projetos de rearranjos sociais: escravos, índios e negociantes nos ...
projetos de rearranjos sociais: escravos, índios e negociantes nos ...
projetos de rearranjos sociais: escravos, índios e negociantes nos ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Po<strong>de</strong>m ser notados, por exemplo, no Discurso sobre o estado atual sobre as Minas do<br />
Brasil (1804), <strong>de</strong> Azeredo Coutinho, diagnósticos <strong>de</strong> falhas na atenção ao comércio <strong>de</strong> açúcar<br />
<strong>de</strong>vido à atenção excessiva com a exploração das minas <strong>de</strong> ouro. Propugna-se uma <strong>de</strong>fesa da<br />
agricultura, contudo, não se admoesta a Coroa e o texto é <strong>de</strong>dicado a Vossa Alteza Real.<br />
Nestes autores os valores ético-religiosos revestem o argumento da dominação, da<br />
intensificação do exercício da autorida<strong>de</strong>, sob a justificação da estratégia contra a sublevação<br />
<strong>de</strong> <strong>escravos</strong> ou radicais políticos, por exemplo. No tocante à escrita das obras, a narrativa<br />
histórica nelas forjadas, alija, pois, pelo obscurecimento ou <strong>de</strong>preciação, quaisquer registros<br />
<strong>de</strong> iniciativas <strong>de</strong> outras racionalida<strong>de</strong>s pregadas no curso da formação das elites locais ou<br />
conformações políticas <strong>de</strong> Estado que se propõe a narrar. A excepcionalida<strong>de</strong> assemelha-se à<br />
anormalida<strong>de</strong> e, portanto, não é provida do pendor <strong>de</strong> pertencer à trajetória secular das<br />
segmentações hierárquicas.<br />
À temática da escravidão presente em Coutinho, Silva Lisboa e Vieira dos Santos<br />
busca-se aporta na tese doutoral <strong>de</strong> Rafael <strong>de</strong> Bivar Marquese 93 , a qual analisa as concepções<br />
sobre gover<strong>nos</strong> <strong>de</strong> <strong>escravos</strong> no continente americano, menciona os escritos <strong>de</strong> Coutinho e<br />
Silva Lisboa, <strong>de</strong> modo a vincular propostas sobre o escravismo aos contextos em que se<br />
inscreviam os teóricos da escravidão, mas também como observam os <strong>de</strong>mais contextos on<strong>de</strong><br />
vigorava a mão-<strong>de</strong>-obra escrava. Em Marquese, encontra-se a referência às consi<strong>de</strong>rações<br />
sobre Coutinho acerca do tráfico <strong>de</strong> <strong>escravos</strong> – a justificação da permanência – ao passado<br />
que suas atenções ao tráfico, como notou Marquese, relacionam-se a um contexto <strong>de</strong><br />
oscilações na produção açucareira do Brasil, <strong>de</strong> modo que o autor da tese remete à<br />
compreensão do pertencimento <strong>de</strong> Coutinho a uma elite <strong>de</strong> produtores <strong>de</strong> açúcar. No tocante<br />
às consi<strong>de</strong>rações <strong>de</strong> Marquese <strong>de</strong> Marquese, aparecem convergidos interesses dos senhores <strong>de</strong><br />
<strong>escravos</strong> e as legitimações ao tráfico e ao escravismo elaboradas por letrados, o que, na<br />
perspectiva do autor, conota para as específicas apropriações teóricas – notadamente do<br />
liberalismo, como mencionado acima, presente em Coutinho e Silva Lisboa – assumidas ou<br />
relegas conforme o objeto e os interesses <strong>sociais</strong> e das relações <strong>sociais</strong> dos autores sobre o<br />
objeto em análise.<br />
Observa-se, nesse sentido, possível confluir Vieira dos Santos no contexto <strong>de</strong> autores<br />
arrolados por Bivar <strong>de</strong> Marquese <strong>de</strong>fensores da escravidão ou mesmo autores <strong>de</strong> formas <strong>de</strong><br />
repressão, em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong>, em suas memórias históricas, Vieira dos Santos naturalizar o trato,<br />
93 MARQUESE, Rafael <strong>de</strong> Bivar. Feitores do corpo, missionários da mente: senhores, letrados e o controle<br />
<strong>de</strong> <strong>escravos</strong> nas Américas, 1660-1860. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.<br />
89