos<br />
relações sociais discriminatórias, aliadas às práticas exclu<strong>de</strong>ntes, gerando injustiça social e violência. País que também se apresenta<br />
com gran<strong>de</strong> riqueza cultural. País complexo, país plural, necessitando <strong>de</strong> pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alternativas. Para solidificar esta socieda<strong>de</strong><br />
brasileira plural, será preciso ampliar o plural que potencialmente há em cada indivíduo. A escola pública terá nesse momento uma<br />
função muito importante, primeiro porque é o espaço em que po<strong>de</strong>m conviver crianças e jovens <strong>de</strong> origens e níveis socioeconômicos<br />
diferentes, com costumes e visões <strong>de</strong> mundo diferentes. É também o espaço público para a vivência <strong>de</strong>mocrática com a diferença e,<br />
finalmente, porque é a escola a instituição criada para apresentar às crianças e aos jovens, os conhecimentos acumulados e sistematizados<br />
da história do país e da humanida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>mocratizando assim, o acesso ao saber produzido pela classe dominante. Nesse sentido,<br />
o ethos (a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um povo, grupo ou comunida<strong>de</strong>, a marca <strong>de</strong> suas manifestações e realizações culturais) precisa ser discutido<br />
amplamente pelos educadores, para que se aproximem e se apropriem <strong>de</strong> um conhecimento que se torna cada dia mais universal.<br />
Se quisermos construir uma socieda<strong>de</strong> mais justa e <strong>de</strong>mocrática, na qual todos tenham acesso à educação, à cultura,<br />
ao esporte, ao emprego, à moradia, ao saneamento básico e à saú<strong>de</strong>. Se quisermos uma socieda<strong>de</strong> em que haja efetivamente<br />
participação <strong>de</strong>mocrática (inclusive nas discussões sobre a elaboração <strong>de</strong> políticas públicas e nas <strong>de</strong>cisões sobre o uso das<br />
verbas públicas), socieda<strong>de</strong> em que haja qualida<strong>de</strong> social na prestação dos serviços. Se quisermos a plenitu<strong>de</strong> da cidadania<br />
para todos, teremos, como pressuposto básico que discutir a diversida<strong>de</strong> cultural, reconhecê-la e valorizá-la. Precisamos<br />
também buscar a superação das discriminações, atuando concretamente sobre os mecanismos <strong>de</strong> exclusão.<br />
Ressaltamos a importância da Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases da Educação, <strong>de</strong>sdobrada nos Parâmetros Curriculares<br />
Nacionais, que vem trazer o tema pluralida<strong>de</strong> cultural para ser pensado e vivido por professores e alunos, uma vez que,<br />
historicamente, temos tido dificulda<strong>de</strong>s em lidar com a temática do preconceito e da discriminação étnica.<br />
3.5.1. O preconceito no livro didático<br />
Pesquisas acadêmicas há muito <strong>de</strong>nunciam livros didáticos com conteúdos in<strong>de</strong>vidos, até mesmo errados, favorecendo<br />
assim a disseminação <strong>de</strong> preconceitos <strong>de</strong> diversas formas como, por exemplo, o privilégio da cultura da classe<br />
dominante, única aceita como correta, bem como a hierarquização das culturas entre si.<br />
Livros didáticos nos mostram o homem e a mulher <strong>de</strong> forma estereotipada, sem nenhuma relativização. Neles predominam<br />
<strong>de</strong>terminados mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> homem e mulher, enquadrando-os em comportamentos rígidos, não consi<strong>de</strong>rando nenhum tipo <strong>de</strong> variável<br />
no <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> seus papéis sexuais. Os livros didáticos apresentam homens e mulheres segregados em mundos diferentes.<br />
Mulher é mo<strong>de</strong>lo do lar e homem representa trabalho e sustento, levando à discriminação filhos <strong>de</strong> homens e mulheres que não se<br />
enquadrem nesses mo<strong>de</strong>los. Muitos livros não refletem nossa realida<strong>de</strong>, uma vez que não atentam para nossa pluralida<strong>de</strong> cultural,<br />
