Baixar - Proppi - UFF
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suas características. Sendo a cultura afro-brasileira uma cultura predominantemente oral e<br />
gestual, o corpo vira local de memória por excelência, fazendo da dança a própria<br />
inscrição da memória neste corpo. Continuando com as palavras de Leda Martins:<br />
“O corpo em performance restaura, expressa e, simultaneamente, produz esse<br />
conhecimento, grafado na memória do gesto” (Martins, 2003, p. 82)<br />
O gesto vira portanto o protagonista da produção de conhecimento e do locus da<br />
memória. Ele é o instrumento de transmissão e reprodução das histórias ancestrais dos<br />
povos de matriz africana, que por séculos basearam a transmissão de suas culturas na<br />
oralidade. Tanto o ritual no campo sagrado quanto a performance da dança Afro no<br />
contexto profano são dois lugares onde o corpo expressa as memórias inscritas nele na<br />
prática e é utilizado para que recrie e transmita os mitos afro-brasileiros através da<br />
música, dos cantos, da indumentária, da dança, ou seja, através dos gestos.<br />
Finalmente podemos analisar a visão de Harold Scheub sobre gesto e interação na<br />
produção de significado na performance oral. Aqui o autor afirma que a matéria de toda<br />
performance é a cultura, formada por várias narrativas. O narrador portanto pega os<br />
elementos da vida cotidiana e usa eles na narrativa e na performance de arte, a qual<br />
provoca uma experiência estética na platéia. Na narrativa há portanto uma tradição<br />
atualizada através do real, ou seja a cronologia do passado é atualizada no tempo<br />
presente, juntando o mundo real ao mundo da fantasia. O narrador trabalha sempre em<br />
cima das reações da platéia e dos elementos emotivos sinalizados no corpo da audience.<br />
O gesto nisso é fundamental: ele tem a força de capturar a platéia e é o veículo da<br />
emoção, fornecendo a ligação entre corpo, oralidade e emoção presente na performance,<br />
assim como no ritual (Scheub, 1977).<br />
Para exemplificar como o gesto é tão poderoso na resposta emocional da platéia,<br />
uso a reação que eu tive como audience de um espetáculo de dança Afro no momento da<br />
dança de Orixás. A experiência foi quando fui assistir o espetáculo da Cia Rubens Barbot<br />
de dança previamente mencionado, intitulado “Orixás”. Este foi uma reinterpretação<br />
contemporânea da dança dos Orixás que, ao mesmo tempo, mantinha os gestuais e a<br />
simbologia típicos de cada orixá. Os elementos presentes no contexto estimulavam cada<br />
sentido, do cheiro do incenso, à luz das velas, ao vento do palco aberto onde a companhia<br />
estava se apresentando, ao toque dos atabaques. Cada vez que um orixá entrasse em cena,