projetos de rearranjos sociais: escravos, índios e negociantes nos ...

A incorporação, na concepção de Silva Lisboa, far-se-á pela reciprocidade. A dádiva
da redução de tarifas e liberalização de práticas comerciais terá como contra-dádiva a
aceitação pelo antigo contrabandista de obrigações para com o Estado, da instituição
monárquica, da burocracia colonial, enfim, da natureza das relações de reciprocidades entre o
Estado e a sociedade. Sendo a sociedade colonial cônscia e partícipe do presente das
iniquidades fiscais dos contrabandistas, quando integrados ao grupo mercantil a dádiva
perpassaria as hierarquias envolvidas, sobretudo, como salienta os autor, no comércio
litorâneo.
Aquelas, na condição de ação de reciprocidade à dádiva conferida aos
contrabandistas, também se encaminhariam para a intensificação de suas atividades
industriosas, formando-se, a partir da energia do povo, no entendimento de Silva Lisboa, o
ininterrupto gradiente da inteligência e riqueza obtidos nas expedições lucrativas. A dádivas
deflagrada a um grupo toca diferentes posicionamentos hierárquicos do Brasil colonial, pois
as sua relações, mesmo não observadas pelo Estado, reiterar-se-iam. Concedendo-se dádiva
aos contrabandistas, o Reino teria como contra-dádiva, ainda, o a legitimidade dos colonos,
os quais em se vendo libertados do grilhão da pobreza, na expressão do autor, e havendo-se
aumento de capitais no Brasil, não mais se perceberiam em situação de atraso e desamparo da
metrópole.
No argumento de Silva Lisboa, faz-se a relação entre a liberdade de produção e
reciprocidade entre indivíduo, sociedade e instituições, a qual lhe caberia o estatuto de lei,
conforme a passagem: “Se você observar a lei de trabalhar cada indivíduo segundo a sua
inclinação e circunstâncias, e trocar com outro em boa-fé o fruto supérfluo de sua indústria,
os povos viveriam contentes à sombra de seus governos, as misérias e guerras seriam
diminuídas, pelo freio que a instrução e o trabalho impõe às paixões. 50 ” A coesão social e as
inter-relações entre desiguais seriam acirradas, projeta Silva Lisboa, pela obtenção desse
ponto de ajuste, facilitando-se às ínfimas classes os proveitos dos bens materiais e, por fim,
rearranjar-se-ia, no Brasil, o espírito da sociabilidade, “que adoça os costumes e faz respeitar
a justiça e execrar a violência. ” 51
50 Idem, p. 204.
51 Idem, p. 205.
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