nem levam em conta as novas situações <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> papéis sexuais, criados pela transformação social. Se não refletem nossa<br />
realida<strong>de</strong>, muito menos a questionam. Apresentam a realida<strong>de</strong> como algo pronto, acabado, inquestionável e sem possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
interferência humana. Assim, a escola contribui para a reificação do “status quo”, o que não <strong>de</strong>ve ser o seu papel.<br />
Estudiosos e críticos da ilustração <strong>de</strong> livros didáticos ou <strong>de</strong> literatura infantil e juvenil também, há algum tempo, têm<br />
apontado para esta questão. Preconceitos também são passados sutilmente através <strong>de</strong> imagens que são mostradas a crianças e<br />
jovens. Exemplo clássico é a ilustração da mulher <strong>de</strong> avental e lenço na cabeça, enquanto o homem aparece sentado numa ca<strong>de</strong>ira<br />
lendo o jornal, ilustração recorrente em livros didáticos quando se quer representar uma família <strong>de</strong> médio po<strong>de</strong>r aquisitivo.<br />
Embora saibamos que a educação sozinha não irá resolver o problema da discriminação em suas manifestações mais perversas,<br />
se quisermos uma socieda<strong>de</strong> mais justa <strong>de</strong>vemos atuar para promover processos, conhecimentos e atitu<strong>de</strong>s que colaborem<br />
com a transformação social. Por exemplo, po<strong>de</strong>mos promover práticas <strong>de</strong> respeito e solidarieda<strong>de</strong> para com os portadores <strong>de</strong><br />
necessida<strong>de</strong>s especiais, através <strong>de</strong> esclarecimentos, uma vez que muitas situações discriminatórias ocorrem por <strong>de</strong>sconhecimento<br />
das causas ou das formas <strong>de</strong> como é possível encaminhar pedagogicamente tais casos. Nas questões <strong>de</strong> gênero, <strong>de</strong>paramo-nos com<br />
histórias <strong>de</strong> injustiças para com as mulheres em seu cotidiano na vida privada, em situações familiares ou situações profissionais.<br />
Essas injustiças <strong>de</strong> gênero po<strong>de</strong>m, e freqüentemente são agravadas, quando acrescidas <strong>de</strong> injustiça por motivo <strong>de</strong> etnia, cultura<br />
ou exclusão socioeconômica. Vale lembrar que a maior parte do magistério é constituída por mulheres (<strong>de</strong> quem se espera que<br />
reproduzam o discurso masculino do po<strong>de</strong>r). Conflitos, contradições, preconceitos, discriminações que hoje percebemos no universo<br />
escolar são resultados do lento e doloroso processo <strong>de</strong> libertação da mulher, principalmente no nosso século.<br />
E na medida em que os alunos, na maioria das vezes, pertencem a grupos sociais economicamente <strong>de</strong>sfavorecidos,<br />
esses conflitos estarão sempre presentes e são <strong>de</strong> gênero, etnia e classe, preconceitos oriundos <strong>de</strong> nossa formação histórica.<br />
Para que a escola promova um processo transformador em relação à pluralida<strong>de</strong> cultural, será preciso que o agente <strong>de</strong>sse<br />
processo – o(a) professor(a) – também se liberte, através do autoconhecimento e do <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> sua consciência<br />
profissional e crítica. O(a) professor(a) <strong>de</strong>ve saber porque está ali, porque ensinar e o que ensinar, uma vez que só um<br />
sujeito crítico e consciente politicamente tem condições <strong>de</strong> modificar o real.<br />
No nosso mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>, os preconceitos e estereótipos foram <strong>de</strong>senvolvidos em função <strong>de</strong> antagonismos<br />
do tipo homem/mulher, negro/branco, senhor/escravo e minoria dominante/maioria explorada e, ainda, reforçados pelas<br />
agências socializadoras como a família e a escola, que reforçam e reproduzem nas gerações mais jovens a visão <strong>de</strong> mundo<br />
*Esse texto se integra ao boletim da série “Literatura e temas transversais”, setembro/2001.<br />
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