Baixar - Proppi - UFF
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O que é que estas sensações provocam dentro de um ritual coletivo? Utilizando os<br />
conceitos de Connerton, Stoller escreve que uma memória social se forma nestes rituais,<br />
pois eles se referem a pessoas e eventos históricos ou mitológicos e estas referências não<br />
são simplesmente pensadas ou contadas: elas são atuadas através de práticas corporais<br />
(Stoller, 1995). Estas práticas, ou seja “o substrato incorporado da performance”, é a<br />
chave para a memória cultural, onde “o passado é, como era, sedimentado no corpo”<br />
(Ibidem, p. 29). Indo mais além desta concepção do Connerton, Stoller adiciona os<br />
sentidos e as sensações a estas experiências e performances, afirmando que a memória<br />
cultural é um fenômeno incorporado. Esta afirmação é bem exemplificada pelas histórias<br />
que o Stoller traz no seu texto do livro Corregidora de Gayl Jones. Trazendo uma história<br />
do meu campo etnográfico, é evidente como a memória “embodied” está presente nos<br />
corpos dos dançarinos do nosso grupo de dança Afro. Em um ensaio no Centro<br />
Coreográfico do dia 25 de Abril 2009, cada pessoa do grupo interpretou uma parte de<br />
uma poesia, cujo texto é o seguinte:<br />
Echoam Atabaques nas Senzalas…<br />
Ressoam Atabaques nos terreiros das fazendas, sufocando gemidos, lamentos, tormentos<br />
Ressoam Atabaques nos terreiros das fazendas, para afastar a saudade da terra amada<br />
que deixou<br />
Ressoam Atabaques nos terreiros das fazendas, louvando Zumbi dos Palmares, negro de<br />
grande valor<br />
Ressoam ainda hoje os Atabaques, nos morros, guetos, favelas, alertando ao povo negro<br />
que a liberdade ainda não chegou.<br />
Cada dançarino declara estes versos ao se afastar de uma figura corpórea que tinha sido formada e que a gente chama de<br />
“árvore”, ou seja um conjunto dos nossos corpos encaixados um no outro, onde as pernas, os braços, as mãos, os troncos e as cabeças<br />
são utilizados para formar o tronco, os galhos e as folhas da árvore Baoba, elemento sagrado na cosmogonia Africana, símbolo de raiz<br />
e ancestralidade. Ao se movimentar para longe da árvore e ao declarar esta poesia, o corpo de cada um incorporou na voz, no olhar, na<br />
atitude e em cada gestual as sensações que esta realidade, esta história oral conta para nós. Os gestos corporais eram cheios de dor na<br />
primeira estrofa, de tristeza e saudade na segunda, de força e orgulho na terceira, e de raiva e realidade na última estrofa.<br />
Esta performance é um exemplo de como a memória é um saber prático e de<br />
como a memória de um grupo se constitui em performances que re-apresentam o passado,