Um Novo Modelo para o Setor Elétrico Brasileiro
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esolve-se em favor deste. Esta condição, além de facilitar, potencialmente,<br />
graves restrições ao interesse geral, representa concretamente a<br />
apropriação privada da renda hidráulica. <strong>Um</strong> exemplo clássico do conflito de<br />
interesses consiste na própria definição de energia assegurada, que concede<br />
prioridade, no longo prazo, <strong>para</strong> a comercialização dos montantes previstos<br />
em contrato. Alterações desses montantes em função do surgimento de<br />
outras demandas (como os projetos de irrigação, no Rio São Francisco)<br />
implicarão em conflitos, passíveis de mediação por agentes exógenos ao<br />
setor.<br />
<strong>Um</strong> dos pilares do atual modelo, a liberdade de os consumidores<br />
escolherem a concessionária da qual comprariam energia, na verdade<br />
embute uma armadilha. Os grandes consumidores, com escala que<br />
justifique os esforços, poderão exercer sua liberdade, buscando novas<br />
opções, como autoprodução, mudança de combustíveis, negociar<br />
suprimento favorável com produtores independentes, ou ainda, barganhar<br />
melhores condições junto à distribuidora local, a cuja rede estão<br />
conectados. Porém, os consumidores menores, tipicamente residências e<br />
pequenos e médios estabelecimentos comerciais e industriais, teriam pouca<br />
margem de manobra ou condições efetivas <strong>para</strong> exercitar sua liberdade. Por<br />
outro lado, <strong>para</strong> manter os maiores consumidores, as distribuidoras locais<br />
(na prática, a única opção dos pequenos) tenderiam a oferecer condições<br />
favoráveis e benefícios na estrutura tarifária, devidamente homologada pelo<br />
regulador em nome do equilíbrio econômico-financeiro da concessão, que<br />
acabariam sendo pagos pelos pequenos. O resultado previsível, da<br />
pressuposta liberdade de escolha, seria o aumento da exclusão e da<br />
transferência de renda, e a redução do acesso ao consumo de eletricidade<br />
(ver seção 2.3.2.4).<br />
Do ponto de vista macroeconômico, a inconsistência do modelo em<br />
vigor refere-se à extraordinária expansão das remessas de juros e<br />
dividendos, além do aumento da dependência por insumos e equipamentos<br />
importados, que agravam a situação das contas externas do país. Outra<br />
inconsistência do modelo de mercado reside no fato de que os preços<br />
indicativos de curto prazo determinados no âmbito do Mercado Atacadista<br />
de Energia (MAE) <strong>para</strong> um parque de geração predominantemente<br />
hidrelétrico foram, na maior parte do tempo, inferiores aos dos contratos<br />
bilaterais e, principalmente, inferiores aos custos marginais crescentes da<br />
expansão da geração, determinantes dos preços futuros. Num tal ambiente,<br />
os compradores (comercializadores/distribuidores) tendem a pactuar<br />
contratos com prazos cada vez menores, enquanto que investidores e<br />
financiadores de novos projetos de geração requerem prazos compatíveis<br />
com a longa maturação dos mesmos e com as garantias de longo prazo de<br />
que a energia produzida irá ocupar seu lugar no mercado.<br />
Em conclusão, as reformas estruturais impostas ao setor elétrico, no<br />
Brasil, resultaram em um modelo profundamente agregador de riscos<br />
(tabela 6) e falhas (tabela 7). Enquanto no modelo anterior os<br />
desequilíbrios existentes eram, de certa forma, repartidos por toda a<br />
sociedade, sob a forma de tarifas e de aumento da carga tributária, no<br />
presente, todos os riscos, existentes e percebidos, são repassados<br />
diretamente aos consumidores, sob forma de tarifas corrigidas acima da<br />
inflação, encargos emergenciais, ou de manipulação de oferta. <strong>Um</strong>a vez que<br />
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