projetos de rearranjos sociais: escravos, índios e negociantes nos ...

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porque, ao morrer durante o Império brasileiro e publicar obras que têm propostas de outras formas e outros interesses de legitimação, aproxima-se de Vieira dos Santos, que por sua vez está vinculado a uma experiência historiográfica oitocentista, mas os três autores, em distintas conformações sociais, com distintos trânsitos sociais e políticos, objetivaram, segundo defendemos como hipótese, legitimar conformações sociais estabelecidas através de discursos que, escritos para governantes ou grupos sociais hierarquicamente superiores em relações aos demais grupos de uma específica sociedade, propunham a incorporação naquelas sociedades de índios e escravos seja no contexto colonial, seja no período imperial. Entre Azeredo Coutinho e Vieira dos Santos, a trajetória de Silva Lisboa entre os contexto da colônia e do Primeiro Reinado – produzindo obras direcionadas, portanto, à distintas formas de governo – é a baliza da aproximação entre os séculos XVIII, no qual se encerram a maior parte da bibliografia de Azeredo Coutinho – e Viera dos Santos, cuja narrativa inscreve-se durante um experiência historiográfica oitocentista. No que tange à Vieira dos Santos, a inexistência de referências bibliográficas acerca da obra e trajetória desse autor impeliu para verificações sobre as utilizações de sua produção histórica no século XX, de maneira a notarem-se as formas de vinculações de sua obra ao grupo de autores que partilharam de similares concepções de discursos sobre o passado e, ao lado de Vieira dos Santos, as obras dos demais autores conformaram-se na possibilidade de uma escrita da História do Paraná propugnada pelo Estado. Os dois objetivos têm como inter-relação a percepção de como a historiografia construiu, através de mutações argumentativas, imagens desses autores enquanto atentos às configurações econômicas, sociais, políticas, enfim, multifacetadas características que tanto como defensores de uma ordem estabelecida; e, por conseguinte, das formas de dominação social ou do conservadorismo e das relações entre produção textual de ilustrados luso- brasileiros ou negociantes pertencentes às elites locais como momentos tanto de pensamentos políticos como de momentos de predomínios de prosas históricas com interesses que não se limitavam às aparentes descrições da natureza, do outro e dos eventos políticos e econômicos. Assim, forja-se a segunda hipótese deste trabalho, a qual os três autores estudados são entendidos como proponentes da reiteração das relações entre desiguais, as quais, consolidadas pela incorporação do outro na sociedade, reproduzem uma lógica de reprodução social onde os lugares sociais são definidos e os conflitos entre desiguais e arrefecido pela 6
contínua interdependência das dádivas e das contra-dádivas, as quais têm no período da dívida os modos de estabelecer os tratos e as alianças entre os desiguais 1 . Propõe-se nesta monografia a conciliação entre os estudos sobre a dádiva procedidos por Marcel Mauss e as pesquisas de campo de Louis Dumont acerca do sistema de castas da Índia. Assim, as relações de reciprocidades e estabelecimento de alianças a partir das trocas de dádivas, estudadas por Mauss, serão aqui complementadas pelo conceito de sociedade hierárquica desenvolvido por Dumont. Este antropólogo, vinculado à vertente da antropológica maussiana, diferenciou as sociedades em igualitárias e hierárquicas, afastando- se da dicotomia entre tradicional e moderno. Nas sociedades hierárquicas há lugares sociais definidos, lógicas de reproduções e mobilidades de hierarquias. Buscar-se-á, portanto aplicar estes conceitos aos contextos setecentistas e oitocentistas nos quais Azeredo Coutinho, Silva Lisboa e Vieira dos Santos publicaram textos, nos quais se encontram defesas das relações de reciprocidades e da conformação hierárquica e da reprodução desta. 1. Tipologia das fontes: as possibilidades de inter-relações As fontes impressas deste trabalho são obras de Azeredo Coutinho, Silva Lisboa e Vieira dos Santos. Do bispo Coutinho arrolou-se os textos Ensaio sobre o comércio de Portugal com as suas colônias e Análise sobre a justiça do tráfico de escravos. Publicado em 1796, o primeiro texto constituiu-se em arrolamento de prescrições para o Reino de Portugal redefinir as relações com as colônias para prosseguir a vigência do pacto colonial. Deste texto analisaram-se nesta monografia as imagens dos índios do Brasil e as maneiras como estes, porque ao Azeredo Coutinho observa os índios como grupos diferentes, e, com suas distintas potencialidades, demandariam ser estimuladas a desenvolveram atividades benéficas à exploração das riquezas naturais do território do Brasil. O segundo texto, publicado em 1808, faz-se a defesa do tráfico de africanos para o Brasil pelas construções acerca tanto da naturalização das desigualdades nas relações entre os homens, como das racionalidades do escravismo como propulsor de riquezas econômicas. Das obras de Silva Lisboa foram aqui selecionadas Observações sobre a franqueza da indústria, e o opúsculo Da Liberdade do Trabalho. Na primeira publicada em 1810 e que se coaduna com a obra anterior Observações sobre o comércio franco no Brasil em virtude de apresentar diagnósticos das atividades econômicas brasileiras, os problemas e as 1 Cf.: DUMONT, Louis. Homo hierarchicus. o sistema de castas e suas implicações Tradução de Carlos Alberto da Fonseca. São Paulo: Edusp, 2000. MAUSS, Marcel. Ensaio sobre a dádiva. Tradução de António Filipe Marques. Lisboa: Edições 70, 2001. 7
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